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2020 Wagner Inácio Dias Direito Civil Famílias e Sucessões Organizadores Frederico Amado | Lucas Pavione Coleção Resumos para Concursos 6 5 ª edição revista, ampliada e atualizada

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2020

Wagner Inácio Dias

Direito CivilFamílias e Sucessões

Organizadores Frederico Amado | Lucas Pavione

Coleção

Resumos para

Concursos 6

5ªedição

revista, ampliada e atualizada

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capítulo

10DA UNIÃO ESTÁVEL

\ LEIA A LEI:

ͳ arts. 1.723 a 1.727 CC.

1. INTRODUÇÃO

O matrimônio foi, por longo tempo, o ápice de toda a estrutura do Direito de Família. Não havia família fora do matrimônio, não havia fa-mília antes do matrimônio e não havia família mais com o fim do matri-mônio. Contudo, ao lado desta visão restrita e excludente, a sociedade desenvolvia outras formas de união que passam, algumas das vezes, a receber proteção estatal. Tais formas não estão atreladas à toda a gama de solenidades que circundam o matrimônio, mas demonstram que duas pessoas desejam estabelecer uma comunhão de vida.

As uniões livres, em que duas pessoas estavam juntas sem que houvesse formalidade estatal ligando as duas, evoluíram chegando a duas espécies diferentes:

a) concubinato – em que duas pessoas, que não podem se casar de forma absoluta, se unem (há, hoje, duas espécies, o incestuoso – por exemplo, pai e filha – e o adulterino – uma mulher casada e seu amante). Em relação ao impedimento para casar, deve ser observado que sendo uma delas casada, mas estando separa-da de fato, não haverá concubinato, mas sim união estável. O mesmo se aplique se ambas forem casadas com outras pessoas, mas estiverem separadas de fato.

b) união estável – em que duas pessoas se unem com o intuito de constituir família, podendo, se quiserem, converter sua relação em matrimônio. Mesmo aquele que não pode se casar, por já estar

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casado, pode constituir união estável, desde que esteja separado de fato (atente o leitor que não há prazo para a separação de fato).

A disposição legal que determina ser a união estável passível de formação apenas se se tratar de união entre um homem e uma mu-lher não mais produz efeito, em razão da ampliação da legitimida-de para formação de tal união abarcando as pessoas do mesmo sexo (cf. STF, ADIn 4277 DF). No mesmo sentido, o STJ já decidiu, por maioria, que é possível a conversão da união estável homoafetiva em casamento. Em complemento, o Enunciado 601 das Jornadas de-nota que: é existente e válido o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

A união estável não se confunde com o matrimônio. Uma relação é de base factual, enquanto o outro é baseado em uma rígida solenidade e seu consequente registro.

Desta forma, resta patente que o sistema formalista desenvolvido ao redor do casamento nem sempre estará apto a produzir os mesmos efeitos na união estável. Buscando estabelecer maior segurança jurídi-ca, o CNJ exarou, em julho de 2014, o Provimento nº 37, em que facul-tou aos companheiros (tanto homo quanto heteroafetivos) o registro da união estável no Cartório de Registro Civil, em seu livro “E”. O provi-mento estabelece as seguintes regras:

Registro de Uniões EstáveisCircunscrição registral Cartório de Registro Civil da Sede ou do 1º Subdis-

trito da Comarca em que os companheiros têm ou tiveram seu último domicílio.

Livro E

Documento a ser registrado Escritura pública de união estável – seja de reconhe-cimento ou de distrato - (inviabilizando o registro do contrato particular) ou sentença de reconhecimento e dissolução da união estável

Dados a serem registrados (I) Data do registro;(II) Qualificação completa das partes, incluindo data de nascimento dos companheiros;(III) prenomes e sobrenomes dos pais;(IV) indicação de data e local do registro do nasci-mento dos companheiros (constando em qual Re-gistro Civil foi feito o assento). Ainda, as mesmas in-formações em relação ao casamento, união estável,óbito de anterior companheiro/cônjuge, divórcio ou separação, tanto cartoriais quanto judiciais.

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161Cap. 10 • DA UNIÃO ESTÁVEL

(V) data do trânsito em julgado da sentença ou do acórdão, número do processo, Juízo e nome do Juiz que proferiu ou do Desembargador que relatou, quando o caso;(VI) data da escritura pública, com o livro, página e Tabelionato em que foi lavrada;(VII) o regime de bens ou a menção de que não hou-ve escolha.

Vedação É proibido registrar no Livro E uniões estáveis de pessoas casadas. Isto não desfaz a regra do art. 1.723, §1º, apenas dá mais segurança ao registro.

Por isto, defende-se aqui, com espeque em diversificada doutrina, que a união estável deve ser equiparada ao matrimônio em seu sentido material (sendo digna de proteção, gerando direito à suces-são, alimentos etc.) mas deve dele ser afastada, para manutenção da segurança jurídica, nos pontos que derivarem da simples formali-dade (como a não possibilidade de exigência de outorga). Contudo, necessário que se estabelece quadro comparativo, para que não res-tem dúvidas.

União Estável Casamento

Sucessão ampla Sucessão ampla.

Dever alimentar. Dever alimentar.

Não há imposição de outorga. Há imposição de outorga, ex-ceto na separação total.

A separação obrigatória é imposta em razão apenas da idade (maior de 70 anos).

A separação é imposta em todos os casos do art. 1.641 CC.

Comprovada a união (por contrato ou por decisão) fixa-se o momento inicial do regime de bens (ponto inicial do relacionamento).

A celebração fixa o momento inicial do regime de bens.

Não há presunção em relação à filiação. Fa-ça-se ressalva pois parte da doutrina com-preende que as presunções se aplicam.

Há presunção, na forma do art. 1.597 CC.

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União Estável Casamento

Pode ser formada a partir da simples con-duta de união, podendo, contudo, ser con-tratada por forma particular ou pública.

Só pode ser estabelecido por ato solene com intervenção estatal.

Não são aplicáveis as causas suspensivas. Aplicam-se normalmente as causas suspensivas.

A opção de regime e demais regramentos deve ser feita por contrato escrito.

As opções de regime e regras pessoas são escolhidas por pacto antenupcial.

Na união estável são plenamente aplicáveis os deveres matrimo-niais, atentando-se, contudo, para detalhe em relação à coabitação.

Não se exige, para a configuração da união, que os companheiros residam sobre o mesmo teto. Isto porque mesmo no matrimônio já se reconhece que tal situação não pode se configurar como um dever, visto que a necessidade de trabalho pode fazer com que um dos cônjuges tenha de estabelecer domicílio em outra cidade, mantendo a contribui-ção ao lar e com eles se reunindo dentro das possibilidades financeiras. Em um país de dimensões continentais como o Brasil, o distanciamento pode ser grande, mas a união poderá permanecer dados os laços que unem os integrantes.

Por fim, vale destacar que em relação aos deveres de guarda e sus-tento da prole são válidas as mesmas regras do matrimônio. Desta for-ma, são devidos alimentos entre os companheiros, assim como em re-lação à prole comum (contudo, este último dever decorre da filiação e não da condição dos pais). Havendo a dissolução da união, por distrato ou ação de reconhecimento e dissolução de união estável, a guarda dos filhos será regulamentada, seguindo-se os mesmos preceitos esta-belecidos para o casamento.

\ União estável e distratoUNIÃO ESTÁVEL. CONTRATO. DISTRATO. ALIMENTOS. RENÚNCIA EXPRESSA. NÃO FAZ JUS ÀPENSÃO ALIMENTÍCIA DE EX-COMPANHEIRO AQUELE QUE FIRMA DISTRATO RELATIVO AOCONTRATO PARTICULAR DE RECONHECIMENTO DE SOCIEDADE DE FATO, RENUNCIANDO EX-PRESSAMENTE A QUAISQUER OBRIGAÇÕES DE UMA PARA COM A OUTRA PARTE, E, COM MAIS

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163Cap. 10 • DA UNIÃO ESTÁVEL

RAZÃO, QUANDO SE TRATA DE PESSOA JOVEM E SAUDÁVEL, NÃO DEMONSTRANDO SITUAÇÃO DE MISERABILIDADE, DEFICIÊNCIA OU INCAPACIDADE PARA EXERCER ATIVIDADE LABORAL PARA PROVER O PRÓPRIO SUSTENTO. (TJ-DF - AC: 19990110327312 DF , Relator: FLAVIO ROSTIROLA, Data de Julgamento: 20/09/2006, 1ª Turma Cível, Data de Publicação: DJU 11/01/2007 Pág. : 56 DJU 11/01/2007 Pág. : 56)

CIVIL E PROCESSO CIVIL. RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. DIVISÃO DE IMÓVEL. DISTRATO DE UNIÃO ESTÁVEL. COMPROVAÇÃO DA DATA DA DISSOLUÇÃO POR DEPOI-MENTOS. 1. A DATA DA ASSINATURA DA ESCRITURA DE DISTRATO DA UNIÃO ESTÁVEL NÃO NE-CESSARIAMENTE INDICA O MOMENTO FIM DA UNIÃO ESTÁVEL, ESPECIALMENTE SE OUTRAS PROVAS DOS AUTOS, COMO OS DEPOIMENTOS DAS PARTES E TESTEMUNHAS, COMPROVAM QUE O CASAL JÁ NÃO CONVIVIA JUNTO EM TEMPO ANTERIOR. 2. ADQUIRIDO O IMÓVEL NO PERÍODO EM QUE NÃO HAVIA MAIS A UNIÃO ESTÁVEL, NÃO PODE PREVALECE O PEDIDO DE PARTILHA DO BEM OU DA IMPORTÂNCIA PAGA COMO SINAL PARA A AQUISIÇÃO DO IMÓVEL. 3. NO QUE CONCERNE À SUCUMBÊNCIA, CONSTATA-SE QUE ESTA SE VERIFICOU DE FORMA PROPORCIONAL, NA MEDIDA EM QUE, DOS PEDIDOS DA AUTORA, ALGUNS FORAM OBJETO DE ACORDO, O DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL RESTOU JULGADO PRO-CEDENTE, ENQUANTO QUE O APELADO LOGROU ÊXITO NO QUE TANGE A PARTILHA DO IMÓ-VEL. 4. DEU-SE PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO TÃO SOMENTE PARA RETIFICAR A PLANILHA DESTACADA NA SENTENÇA. (TJ-DF - APC: 20110111118359 DF 0030804-93.2011.8.07.0001, Re-lator: FLAVIO ROSTIROLA, Data de Julgamento: 01/08/2013, 1ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 06/08/2013 . Pág.: 201)

Uma vez estabelecida a união estável, os companheiros podem, a qualquer tempo, requerer conversão de sua relação em casamento. Para isto, ocorrerá processo de habilitação e ao final será lavrado o assento no Registro Civil. A habilitação é necessária para apuração da possibilidade de matrimônio. Vale destacar decisão do TJMG em que se reconheceu a possibilidade de efeitos retroativos da sentença de conversão, atribuindo como data de início da união matrimonial a mesma data inicial da união estável.

\ Retroatividade da conversão de união estável em matrimônio

AÇÃO DE CONVERSÃO DE UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO CIVIL. EFEITOS RETROATIVOS DO CASAMENTO. PEDIDO DAS PARTES. POSSIBILIDADE. – Considerando o intuito do art. 226, § 3º da Constituição Federal que determina a facilitação da conversão da união estável em casamento civil, e diante da ausência de lei regulamentando do procedimento da conversão, o Provimento nº 190/CGJ/2009, previu que feito o pedido ao juiz, diante do silêncio da lei, e frente ao caso concreto, seria possível que este se manifestasse acer-ca dos efeitos da sentença declaratória da conversão da união estável em casamento, permitindo, assim, que diante do pedido das partes fosse declarada como data do casa-mento a mesma data de início da união estável convertida, surtindo efeitos desde então. (TJ-MG - AC: 10105120247959001 MG , Relator: Duarte de Paula, Data de Julgamento: 22/05/2014, Câmaras Cíveis / 4ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 28/05/2014)

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TÓPICO-SÍNTESE

União estável União entre pessoas que desejam constituir família.

Concubinato União entre pessoas em agressão a uma união previa e validamente constituída e ainda eficaz.

Concorrência en-tre união estável

e matrimônio

É possível pois estando o casamento em situação de separação, mesmo que de fato, pode-se constituir, pa-ralelamente a este, uma união estável.

União estável putativa

Ocorre quando há duas ou mais uniões (de qualquer natureza, todas eficientes – sem separação) e uma das partes está de boa-fé. Os Tribunais ainda não fe-charam questão sobre o tema, havendo decisões favo-ráveis e contrárias.

União estável homoafetiva

Com a decisão do STF na Adin 4277 DF, entendeu-se ser cabível, por interpretação Constitucional, a união estável entre pessoas do mesmo sexo.

Conversão em casamento

Qualquer forma de união estável, seja ela homo ou heteroafetiva, deve receber tutela Estatal para ser fa-cilitada a sua conversão em Casamento, sem que com isso se afirme que o matrimônio possui status supe-rior a estas uniões.

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Do Direito das sucessões

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167

capítulo

11NOÇÕES INTRODUTÓRIAS

\ LEIA A LEI: ͳ arts. 1.784 a 1.803 CC; arts. 1.991 a 2.027 CC

1. GENERALIDADES

A pessoa, que se iniciou na parte geral do Código Civil, encontraseu derradeiro momento no Livro das Sucessões. Aqui, se chega ao momento de transmissão dos eventuais bens, direito, deveres e ônus que existiam no patrimônio de alguém para os seus sucessores. E esta expressão engloba as seguintes figuras (sucessores):

• São sucessores que recebem uma cota-parte do patrimônio. Ex.: deixo 20% dos meus bens para Fulano.

• Podem ser estabelecidos por lei (arts. 1.790 e 1.829, CC) ou por testamento.• Recebem, imediatamente, propriedade e posse.

• Recebem um bem específico ou um percentual de um bem específico. Ex.: Deixo para Beltrano minha moto ou deixo para Sicrano 20% de meu carro.

• Somente podem ser instituídos por testamento (e de forma excepcional, porcodicilo, se se tratar de bem de pequeno valor)

• Recebem apenas a propriedade de forma imediata. A posse, deverão buscarcom os herdeiros, durante o pagamento dos legados.

• É a soma, em uma mesma pessoa, das qualidades de herdeiro e legatário.• Também denominado herdeiro precípuo.

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• Não havendo outro sucessor, os bens são recolhidos ao Município ou ao Distrito Federal, se localizada nas respectivas circunscrições, ou à União, quando situada em território federal.

Para tanto, duas formas de sucessão estabeleceu o Código: a suces-são testamentária (analisada mais à frente) e a sucessão legítima, legal ou presumida, sobre a qual se debruça neste momento.

Na sucessão legítima, o legislador, com base na pressuposição de proximidade, estabelece um conjunto de regras para determinar quem receberá os bens, em razão do silêncio, total ou parcial, do de cujus em relação ao destino deles.

De acordo com a lei, a ordem é a seguinte (não sendo considerados, no esquema, as exceções):

Descendentes em

concorrência com o cônjuge

Ascendentes em

concorrência com o cônjuge

Colaterais até o 4º grau

(inclusive)CompanheiroCônjuge

Com o falecimento, os bens do de cujus passam automática e ime-diatamente para o seu sucessor. Esta situação é denominada droit de saisine, que se perfaz na noção de que os mortos perseguem os vivos para lhes entregar os bens. Isto gera uma gama de efeitos, que visam, em última situação, impedir que o patrimônio fique sem titular. Contu-do, não se aplica a saisine ao Estado, sendo que os bens seguirão para este pelo procedimento da jacência/vacância, que será visto à frente.

Doutrinadores das mais variadas visões defendiam a necessidade de se igualarem as sucessões do cônjuge e do companheiro. Note-se que a defesa se fazia em prol da igualdade na sucessão e não acerca de outros efeitos sobre a condição de herdeiro. Um deles, contudo, merece destaque, já que o Enunciado 117 CJF denota a necessidade de se equi-pararem direito ou, ao menos, que não se reconheçam retrocessos em tema de sucessão do companheiro. Neste sentido o direito real de habi-tação deve ser estendido ao companheiro, seja por não ter sido revogada

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169Cap. 11 • NOÇÕES INTRODUTÓRIAS

a previsão da Lei n. 9.278/96, seja em razão da interpretação analógica do art. 1.831, informado pelo art. 6º, caput, da CF/88.

Enfrentando a discussão acerca da igualdade de sucessões, o STF reconheceu nos RExts 646721 e 878694 a necessária igualdade entre as sucessões, nos termos seguintes:

DIREITO CONSTITUCIONAL E CIVIL. RECURSO EXTRAORDI-NÁRIO . REPERCUSSÃO GERAL. INCONSTITUCIONALIDADE DA DISTINÇÃO DE REGIME SUCESSÓRIO ENTRE CÔNJUGES E COM-PANHEIROS. 1. A Constituição brasileira contempla diferentes formas de família legítima, além da que resulta do casamento. Nesse rol incluem-se as famílias formadas mediante união es-tável. 2. Não é legítimo desequiparar, para fins sucessórios, os cônjuges e os companheiros, isto é, a família formada pelo ca-samento e a formada por união estável. Tal hierarquização entre entidades familiares é incompatível com a Constituição de 1988. 3. Assim sendo, o art. 1790 do Código Civil, ao revogar as Leis nºs 8.971/94 e 9.278/96 e discriminar a companheira (ou o compa-nheiro), dando-lhe direitos sucessórios bem inferiores aos confe-ridos à esposa (ou ao marido), entra em contraste com os prin-cípios da igualdade, da dignidade humana, da proporcionalidadecomo vedação à proteção deficiente, e da vedação do retrocesso.4. Com a finalidade de preservar a segurança jurídica, o entendi-mento ora firmado é aplicável apenas aos inventários judiciaisem que não tenha havido trânsito em julgado da sentença de par-tilha, e às partilhas extrajudiciais em que ainda não haja escriturapública. 5. Provimento do recurso extraordinário. Afirmação, emrepercussão geral, da seguinte tese: “No sistema constitucionalvigente, é inconstitucional a distinção de regimes sucessóriosentre cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado, em am-bos os casos, o regime estabelecido no art. 1.829 do CC/2002”.(RExt 878.694, MG, rel. Min. Roberto Barroso. j.10.05.2017. DJe06/02/2018).

Note-se que a decisão, buscando dar segurança jurídica, reconhe-ceu que a interpretação tem efeito retroativo, alcançando as sucessões já abertas desde que não tenham, ainda, trânsito em julgado de suas sentenças ou a consolidação de escritura pública de partilha. Não im-porta quando se deu o falecimento, alcançando, até mesmo (no enten-der destes escritos) as sucessões abertas no Código Civil de 1916 e ain-da não finalizadas. Não importa, inclusive haja até mesmo sentença que decida ou homologue a partilha, sendo possível sua modificação se não houver trânsito em julgado.

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Deve-se atentar, contudo, que não se pode, no caminho da decisão do STF, ter como válida a conclusão de que o companheiro passou à condição de herdeiro necessário. A condição de herdeiro legitimatário (que não se confunde com a de legítimo) é decorrente do art. 1.845, CC e não se pode interpretar extensivamente, sob pena de majorar limita-ção sobre a liberdade de testar.

As figuras de herdeiros legitimatários (ascendentes, descendentes e cônjuge) prestam, hoje, um desfavor ao sistema sucessório de nosso país. Limitar a liberdade de testar sob a justificativa de uma necessária proteção a certas pessoas, não pode prosperar. Isto porque, melhor ca-minho teria adotado o legislador, como já se observa em outros países, se estabelecesse a plena liberdade de testar e reservasse às apontadas figuras a possibilidade requerer pensionamento aos herdeiros testa-mentários e legatários quando, por razões circunstanciais, restassem sem meios de prover seu sustento.

Hoje, em razão da necessidade de celeridade na transmissão dos bens para os herdeiros, vez que a complexidade das relações exige, constantemente, que as estruturas se envolvam em acordos, transmis-sões ou figuras que se pautam no fluxo patrimonial, o planejamento sucessório vem ganhando especial atenção. “Dessa maneira, faz-se necessária a análise das relações familiares, diante da conexão jurídi-ca e social do direito de família com o direito de sucessões, somada à transformação enfrentada pela família com o reconhecimento jurídico de alguns novos modelos familiares. Consequentemente, ocorre uma alteração substancial no direito sucessório em sua concepção da titu-laridade e da posse do patrimônio e no destino destes após a morte” (TEIXEIRA, 2017: 37)

Muitas pessoas confundem o planejamento legal e importante, com a busca por mecanismos que promovam a redução de tributação, comu-mente denominada de blindagem patrimonial. A blindagem, no mais das vezes, envolve ocultação de bens ou subterfúgios que, atraentes à primeira vista, podem resultar em sérios prejuízos aos envolvidos, in-clusive podendo caracterizar condutas criminosas.

E o que seria o planejamento sucessório e quais as vantagens daí advindas? Primeiramente, é importante compreender que planejar a sucessão dos bens não é algo que apenas os milionários ou pessoas de grande patrimônio podem fazer. Há mecanismos e possibilidades de planejamento sucessório para todas as variações patrimoniais. Desde

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171Cap. 11 • NOÇÕES INTRODUTÓRIAS

os codicilos até a formação de trust, passando pelos will substitutes, va-riadas formas e tamanhos patrimoniais podem ser tratados.

Desta forma, diversas questões patrimoniais, tributárias, familiares e pessoais podem (e devem) ser levadas em consideração quando se busca realizar o planejamento sucessório. Muitas das vezes, a organi-zação da sucessão possibilita que se evite, no futuro, brigas interminá-veis na Justiça que unicamente servirão para dilapidar os bens deixados pelo finado. Ou seja, mesmo que não ocorra o afastamento da neces-sidade de um inventário ou mudança na tributação, o simples passar do tempo sem solução de acertamento entre os herdeiros, gera custos altos e, além disso, coloca em risco a conservação dos bens, abrindo brechas para pessoas de má-fé.

Soluções válidas e legais são muitas. Como exemplo, vale lembrar os testamentos, que são a mais simples e eficiente forma de planeja-mento sucessório, envolvendo desde a designação de bens específicos para cada herdeiro até o estabelecimento de um testamenteiro para dar andamento a tudo que for necessário. Existem mecanismos inte-ressantes, como os will substitutes, que, nas palavras de Daniele Chaves Teixeira, “são uma forma de planejamento sucessório para minimizar a tributação, concretizar o objetivo do autor da herança, prevenir li-tígios, agilidade, mas não pode ser utilizados para propósito ilegal ou contrário à ordem pública” (TEIXEIRA, 2017: 187), valendo destacar que reduzir tributação, aqui, deve ser entendido como dentro da lei, ou seja, procurar o melhor caminho tributário para a questão. Duas formas muito utilizadas de will substitutes em nosso país são o seguro de vida e a previdência privada. Por fim, há exemplos como o trust, conhecido e muito utilizado em outros país, mas que não tem regulamentação legal no Brasil (o que dificulta, mas não impede sua utilização). Nele é indi-cado um órgão gestor do patrimônio em caso de morte, que repassará aos herdeiros os valores deixados no testamento.

E, por fim, quando o planejamento sucessório envolve empresas (familiares ou não) as diversas possibilidades de aplicação da organi-zação prévia demonstram quão benéfica é a antecipação consciente de variadas questões. Sócios inaptos para a direção da entidade, pessoas cuja presença, por si só, possa se tornar perniciosa para a empresa, pre-venção de posições litigiosas de sócios-herdeiros são apenas alguns dos exemplos que podem ser antecipados e evitados mediante boa orienta-ção jurídica.

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“Em um planejamento, a aplicação dos instrumentos altera-se con-forme o patrimônio; dessa forma, quando se está diante de um vultoso patrimônio a ser partilhado, a utilização de sociedades empresariais se adequa melhor, pois é possível que os atos de gestão empresarial se concentrem, já que, para fins de administração, o patrimônio móvel ou imóvel está concentrado em apenas uma empresa, além de acelerar a partilha, que será sobre as quotas ou ações da sociedade. Ainda reduz a carga tributária, pois o imposto de renda será sobre a pessoa jurídi-ca” (TEIXEIRA, 2017: 149). Há uma infinidade de alternativas e deve-se perceber que isso, de forma alguma, tem qualquer influência quanto ao momento da morte. Tratar destas questões não atrairá ou antecipará o destino da pessoa. Pelo contrário, possibilitará que, na ocorrência de seu passamento possam os herdeiros solucionar a divisão patrimonial da forma mais simples e rápida possível.

2. DA HERANÇA E SUA ADMINISTRAÇÃO

A herança é sempre uma universalidade de direito, permane-cendo assim até o momento da partilha, quando findará tal condição. Desta forma, da abertura da sucessão até a efetivação da partilha (com sua homologação) haverá entre os herdeiros copropriedade e compos-se dos bens (já os legatários apenas ingressarão na copropriedade – uma vez que a saisine em relação a eles não afeta imediatamente aposse). Nesta condição, o condomínio estabelecido entre todos é co-mum, sendo o representante o inventariante ou testamenteiro.

A partir deste condomínio e de sua compreensão resta claro que os herdeiros não podem transferir um bem específico antes de par-tilhado o monte. Durante o período de indivisão o que ele poderá fa-zer é ceder sua cota hereditária, através de escritura pública. Qualquer alienação específica neste período será válida, porém ineficaz perante o monte. A aquisição por cessão cria um negócio aleatório, visto nãoser possível precisar o que restará ao final. Contudo, eventual direitode acrescer ou substituição na herança não estão abrangidos pela ces-são, por estarem ligados diretamente à qualidade de herdeiro e não aos bens em si.

Esta cessão está subordinada às regras gerais do condomínio, den-tre as quais a da preferência do condômino tanto por tanto. Havendo herdeiro que deseje a cota em igualdade de condições com estranhos terá, aquele, preferência.

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173Cap. 11 • NOÇÕES INTRODUTÓRIAS

Isto implica na obrigação de notificação de todos os herdeiros acer-ca da oferta, sob pena de ineficácia da alienação. Não realizada a no-tificação, o coerdeiro preterido terá direito, depositando o preço, ter para si a cota cedida, desde que o faça até 180 dias após a transmissão. Um ponto, contudo, difere da regra de preferência do condomínio: na situação de mais de um herdeiro interessado, todos poderão exercer o direito de aquisição, sendo rateada a cota aos cessionários.

Transmissão de cota

Transmissão de bem

individualizadoPartilha

Perceba, leitor, que a entrega do patrimônio se faz em sua integra-lidade, abrangendo também as dívidas. Contudo, estas obrigações po-derão sofrer influências diferenciadas.

Assim, as obrigações personalíssimas são extintas com a morte do devedor, sendo necessário apenas restituir as partes ao status quo ante (estado anterior à obrigação assumida, com a devolução de adian-tamentos, por exemplo).

De outro lado, não são transmissíveis obrigações além das for-ças da herança, devendo o herdeiro fazer prova desta impossibilidade. Esta prova pode ser feita por inventário negativo, ou por outro meio idôneo, e se não o for gerará para o herdeiro o dever de pagar a dívida até que faça prova da impossibilidade.

Isto ocorre por que ao herdeiro somente é entregue, de forma defi-nitiva, o patrimônio líquido, uma vez que primeiro são pagas as dívi-das. Cabe, portanto a ele demonstrar a inexistência de bens suficientes.

3. DO INVENTÁRIO E DA PARTILHA

O inventário e a partilha são duas medidas tomadas em um únicocorpo processual que visam levantar todo o patrimônio do de cujus, reunindo dívidas e bens em um monte (monte partilhável). Uma vez retirada a meação, chega-se ao monte-mor, que será, então liquidado.

O inventário deve ser iniciado em até dois meses, art. 611, CPC) após a abertura da sucessão e findar nos subsequentes 12 (doze)