SUMÁRIO · ALEXSANDER Φιλοσοφία 3 verdade e possuir sabedoria. A ética aristotélica se...

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SUMÁRIO Ética ou Filosofia Moral...........................................................................................................................................p.02 Jean Paul Sartre Aristóteles Immanuel Kant Friedrich Nietzsche Sugestões...............................................................................................................................................................p.19 Referências.............................................................................................................................................................p.21

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SUMÁRIO

Ética ou Filosofia Moral...........................................................................................................................................p.02

Jean Paul Sartre

Aristóteles

Immanuel Kant

Friedrich Nietzsche

Sugestões...............................................................................................................................................................p.19

Referências.............................................................................................................................................................p.21

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Introdução

Quando pensamos em ética, quase que imediatamente vem em nossa mente o termo moral, contudo, é necessário sabermos que são, apesar de próximos, distintos. Vejamos. Ética: Atitude reflexiva a cerca de nossa moral; “o bem pensar sobre o reto agir”, ou seja, o pensamento consistente sobre a correção de nossas ações. A essa correção chamamos de moralidade. A ética é uma ciência da práxis humana, isto é, um saber que tem por objeto a ação. Cria o objeto (a ação) e difere, portanto, da física e da metafísica, que são ciências teoréticas, ciências que não criam seus objetos, mas apenas os contemplam. “Ter uma moralidade implica, no mínimo, reconhecer princípios que se aplicam imparcialmente à própria conduta, como também às dos outros, e, mais ainda, princípios que podem ser uma restrição ou limitação à busca dos próprios interesses. (...) Um homem cujos juízos morais coincidem sempre com seus próprios interesses, estaria sujeito a suspeita de não ter, afinal, nenhuma moralidade”. Moral: é o conjunto de regras de condutas baseadas nas noções de bem e de mal inseridas em uma sociedade e válidas para uma coletividade.

As diversas éticas: É comum ouvirmos falar em ética. Virou moda até. Fala-se de ética médica, ética docente, ética profissional, ética política, dentre outras. E na realidade existem várias mesmo. Vejamos algumas.

A Teleológica: (Aristóteles) afirma ter um fim (téleos) pelo qual a ação moral é orientada. A Universalista: (Kant) defende a existência de um princípio geral, válidos para todos. A Contratualista: (Hobbes) defende que os princípios da ação devem ser avaliados por um contrato entre as partes interessadas. A Política: (Maquiavel) possui uma ética e lei própria, totalmente diferente da ética cristã.

“Sou responsável por meus atos, assim como sou responsável por meus filhos”.

A Felicidade: o supremo bem Foi o primeiro a escrever uma obra exclusivamente dedicada a questões éticas. A ele são atribuídos quatro tratados, onde o mais completo é um composto de dez livros, A Ética a Nicômaco, (em homenagem a seu pai Nicômaco), que parte de uma concepção de bem como fim último de todas as coisas. O conhecimento desse bem seria manifesto pela ação política. Qual é o bem que o ser humano busca para sua realização segundo Aristóteles? A resposta é a vida ideal como vivência das virtudes na pólis, junto com os outros (relação entre os indivíduos dentro da comunidade política, pois, somente na cidade os homens podem alcançar o bem propriamente humano) e essa vivência é a felicidade. O grau máximo de felicidade é a beatitude. Alcançar o bem é o objetivo das ações humanas. O fim supremo da existência humana é a felicidade. Tudo aquilo que se busca, se busca por um fim, para se conseguir algo. A felicidade, no entanto, é um fim em si mesma. Qual seria, então, a ciência cujo objeto de estudo é o Sumo Bem, o bem comum? Para Aristóteles é a Política, (“a arte mestra”), assim como para o corpo humano é a Medicina e para as edificações é a Arquitetura. A investigação ética, segundo Aristóteles, tenta mostrar o bem relativo á consciência política, a saber, a FELICIDADE (eudaimonia). Para tanto, seria necessário que os cidadãos agissem por meio de um princípio racional e não por paixões. A HONRA era a finalidade da vida política e sua busca se daria por causa da virtude. Aristóteles supôs ser esta a razão pela qual o homem vive em sociedade. Para o estagirita, o homem virtuoso encontra prazer em seus próprios atos. A aristotélica propõe que a conduta humana numa comunidade, seja conduzida por leis que promovam a realização desse bem supremo que é a felicidade de poder contemplar a

FILOSOFIA MORAL OU ÉTICA

ARISTÓTELES de EStagira (384-322 a.C)

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verdade e possuir sabedoria. A ética aristotélica se mantinha dentro de uma perspectiva onista, ou seja, concebida e aplicada a uma única noção de mundo, numa política exercida por homens reais, de carne e osso. A honra, a riqueza, o prazer, e a inteligência, por exemplo, são buscados como meios para outros fins. Já a ética é procurada por si mesma, por isso, é um bem mais perfeito do que os outros. O sujeito ético ou moral não se submete aos acasos da sorte, à vontade e aos desejos de um outro, à tirania das paixões; mas obedece apenas a sua consciência (que conhece o bem e as virtudes) e a sua vontade racional (que conhece os meios adequados para chegar aos fins morais).

A essência da vida ética A essência da vida ética é à busca de bem e da felicidade. A primeira tarefa da ética é a educação de nosso caráter ou de nossa natureza para seguirmos a orientação da razão. A ética, portanto, era concebida como educação do caráter do sujeito moral para dominar racionalmente impulsos, apetites e desejos para orientar a vontade rumo ao bem e à felicidade e para formá-lo como membro da coletividade sociopolítica, sua finalidade era a harmonia entre o caráter do sujeito virtuoso e os valores coletivos, que também deveriam ser virtuosos. Conhecemos duas espécies de virtudes, as intelectuais e as morais.

Virtudes Intelectuais: é o resultado do ensino

e por isso precisam de tempo e experiência. Exemplo: aprender tocar lira.

Virtudes Morais: adquiridas em resultado do

hábito e exercício e não surgem em nós por natureza. Exemplo: praticar atos justos para se tornar alguém justo. É pelos atos que praticamos nas relações entre os homens, que nos tornamos justos ou injustos. Por isso, se faz necessário estar atento para as qualidades de nossos atos: tudo depende deles, desde a nossa juventude, existe a necessidade de habituarmos a praticar atos virtuosos.

A Responsabilidade (O ato e o caráter) O princípio da responsabilidade baseia-se em duas pressuposições. A primeira é que a realidade é contingente (o futuro não está definido). A segunda é que a realidade depende do indivíduo que age (o individuo é autor de seus atos quando o ato depende dele). Aristóteles afirma que o caráter é resultado de nossos atos e não recebe suas determinações da natureza, da educação, da idade e da condição social, mas é produto da série de meus atos. Passo a ser declarado autor de meu caráter assim como o sou de

meus atos. “Sou responsável por meus atos, assim como sou responsável por meus filhos”. Vícius e virtudes não são simples traços psicológicos adquiridos, mas tem significado moral, porque pertencem ao campo daquilo que depende de nós. Na dupla afirmação da realidade, sobre o ato e o caráter, o homem será declarado responsável por seus atos e pela construção de seu caráter. Parece que o elemento para distinguir o jovem do adulto é que o primeiro age para formar o seu caráter, enquanto que o segundo age a partir do seu caráter, com a intenção de realizar seu fim, ser feliz. Contudo, na medida em que os fins visados dependem do caráter, as decisões do adulto parecem inteiramente determinadas pelo condicionamento educativo que teve na infância. Isso não significa que o caráter do jovem, formado pelos hábitos impostos pelo educador, não é ainda virtuoso ou vicioso. A virtude e o vício só se desenvolvem através dos atos de que só o adulto é capaz, porque se realizam principalmente no quadro da vida cívica ou militar. A passagem da infância para a vida adulta é fundamental na formação do caráter, pois, é pela doçura ou pela rebelião que o jovem adquire boas ou más disposições em face das paixões, mas é por suas decisões que o adulto adquire vício ou virtude, isto é, um caráter moral. Na opinião de Aristóteles, pelo mesmo motivo, cada caráter determina ou causa paixões diferentes e está mais propenso a determinados vícios e a determinadas virtudes. No entanto, em todos eles, o vício é sempre excesso ou falta entre dois extremos opostos. Dizer que o vício é excesso ou falta significa dizer que ele é a falta de medida ou de moderação. Podemos então seguir Aristóteles dizendo:

A causa material da ação é o ethos.

A causa formal, a natureza racional do agente.

A causa eficiente, a educação.

A causa final, o bem. A unidade das quatro causas é a virtude. Portanto, a virtude é a medida entre os extremos contrários, a moderação entre dois extremos, o justo-meio, nem excesso e nem falta.

A justa medida, o justo-meio e o meio-termo Há uma medida para todas as ações humanas, que é o justo-meio. A felicidade é definida como atividade da alma, dirigida pela virtude perfeita; é excelente e divina, mas não é presente dos deuses, pois, é adquirida pelo hábito e através de muita prática das virtudes. As virtudes morais consistem em ser um meio entre dois extremos viciosos. Em toda quantidade é possível distinguir o excesso, o pouco e uma medida, que é o meio-termo; quando se trata de coisas, o meio-termo é aquele ponto que se encontra em igual distância entre dois extremos, mas quando se trata do

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homem, o meio-termo é aquilo que não peca nem por excesso e nem por falta ou defeito, e esta medida muda muito e não é única para todos os homens. Como é difícil estabelecer o justo-meio em cada caso particular, deve-se deixar esta definição a uma pessoa sensata, que decida retamente; mas há casos em que não cabe estabelecer nenhuma medida, assim como em excesso não existe medida. Aristóteles analisa três formas através das quais se poderiam afirmar ser possível alcançar a felicidade: uma vida de prazeres ou gozos, uma vida com honra ou política e uma vida como filósofo (contemplação). Aristóteles descarta as duas primeiras, uma vida de prazeres ou gozos é totalmente contrária à virtude, pois, premia o excesso, também descarta a honra como felicidade, pois, esta não é coisa interior, mas sim uma coisa conferida à pessoa por terceiros. Toda ação tende para um fim e temos virtude porque agimos corretamente. Não deve ser em falta nem em excesso, tudo no meio termo, ou moderadamente. Aristóteles fala do homem ideal, que não se preocupa em demasiado, mas dá a vida nas grandes crises. Não tem maldade, não gosta de falar, enfim é pouco vaidoso. Na Ética a Nicômaco, Aristóteles fornece a seguinte relação de vício e virtude:

A mansidão é o ponto médio entre a iracúndia e a impassibilidade;

A coragem é o ponto médio entre a temeridade e a covardia;

A verecúndia é o ponto médio entre a imprudência e a timidez;

A temperança é o ponto médio entre a intemperança e a insensibilidade;

A indignação é o ponto médio entre inveja e o excesso oposto que não tem nome;

A justiça (a virtude ética mais importante) é o ponto médio entre o ganho e a perda;

A liberalidade é o ponto médio entre prodigalidade e a avareza;

A veracidade é o ponto médio entre pretensão e o autodesprezo;

A amabilidade é o ponto médio entre a hostilidade e a adulação;

A seriedade é o ponto médio entre a complacência e a soberba;

A magnanimidade é o ponto médio entre a vaidade e a estreiteza da alma. Nessas ações, a virtude ética é a justa medida em que a razão impõe a sentimentos, ações ou atitudes, que sem o devido controle, tendem para o excesso. A virtude não é uma inclinação, mas uma disposição. É um hábito adquirido ou uma disposição constante e permanente para agir racionalmente em conformidade com uma medida humana, determinada pelo homem prudente. A tarefa da ética é orientar-nos para a aquisição desse hábito, tornando-nos virtuosos e, se possível, prudentes.

A virtude é ação, atividade da vontade que delibera e escolhe segundo orientação da razão, a qual determina os fins racionais de uma escolha, com vista ao bem do agente, isto é, sua felicidade. Aristóteles diz que não nascemos bons, mas nos tornamos bons com atos bons, pois, atualizam nossa potencialidade para a razão e para a felicidade. É porque a virtude é a medida ou o justo meio e a prudência é a condição e coroamento de todas as virtudes.

Ética a Nicômaco,

Livro II Capítulos 8-9

8. Em relação ao meio-termo, em alguns casos é a

falta e em outros é o excesso que está mais afastado; por exemplo, não é a temeridade, que é o excesso, mas a covardia, que é a falta, que é mais oposta à coragem, e não é a insensibilidade, que é uma falta, mas a concupiscência, que é um excesso, que é mais oposta à moderação. Isto acontece por duas razões; uma delas tem origem na própria coisa, pois por estar um extremo mais próximo ao meio-termo e ser mais parecido com ele, opomos ao intermediário não o extremo, mas o seu contrário. Por exemplo, como se considera a temeridade mais parecida com a coragem, e a covardia mais diferente, opomos esta última à coragem, pois as coisas mais afastadas são tidas como mais contrárias a ele; a outra razão tem origem em nós mesmos, pois as coisas para as quais nos inclinamos mais naturalmente parecem mais contrárias ao meio-termo. Por exemplo, tendemos mais naturalmente para os prazeres, e por isso somos levados mais facilmente para a concupiscência do que para a moderação. Chamamos, portanto, contrárias ao meio-termo as coisas para as quais nos sentimos mais inclinados; logo, a concupiscência, que é um excesso, é mais contrária à moderação.

9. Já explicamos suficientemente, então, que a excelência moral [areté ethiké, virtude] é um meio-termo e em que sentido ela o é, e que ela é um meio-termo entre duas formas de deficiência moral, uma pressupondo o excesso e outra pressupondo a falta, e que a excelência moral é assim porque sua característica é visar às situações intermediárias nas emoções [páthoi] e nas ações. Por isso, ser bom não é um intento fácil, pois em tudo não é um intento fácil determinar o meio – por exemplo, determinar o meio de um círculo não é para qualquer pessoa, mas para as que sabem; da mesma forma, todos podem encolerizar-se, pois isso é fácil, ou dar ou gastar dinheiro; mas proceder assim em relação à pessoa certa até o ponto certo, no momento certo, pelo motivo certo e da maneira certa não é para qualquer um, nem é fácil; portanto, agir bem é raro, louvável e nobilitante. Quem visa ao meio-termo deve primeiro evitar o

LEITURA COMPLEMENTAR:

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extremo mais contrário a ele, de conformidade com a advertência de Calipso: “Mantém a nau distante desta espuma e turbilhão.”

De dois extremos, com efeito, um induz mais ao erro e o outro menos; logo, já que atingir o meio-termo é extremamente difícil, a melhor entre as alternativas restantes, como se costuma dizer, é escolher o menor dos males, e a melhor maneira de atingir esse objetivo é a que descrevemos. Mas devemos estar atentos aos erros para os quais nós mesmos nos inclinamos mais facilmente, pois algumas pessoas tendem para uns e outras para outros; descobri-lo-emos mediante a observação do prazer ou do sofrimento que experimentamos; isto feito, devemos dirigir-nos resolutamente para o extremo oposto, pois chegaremos à situação intermediária afastando-nos tanto quanto possível do erro, como se faz para acertar a madeira empenada.

Em tudo devemos precaver-nos, principalmente contra o que é agradável e contra o prazer, pois não somos juízes imparciais diante deste. Devemos sentir-nos em relação ao prazer da mesma forma que os anciãos do povo se sentiram diante de Helena, e repetir em todas as circunstâncias as suas palavras, pois se o afastamos de nós é menos provável que erremos. Em resumo, é agindo desta maneira que seremos mais capazes de atingir o meio-termo.

Mas sem dúvida isto é difícil, especialmente nos casos particulares, porquanto não é fácil determinar de que maneira, e com quem e por que motivos, e por quanto tempo devemos encolerizar-nos; às vezes nós mesmos louvamos as pessoas que cedem e as chamamos de amáveis, mas às vezes louvamos aquelas que se encolerizam e as chamamos de viris. Entretanto, as pessoas que se desviam um pouco da excelência não são censuradas, quer o façam no sentido do mais, quer o façam no sentido do menos; censuramos apenas as pessoas que se desviam consideravelmente, pois estas não passarão despercebidas. Mas não é fácil determinar racionalmente até onde e em que medida uma pessoa pode desviar-se antes de tornar-se censurável (de fato, nada que é percebido pelos sentidos é fácil de definir); tais coias dependem de circunstâncias específicas, e a decisão depende da percepção. Isto é bastante para determinar que a situação intermediária deve ser louvada em todas as circunstâncias, mas que às vezes devemos inclinar-nos no sentido do excesso, e às vezes no sentido da falta, pois assim atingiremos mais facilmente o meio-termo e o que é certo. (ARISTÓTELES.

Ética a Nicômaco. Livro II, c.8- 9)

QUADRO DAS VIRTUDES MORAIS

Sentimento ou paixão

(por natureza)

Situação em que o

sentimento ou a paixão

são sucitados

Vício (excesso) (por deliberação e por escolha)

Vício (falta) (por

deliberação e por escolha)

Virtude (justo meio) (por

deliberação e por escolha)

Prazeres Tocar, ter

ingerir. Libertinagem Insensibilidade Temperança

Medo Perigo, dor Covardia Temeridade Coragem

Confiança Perigo, dor Temeridade Covardia Coragem

Riqueza Dinheiro,

bens Prodigalidade Avareza Liberalidade

Fama Opinião alheia

Vaidade Humildade Magnificência

Honra Opinião alheia

Vulgaridade Vileza Respeito próprio

Cólera Relação com os outros

Irascibilidade Indiferença Gentileza

Convívio Relação com os outros

Zombaria Grosseria Agudeza de

espírito

Conceder prazer

Relação com os outros

Condescência Tédio Amizade

Vergonha Relação de

si com outros

Sem-vergonhice

Timidez Modéstia

Sobre a boa sorte de alguém

Relação dos outros

consigo Inveja Malevolência

Justa apreciação

Sobre a má sorte de alguém

Relação dos outros

consigo Malevolência Inveja

Justa indignação

CHAUÍ, Marilena de Souza. Introdução à história da filosofia: dos pré-socráticos a Aristóteles, vol. 01. São Paulo: Brasiliense, 1994.

1) (UFU-MG/PAIES) Leia com atenção o texto abaixo.

“Aristóteles acrescenta à consciência moral, trazida

por Sócrates, a vontade guiada pela razão como o outro elemento fundamental da vida ética”. CHAUI, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 1995, p. 341.

Com relação ao pensamento ético de Aristóteles, mar-que para as alternativas abaixo (V) verdadeira, (F) falsa. ( ) A virtude que melhor expressa o modo como a vontade pode ser guiada pela razão é a pr udência. ( ) O fundamento da prudência é a ideia suprema do bem, que somente pode ser alcançada no mundo suprassensível. ( ) O homem prudente jamais faz escolhas ao conduzir suas ações, pois age somente em conformidade com as leis da natureza. ( ) A vontade guiada pela razão deve escolher sempre a posição que melhor expresse o meio-termo entre dois extremos. 2) O que é o “meio-termo” proposto por Aristóteles?

ATIVIDADES

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3) (...) uma pessoa age injustamente ou justamente sempre que pratica tais atos voluntariamente; quando os pratica involuntariamente, ela não age injustamente nem justamente, a não ser de maneira acidental. O que determina se um ato é ou não é um ato de injustiça (ou de justiça) é sua voluntariedade ou involuntariedade; quando ele é voluntário, o agente é censurado, e somente neste caso se trata de um ato de injustiça, de tal forma que haverá atos que são injustos mas não chegam a ser atos de injustiça se a voluntariedade também não estiver presente.

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Nova Cultural, 1996, p. 207.

Com base no texto e nos conhecimentos sobre a concepção de justiça em Aristóteles, é correto afirmar:

a) Um ato de justiça depende da consciência do agente e de ter sido praticado voluntariamente. b) A noção de justo desconsidera a discriminação de atos voluntários e involuntários quanto ao reconhecimento de mérito. c) A justiça é uma noção de virtude inata ao ser humano, a qual independe da voluntariedade do agente. d) O ato voluntário desobriga o agente de imputabilidade, devido à carência de critérios para distinguir a justiça da injustiça. e) Quando um homem delibera prejudicar outro, a

injustiça está circunscrita ao ato e, portanto, exclui o

agente.

4) Para Aristóteles, a questão da ética se mistura com a: a) maiêutica. b) “sombra” da caverna. c) política. d) estética. e) ideia de Deus. 5) Estabeleça a diferença entre virtudes intelectuais e virtudes morais 6) Discorra a respeito da noção de responsabilidade segundo Aristóteles

Vida e Obra

Immanuel Kant, filósofo alemão, crítico do século XVIII, nascido em Königsberg (atual Kaliningrado), na altura pertencente à Prússia, grande cidade universitária da Alemanha e também centro

comercial muito ativo para onde afluíam homens de nacionalidade diversa, em 22 de Abril de 1724, teve uma vida longa e tranqüila, dedicada ao ensino e à investigação filosófica. Considerado o último grande filósofo dos principais da era moderna, um representante do iluminismo e indiscutivelmente um de seus pensadores mais influentes. Kant teve um grande impacto no Romantismo alemão e nas filosofias idealistas do século XIX, tendo esta sua faceta idealista sido um ponto de partida para Hegel. Homem metódico e de hábitos arraigados, lecionou durante quarenta anos na universidade de Königsberg, apenas deixando o magistério por problemas de saúde. Foi o quarto dos nove filhos de Johann Georg Kant, um artesão fabricante de correias (componente das carroças de então) e de sua mulher Regina. Nascido numa família protestante, teve uma educação austera numa escola pietista, que frequentou graças à intervenção de um pastor. Passou grande parte da juventude como estudante, sólido mas não espetacular, preferindo o bilhar ao estudo. Tinha a convicção curiosa de que uma pessoa não podia ter uma direcção firme na vida enquanto não atingisse os 39 anos. Com essa idade, era apenas um metafísico menor numa universidade prussiana, mas foi então que uma breve crise existencial o assomou. Pode argumentar-se que teve influência na sua posterior direção. Kant foi um respeitado e competente professor universitário durante quase toda a sua vida, mas nada do que fez antes dos 50 anos lhe garantiria qualquer reputação histórica. Kant nunca deixou a Prússia e raramente saiu da sua cidade natal. Apesar da reputação que ganhou, era considerado uma pessoa muito sociável: recebia convidados para jantar com regularidade, insistindo que a companhia era boa para a sua constituição física. O empirismo, sobretudo de Hume, terá influência fundamental no pensamento de Kant, que diz: “Hume despertou-me de meu sonho dogmático”. Pode-se considerar a obra Kantiana do período critico, em parte pelo menos como uma tentativa de responder às críticas do empirismo ao racionalismo e, ao mesmo tempo, de conciliar a ambas as posições: Kant tenta encontrar uma solução que supere a dicotomia representada pelo ceticismo empírico e pelo racionalismo. Basicamente a evolução filosófica de Kant é assinalada por dois períodos. No primeiro período, dito pré-crítico, voltou sua atenção para os problemas do Ser, da filosofia da natureza e da religião, da lógica e da ética. Ele esteve convencido que a filosofia poderia ser alçada à condição de ciência especulativa teórica, ou seja, poderia ser fundamentada sem o auxílio dos dados da experiência sensível. Por volta de 1770, com 46 anos, Kant leu a obra do filósofo escocês David Hume e começa a partir daí o segundo período, conhecido como crítico (ponto culminante de sua trajetória filosófica), pois, confiava no poder da razão, confiança esta reforçada pelas descobertas científicas da época.

IMMANUEL KANT (1724-1804)

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Buscou apoiar essa crença num fundamento sólido e tomou para si, a tarefa de eliminar dúvidas sobre os objetos do conhecimento. Questiona se é possível uma “razão pura” independente da experiência. Diante da questão “qual é o verdadeiro valor dos nossos conhecimentos e o que é conhecimento?”, Kant coloca a razão num tribunal para julgar o que pode ser conhecido legitimamente e que tipo de conhecimento não tem fundamento. Com isso, tenta superar a dicotomia racionalismo-empirismo. Uma curiosidade: Conta-se que Kant era um homem tão metódico que quando caminhando pelas ruas de sua cidade natal, passava na frente das casas,

seus moradores acertavam seus relógios por ele, pois, sabiam que eram às 15h30min. Acordava sempre às 5h da manhã e se deitava às 22h e percorria sempre o mesmo itinerário de sua casa até a Universidade. Duas circunstâncias fizeram-no perder a hora: a publicação do Contrato Social de Rosseau, em 1762, e a notícia da vitória francesa em Valmy, em 1792. Com problemas de saúde, morre aos 80 anos, em 12 de Fevereiro de 1804, sem nunca ter se afastado das imediações de sua cidade natal.

Obras: Kant sentiu-se profundamente perturbado, achava o argumento de Hume irrefutável, mas as suas conclusões inaceitáveis. Durante 10 anos não publicou nada e, então, em 1781 publicou o massivo "Crítica da Razão Pura", um dos livros mais influentes da filosofia moderna. Neste livro, ele desenvolveu a sua noção de um argumento transcendental para mostrar que, em suma, apesar de não podermos saber necessariamente verdades sobre o mundo "como ele é em si", estamos forçados a percepcionar e a pensar acerca do mundo de certas formas: podemos saber com certeza um grande número de coisas sobre "o mundo como ele nos aparece": por exemplo, que cada evento estará causalmente conectado com outros, que aparições no espaço e no tempo obedecem a leis da geometria, da aritmética, etc. Nos cerca de vinte anos seguintes, até à sua morte em 1804, a produção de Kant foi incessante. O seu edifício da filosofia crítica foi completado com a "Crítica da Razão Prática", que lidava com a moralidade de forma similar ao modo que a primeira "crítica" lidava com o conhecimento; e a "Crítica do Julgamento", que lidava com os vários usos dos

nossos poderes mentais que nem conferem conhecimento factual nem nos obrigam a agir: o julgamento estético (Do Belo e Sublime) e julgamento teleológico (Construção de Coisas Como Tendo "Fins"). Como Kant os entendeu, o julgamento estético e teleológico conectam os nossos julgamentos morais e empíricos um ao outro, unificando o seu sistema. Uma de suas obras, em particular, atinge hoje em dia grande destaque entre os estudiosos da filosofia moral. "A Fundamentação da Metafísica dos Costumes" é considerada por muitos filosofos a mais importante obra já escrita sobre a moral. É nesta obra que o filosofo delimita as funções da ação moralmente fundamentada e apresenta conceitos como o Imperativo Categórico e a Boa Vontade. Aparte isto, Kant escreveu alguns ensaios medianamente populares sobre história, política e a aplicação da filosofia à vida. Quando morreu, estava a trabalhar numa projetada "quarta crítica", tendo chegado à conclusão de que o sistema estava incompleto; este manuscrito foi então publicado como Opus Postumum.

Introdução “Age de tal modo que a máxima da tua ação se possa tornar um princípio de uma legislação universal”. (Kant) A ética kantiana é conhecida como Universalista, pois, Kant defende um princípio moral universal, ou seja, válido para todos. Também é conhecida como Normativa, pois, devem-se seguir as normas ou ordens da razão.

Kant sustenta que há uma lei moral objetiva. Ela é conhecida por nós pela razão e jamais pela experiência. Essa lei nos obriga a agir ou a nos abster de agir, simplesmente em razão de que a ação é exigida pela lei, ou proibida por ela. Trata dos seguintes temas: dever e inclinação; autonomia e esclarecimento. Vejamos.

Dever Dever é uma ação conforme uma ordem racional, uma norma ou lei da razão. Necessidade prática de cumprir uma ação universal incondicional, ou seja, válida para todas as pessoas, sem exceção, em todos os tempos e lugares. Necessidade de cumprir uma ação exclusivamente e unicamente por respeito à lei, independente da religião (Deus), da felicidade do indivíduo ou bem-estar da sociedade. Kant rejeita essas idéias, porque elas fazem a moralidade depender de algo exterior a ela mesma. Ele rejeita igualmente a idéia de que a moralidade é apenas o desenvolvimento natural de certos sentimentos que pertencem à nossa natureza humana. Isso não seria compatível com seu caráter intrinsecamente racional.

“Uma ação cumprida por Dever tem seu valor moral, não no fim que deve ser alcançado por ela, mas na máxima que a determina; sem relação com nenhum objeto de desejar”.

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Kant distingue duas funções do dever. A primeira é a ação conforme o dever, conforme a lei, ligada à ação legal. Esta se dá quando uma ação tem como fim o interesse particular. Por exemplo, o comerciante que atende honestamente aos clientes, age em conformidade com o dever, se este tem por intenção bem definida apenas manter sua clientela. Do mesmo modo, a pessoa que leva uma vida feliz e se esforça em conservar a sua vida, age conforme o dever, mas não age por dever. A segunda é a ação por dever, por respeito à lei, ligada à ação moral. Esta se dá quando uma ação não tem como fim um interesse particular, mas é uma ação boa em si mesma. Pode ser que daí se originou o dito popular: “fazer o bem sem olhar a quem”. Diferentemente do exemplo acima, quem se esforça por conservar uma vida a que já não tem amor, este sim age por dever. Assim também, quando alguém ajuda outra pessoa sem esperar nenhuma recompensa em troca age por dever. Devido a não existir uma unanimidade de ações, ou seja, pelo fato de cada um agir como melhor lhe aprouver, uns por dever e outros apenas conforme o dever surge em Kant o termo Boa Vontade: vontade de agir somente por dever. Conhecida também como Vontade Santa: vontade que está necessariamente de acordo com a razão, só podendo escolher aquilo que é racional. “Não é possível conceber coisa alguma no mundo, ou mesmo fora do mundo, que sem restrição possa ser considerada boa, a não ser uma só: uma boa vontade”. É importante relembrar que a ética (moral) na razão para Kant é independente da religião e da comunidade. Ela deve ser boa em si mesma, para tanto, ele nos traz a noção de Imperativos.

Imperativos Como vimos acima, Kant sustenta que há uma lei moral objetiva. Ela é conhecida por nós somente pela razão e jamais pela experiência. Essa lei nos obriga a agir ou a nos abster de agir, simplesmente em razão de que a ação é exigida pela lei, ou proibida por ela. Essa lei é um imperativo: termo criado por Kant, talvez por analogia ao termo bíblico “mandamento”. É uma norma ou ordem da razão para que o indivíduo pratique ações racionais. A norma da razão é para o homem uma ordem e tem um caráter co-ativo, regulando a vontade humana para agir nas coisas boas e também nas coisas necessárias. Essas ações podem ser boas, como por exemplo, se a pessoa a quem for ajudar for bonita ou agradável; ou apenas necessárias, como por exemplo, coletar o lixo. Kant define um imperativo como toda “proposição que expressa uma possível ação livre, por meio da qual se concretize um determinado fim”. Ele faz uma distinção entre os imperativos. Eles podem ser hipotéticos ou categóricos, porém, a distinção depende de a relação da lei com a vontade ser dirigida ou não para realizar um fim. Imperativo Hipotético (ação conforme o dever): se caracteriza se a ação (ordenada) for boa simplesmente como meio para algum outro fim. Comanda uma ação

que é apenas relativamente boa. Como por exemplo, ajudar em um acidente de veículos, apenas se o acidentado for bonito (a) ou rico (a). Imperativo categórico (ação por dever): se caracteriza se a ação (ordenada) é representada como boa em si mesma, objetivamente necessária, são aquelas da moralidade. Nem sua autoridade, nem seu poder de nos motivar são derivados de outra parte que se não dela mesma. Um exemplo dela é ajudar alguém independentemente de qualquer recompensa. A lei da razão assume a forma de uma ordem racional, para impedir que a ação humana aja segundo sua inclinação sensível. Para a filosofia moral de Kant existe uma oposição entre agir por dever e por inclinação. Para ele, o dever “orgulhosamente rejeita todo o parentesco com as inclinações”. (Crítica da Razão Pura)

Inclinação A inclinação está fundada na liberdade do mundo sensível. É a dependência da faculdade de apetições das sensações, a qual, em conseqüência, indica sempre uma necessidade. Os objetos da inclinação têm um valor moral condicionado, ou seja, não são desejados “por si mesmos”, mas tão somente porque concorrem para satisfazer fins fora deles, a saber, as necessidades da inclinação. Isso os torna indignos de servirem como princípios de juízo moral, pois, não podem ser universalizados.

Autonomia Para Kant, a Autonomia se caracteriza por dois fatores. O primeiro é a independência da vontade em relação a todo desejo ou objeto de desejo (liberdade no sentido negativo). Para simplificar, voltemos ao termo imperativo que é uma analogia ao termo bíblico mandamento. Na tradição bíblica, nos é apresentado no vigésimo capitulo do livro do Êxodo, dez mandamentos, ordens, leis que o povo de Deus deve seguir para se orientar na vida cristã. Dentre os dez mandamentos, algumas ordens são para o povo fazer algo (guardar domingos e festas de guarda, honrar pai e mãe, etc.) e outras são para não fazerem algo (não cobiçar a mulher do próximo, não falar o santo nome de Deus em vão, etc.). Nesse primeiro fator da autonomia, somos independentes de nossa vontade, assumindo nossa liberdade no sentido negativo, ou seja, de não fazermos algo, como, não matar, não cometer adultério, não levantar falso testemunho e outros. O segundo fator é a capacidade de determinar-se em conformidade com uma lei própria, que é a da razão (liberdade no sentido positivo). Nesse caso, é fazer algo seguindo a lei da razão, mandamento, ordens, como por exemplo, amar a Deus sobre todas as coisas.

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Esclarecimento

Resposta à pergunta: que é “Esclarecimento”? (“Aufklãrung” - 5 de dezembro de 1783, p.516. Textos Seletos, Petrópolis: Vozes, 1985)

Esclarecimento [Aufklãrung] é a saída do homem de sua menoridade, da qual ele próprio é culpado. A menoridade é a incapacidade de fazer uso de seu entendimento sem a direção de outro indivíduo. O homem é o próprio culpado dessa menoridade se a causa dela não se encontra na falta de entendimento, mas na falta de decisão e coragem de servir-se de si mesmo sem a direção de outrem. Sapere aude! “Tem coragem de fazer uso de teu próprio entendimento” tal é o lema do esclarecimento [Aufklãrung]. A preguiça e a covardia são as causas pelas qual uma tão grande parte dos homens, depois que a natureza de há muito os libertou de uma direção estranha (naturaliter maiorennes), continuem, no entanto de bom grado menor durante toda a vida. São também as causas que explicam por que é tão fácil que os outros se constituam em tutores deles. É tão cômodo ser menor. Se tenho um livro que faz as vezes de meu entendimento, um diretor espiritual que por mim tem consciência, um médico que por mim decide a respeito de minha dieta etc., então não preciso de esforçar-me eu mesmo. Não tenho necessidade de pensar, quando posso simplesmente pagar, outros se encarregarão em meu lugar dos negócios desagradáveis. (...) É difícil, portanto, para um homem em particular desvencilhar-se da menoridade que para ele se tornou quase uma natureza. Chegou mesmo a criar amor a ela, sendo por ora realmente incapaz de utilizar seu próprio entendimento, porque nunca o deixaram fazer a tentativa de assim proceder. Preceitos e fórmulas, estes instrumentos mecânicos do uso racional, ou antes, do abuso, de seus dons naturais, são os grilhões de uma perpétua menoridade. Quem deles se

livrasse só seria capaz de dar um salto inseguro mesmo sobre o mais estreito fosso, porque não está habituado a este movimento livre. Por isso, são muito poucos aqueles que conseguiram, pela transformação do próprio espírito, emergir da menoridade e empreender então uma marcha segura. (...) Para este esclarecimento, porém, nada mais se exige senão liberdade.

1) O que é, segundo Kant, um imperativo categórico?

2) Uma pessoa vê-se forçada pela necessidade a pedir dinheiro emprestado. Sabe muito bem que não poderá pagar, mas vê também que não lhe emprestarão nada se não prometer firmemente pagar em prazo determinado. Sente a tentação de fazer a promessa; mas tem consciência para perguntar a si mesma: Não é proibido e contrário ao dever livrar-se de apuros desta maneira? Admitindo que se decida a fazê-lo, sua máxima de ação seria: Quando julgo estar em apuros de dinheiro, vou pedi-lo emprestado e prometo pagá-lo, embora saiba que tal nunca sucederá. Este princípio do amor de si mesmo ou da própria conveniência pode talvez estar de acordo com todo meu bem-estar futuro; mas agora a questão é de saber se é justo.(...). Vejo imediatamente que ele nunca poderia valer como lei universal da natureza e concordar consigo mesmo, mas que, pelo contrário, ele se contradiria necessariamente.

KANT, I. Fundamentação da metafísica dos costumes. São Paulo: Abril Cultural, 1980, p.130.

De acordo com o texto, no que diz respeito ao dever necessário para com os outros, uma promessa mentirosa deve ser entendida como uma ação:

a) ética, pois foi praticada por dever, na medida em que visa a um fim justo, no caso, o bem-estar da pessoa que fez a promessa, considerando-se que os fins justificam os meios. b) contrária ao dever, pois a pessoa pratica um ato de violência, aproveitando-se da boa-fé do outro, mas perfeitamente justificável na medida em que obedece a uma regra pragmática, a de que a mentira pode ser justificada em determinadas situações. c) de acordo com o dever, pois, embora a pessoa que fez a promessa tenha agido por interesse, não se pode dizer que ela seja desonesta e injusta, porquanto queria apenas suprir suas necessidades. d) correta e justa, conforme ao dever, pois foi motivada por uma situação de extrema dificuldade e pode ser justificada do ponto de vista da máxima moral. e) contrária ao dever, pois foi motivada por fins

egoístas e desrespeita a máxima moral segundo a qual

o motivo do agir deve tornar-se uma lei universal.

ATIVIDADES

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3) Segundo Kant, qual é a resposta à pergunta “O que

é o esclarecimento”?

4) Explique por que podemos afirmar que a proposta

ética de Kant pode ser considerada universalista.

5) Defina a noção de dever segundo Kant,

posteriormente, diferencie suas funções.

6) O que é imperativo categórico e hipotético.

Proponha exemplos para cada um deles.

7) UFU ANO 2007 - 1 Leia com atenção o texto abaixo. Um menino, a pedido de sua mãe, foi de manhã à padaria para comprar pães de queijo. Como estivesse em dificuldades financeiras, o comerciante cobrou-lhe trinta centavos a mais pela mercadoria, considerando que este dinheiro por certo não faria falta a uma criança de aparência tão saudável. No início da noite, o pai do menino voltou à padaria para comprar leite, e equivocou-se ao pagar o comerciante, dando-lhe cinqüenta centavos a mais. O comerciante, no entanto, prontamente, restituiu ao freguês os cinqüenta centavos pagos a mais, considerando que o pai do menino era fiscal da prefeitura e que, em qualquer caso, seria conveniente manter boas relações com as autoridades locais. Em conformidade com o pensamento kantiano, responda as três questões que se seguem. A) Por que a primeira atitude do comerciante (em relação ao menino) é contrária ao dever e imoral? B) Por que a segunda atitude do comerciante (em relação ao pai do menino) é conforme ao dever, mas mesmo assim é imoral? C) De acordo com o pensamento de Kant, cite, para o caso 1 (relativo ao menino) e para o caso 2 (relativo ao pai do menino), uma regra que o comerciante poderia ter seguido para agir moralmente.

Vida e Obra Friedrich Wilhelm Nietzsche, filósofo Alemão, nasceu a 15 de outubro de 1844 em Röcken, localidade próxima a Leipzig. Karl Ludwig, seu pai, pessoa culta e delicada, e seus dois avós eram pastores protestantes; o próprio

Nietzsche pensou em seguir a mesma carreira.

Naumburg, pequena cidade às margens do Saale, onde Nietzsche cresceu, em companhia da mãe, duas tias e da avó. Criança feliz, aluno modelo, dócil e leal, seus colegas de escola o chamavam "pequeno pastor"; com eles criou uma pequena sociedade artística e literária, para a qual compôs melodias e escreveu seus primeiros versos. Em 1858, Nietzsche obteve uma bolsa de estudos na então famosa escola de Pforta, onde haviam estudado o poeta Novalis o filósofo Fichte (1762-1814). Datam dessa época suas leituras de Schiller (1759-1805), Hölderlin (1770-1843) e Byron (1788-1824); sob essa influência e a de alguns professores, Nietzsche começou a afastar-se do cristianismo. Excelente aluno em grego e brilhante em estudos bíblicos, alemão e latim, seus autores favoritos, entre os clássicos, foram Platão (428-348 a.C.) e Ésquilo (525-456 a.C.). Durante o último ano em Pforta, escreveu um trabalho sobre o poeta Teógnis (séc. VI a.C.). Partiu em seguida para Bonn, onde se dedicou aos estudos de teologia e filosofia, mas, influenciado por seu professor predileto, Ritschl, desistiu desses estudos e passou a residir em Leipzig, dedicando-se à filologia. Ritschl considerava a filologia não apenas história das formas literárias, mas estudos das instituições e do pensamento. Nietzsche seguiu-lhe as pegadas e realizou investigações originais sobre Diógenes Laércio (séc. III), Hesíodo (séc. VIII a.C.) e Homero. A partir desses trabalhos foi nomeado, em 1869, professor de filologia em Basiléia, onde permaneceu por dez anos. A filosofia somente passou a interessá-lo a partir da leitura de O Mundo como Vontade e Representação, de Schopenhauer (1788-1860). Nietzsche foi atraído pelo ateísmo de Schopenhauer, assim como pela posição essencial que a experiência estética ocupa em sua filosofia, sobretudo pelo significado metafísico que atribui à música. Em 1867, Nietzsche foi chamado para prestar o serviço militar, mas um acidente em exercício de montaria livrou-o dessa obrigação. Voltou então aos estudos na cidade de Leipzig. Nessa época teve início sua amizade com Richard Wagner (1813-1883), que tinha quase 55 anos e vivia então com Cosima, filha de Liszt (1811-1886). Nietzsche encantou-se com a música de Wagner e com seu drama musical, principalmente com Tristão e Isolda e com Os Mestres Cantores. A casa de campo de Tribschen, às margens do lago de Lucerna, onde Wagner morava, tornou-se para Nietzsche lugar d "refúgio e consolação". Na mesma época, apaixonou-se por Cosima, que viria a ser, em obra posterior, a "sonhada Ariane". Em cartas ao amigo Erwin Rohde, escrevia: "Minha Itália chama-se Tribschen e sinto-me ali como em minha própria casa". Na universidade, passou a tratar das relações entre a música e a tragédia grega, esboçando seu livro O Nascimento da Tragédia no Espírito da Música.

Dionisíaco e Apolíneo

Há diversos deuses apresentados pela mitologia grega, o “principal” deles é Zeus que seria o “deus dos

FRIEDRICH NIETZSCHE (1844-1900)

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deuses” para os gregos antigos. Apollo e Dioniso, dois desses deuses da mitologia grega são tratados por Nietzsch de uma maneira bastante interessante e que contribui de maneira “espetacular” para a compreensão de sua obra, especialmente e especificamente citados em “O nascimento da tragédia” (1872). A arte grega tem origem além do homem e representa “forças” que estão presentes no Mundo. Um dos aspectos importantes para a compreensão da “explanação” que segue, é entendermos que os deuses gregos, diferentemente do Deus da tradição judaica-cristã, são imanentes à Natureza, eles não estão fora dela; esses deuses têm um grau de pertencimento intrínseco e nascem junto com o “cosmos” diferentemente do Deus Judaico-cristão que está fora do universo e o cria para o homem. Portanto a Physis (“física”) grega, tem um sentido bem diferenciado de como é considerada a nossa natureza desde o período da modernidade em diante (século XV); a physis grega era qualitativa e não quantitativa como é estudada a “nossa natureza” , podemos dizê-la como aquilo que se mostra, o que aparece, o que brilha. O Thauma, o espanto, a perplexidade, admiração, estarrecimento, maravilhamento, estranhamento, que aparece na Natureza é um dos aspectos que nos seus primórdios levaram os homens à filosofia inicial e assim os primeiros filósofos são tratados como os filósofos da natureza ou physis. A physis e a filosofia são instâncias em que o thauma aparece. (1) Uma das questões aos olhos de Nietzsche é que a Arte Apolínea surge da “alegre, necessidade da imagem”. Mas a imitação da natureza pelos gregos era totalmente diferente da imitação dessa natureza pelos modernos. Com os modernos a natureza se torna objeto. Nos gregos e por exemplo em Heráclito se dizia que a physis ama se ocultar. Apolíneo-dionisíaco é uma expressão relativa ao que vem dos deuses: Apolo e Dioniso – expressão popularizada e tratada por Nietzsche como um contraste no livro „O nascimento da tragédia”, entre o espírito da ordem, da racionalidade e da harmonia intelectual, representado por Apolo, e o espírito da vontade de viver espontânea e extasiada, representado por Dioniso. Conforme diz Blackburn no verbete apolíneo/dionisíaco. Um quadro das distinções corriqueiramente apresentadas entre Apolo e Dioniso, embora não retratem “verdadeiramente” suas essências, podem ser descritas da maneira que segue.

- Apolo:Bela Aparência; Sonho; Forma (limite);

Princípio de individuação; Resplandecente; Ordem; Serenidade; etc.

- Dioniso: Música; Embriaguez; Uno Primordial (não há

forma, sem limite); Indiferenciação; Essência; Desmedida; Domínio Subterrâneo; etc. O homem constitui um elo com o mundo. Não deveríamos nos afastar dessa realidade que era vivenciada na época antiga. “O Nascimento da tragédia” apresentado por Nietzsche, parece prever o

que ocorreria com o homem 1 século depois desse livro ser publicado, hoje o homem evita toda a finitude e a “realidade” que é mostrada na tragédia grega. O homem dos nossos dias não aceita sofrer, não enfrentar a dor, não aceita a angústia, procura afastar-se de “todo mal” através de medicamentos e mais “medicamentos”, foge de tudo e de todos, utiliza-se de um movimento desenfreado, da agitação, das “atividades”, evita a solidão, não dá tempo para si próprio, tem medo do “real;” e o pior é que a “normalidade” da sociedade é uma loucura assustadora. A propósito: Quem é “louco”? Quem é “sano”?

Outra questão está ligada ao conhecimento, há uma diferenciação entre o conhecimento trágico (dos pré-socráticos) e o conhecimento racional (em Sócrates). No “conhecimento” racional valoriza-se a causalidade e o efeito, a causa e efeito não apareciam nos pré-socráticos como aparecem na contemporaneidade, mas eram imanentes, eram intrínsecas à natureza. O conhecimento racional vai se colocar acima da Arte e da Vida, e pior, começa a julgá-las. A partir de Sócrates e de Eurípides a instância mais importante passa a ser o “conhecimento” e não mais a “arte”. Platão depois, vai dizer que a “arte” é apenas uma cópia da cópia (nosso mundo) de um “original” que estaria no mundo das ideias (o mundo supra-sensível). Com todo esse processo perdemos algo especial que vinha dos gregos originais, entre essas perdas estão o sentido de pertencimento e Valor absoluto da natureza, Conforme comenta Brockelman: O que perdemos, portanto, foi a habilidade de ver nossa vida como parte de uma ordem e uma realidade mais amplas, para além de nossos transitórios desejos e sonhos diários. Ao ver a natureza e todo o universo como uma “matéria” posta aqui para nossa transformação e uso infinitamente produtivos, reduzimos a realidade a um mero valor extrínseco para nós; ela não é mais vivenciada como intrinsecamente valiosa em si. Por conseqüência, perdemos todo senso de pertencer a um drama e a uma realidade mais vastos e significativos. (2001, p.23).

Moral nietzscheana Dentre as diversas morais existentes, entre as mais finas e as mais grosseiras, Nietzsche reúne seus

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traços mais comuns e chega a, pelo menos, dois tipos básicos e uma diferença fundamental. Em Além do bem e do mal, obra escrita antes de a Genealogia, Nietzsche diz que "[...] Há uma moral dos senhores e uma moral de escravos [...]” ressaltando que em todas as culturas, sejam elas consideradas superiores e outras inferiores, percebe-se tentativas de mediação entre esses dois tipos distintos. O que não as isenta, também, de gerar, com freqüência, diversas confusões e incompreensões mutuas. Na condição de que há duas fontes para o nascimento dos valores morais, um deles tem que prevalecer e estabelecer-se sobre a outra. Dentre as muitas diferenças que separam a moral de senhores da moral de escravos, uma das mais importantes relaciona-se à afirmação da diferença. A moral de senhores tem como base o sentimento de distância e superioridade para, assim, fazer as avaliações. Em contrapartida, a moral de escravos baseia suas avaliações na igualdade e na fraqueza. Isso desemboca num antagonismo, separando as duas morais e, também, explicando a relação entre senhor e escravo. O primeiro toma o segundo como desprezível, considerando-o covarde, medroso, mesquinho. Por outro lado, o escravo rebaixa-se a si mesmo, desconfia do senhor e se deixa maltratar. O fundamento da moral de escravo se dá no medo. Ele teme os que apresentam força e potência que sejam diferentes à sua. Diante desse temor, cria-se uma moral em defesa da coletividade. Por não possuir impulsos que possam colocá-lo acima da coletividade, o escravo opta por uma moral generalizada e não particularizada ou individualizada. A generalização que o escravo faz é uma reação de medo diante do que lhe é diferente. A moral de escravo torna-se uma moral de autodefesa e suas avaliações são sua evidente característica. A avaliação dessa moral estabelece que o bom é o que favorece a coletividade. O mau, em contrapartida, é aquilo que ameaça essa coletividade. Já o homem nobre, junto com sua moral, consegue elevar o tipo de homem que é fazendo deste homem o criador dos valores. Isso o distingue dos demais, evidenciando o tipo de avaliações que estabelece sobre a vida e sobre si mesmo. O nobre acredita poder ser o responsável pelas bases às quais os valores se estabelecem, "[...] ele julga: 'o que me é prejudicial é prejudicial em si', sabe-se como o único que empresta honra às coisas, que cria valores". Os conhecimentos que faz de si são honrados, ou seja, o nobre constrói uma moral da glorificação de si mesmo, que consegue com prazer exercer com vigor e dureza consigo e venerando tudo o que é rigoroso e duro. Mas a moral de escravo tende a se rebelar. Essa rebelião começa quando o ressentimento desse tipo de moral torna-se criador e gerador de valores. Na Genealogia, Nietzsche escreve que "[...] toda moral nobre nasce de um triunfante Sim a si mesmo, já de início a moral escrava diz Não a um 'fora', um 'outro', um 'não eu' – e este Não é seu ato criador". A inversão que estabelece valores é algo próprio do

ressentimento. A moral escrava, para nascer, pede um oposto, uma exterioridade, requer estímulos exteriores para agir em absoluto, o que torna sua ação uma reação. Nietzsche escreve que esse contrário sucede no modo de valoração do nobre, agindo e crescendo com espontaneidade, buscando seu oposto para apenas dizer sim a si mesmo com maior júbilo e gratidão. Desse modo, o conceito negativo de o baixo, comum, ruim é apenas imagem de contraste em relação ao conceito positivo dos nobres, bons e felizes. O homem, naturalmente, seja nobre ou escravo, avalia e confere sentido às coisas, pois é vontade de potência. O escravo, por seu lado, inverte, sem querer dizer que não realize uma avaliação, mas que não se torna criação. É uma inversão, uma transformação, uma transmutação dos valores. Ao transmutar, ou inverter, os valores de sua moral de escravo, ele estabelece sua moral como dada, como algo efetivo, além de qualquer reflexão. O objetivo de absolutizar sua moral está no fato de o escravo ter como pano de fundo aquela autodefesa citada anteriormente, que visa dissimular o medo através da universalização de seus próprios preceitos. Dessa forma, toda interpretação moral será vista como a moral única e de validade incondicional, o que torna os preceitos dessa moral intocados e inquestionáveis. Em contrapartida, é uma moral que disfarça a antipatia da vida e que tem como mote uma vida degenerada em que a diferença e a afirmação são substituídas pela igualdade e pela negação. O escravo, por ser considerado um desprezível, avalia sua realidade a partir de seu tipo de vida decadente. Para Nietzsche, remover a máscara é algo necessário e se faz pela identificação da moral que prescreve um valor como valor. Com esse desmascaramento é possível de se determinar qual o valor dos valores. É o absolutizar dos valores e considerá-los como supremos, supervalorizando-os acima de qualquer outra perspectiva ou interpretação contrária. Em Nietzsche notamos a percepção que tinha de que, mesmo que todos os valores e ideais considerados supremos anteriormente na história humana tenham se desvalorizado, a vida do homem continua. É certo que não vivemos sem referencial: precisamos de valores que sejam ponto de referência para nossas ações, afinal, não vivemos sozinhos, não vivemos isolados, por mais individualista que esta nossa sociedade queira se proclamar. Os valores, contudo, não se constituem num algo-em-si. São pontos de vista, são aquilo que, conforme uma perspectiva, colocam-se como preservação e progresso da vida. Quando Nietzsche diz que Deus está morto, retira da sociedade toda e qualquer base de valoração. É necessário buscar, então, um novo parâmetro para os valores. Caso contrário, as pessoas vão se tornando cada vez mais materialistas, individualistas, mercantilistas. Não somos máquinas, tampouco somos meras mercadorias. A dignidade humana cada dia mais vem perdendo seu espaço e significado em

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nossas sociedades, em nossas vidas, em nossas relações. Com sua obra, Nietzsche não só demonstra um gênio perturbado com as relações dos homens, mas também nos perturba, levando-nos a questionar os laços relacionais que todos temos. O intuito de a Genealogia da moral é o de despertar no leitor uma reflexão e uma ação mais consciente da realidade. Os valores necessitam ser repensados.

O Além-do-Homem (Super Homem)

Em Ecce Homo, Nietzsche assimila Zaratustra a Dioniso, concebendo o primeiro como o triunfo da afirmação da vontade de potência e o segundo como símbolo do mundo como vontade, como um deus artista, totalmente irresponsável, amoral e superior ao lógico. Por outro lado, a arte trágica é concebida por Nietzsche como oposta à decadência e enraizada na antinomia entre a vontade de potência, aberta para o futuro, e o "eterno retorno", que faz do futuro numa repetição; esta, no entanto, não significa uma volta do mesmo nem uma volta ao mesmo; o eterno retorno nietzschiano é essencialmente seletivo. Em dois momentos de Assim falou Zaratustra (Zaratustra doente e Zaratustra convalescente), o eterno retorno causa ao personagem-título, primeiramente, uma repulsa e um medo intoleráveis que desaparecem por ocasião de sua cura, pois o que o tornava doente era a idéia de que o eterno retorno estava ligado, apesar de tudo, a um ciclo, e que ele faria tudo voltar, mesmo o homem, o "homem pequeno". O grande desgosto do homem, diz Zaratustra, aí está o que me sufocou e que me tinha entrado na garganta e também o que me tinha profetizado o adivinho: tudo é igual. E o eterno retorno, mesmo do mais pequeno, aí está a causa de meu cansaço e de toda a existência. Dessa forma, se Zaratustra se cura é porque compreende que o eterno retorno abrange o desigual e a seleção. Para Dioniso,

o sofrimento, a morte e o declínio são apenas a outra face da alegria, da ressurreição e da volta. Por isso, "os homens não têm de fugir à vida como os pessimistas", diz Nietzsche, "mas, como alegres convivas de um banquete que desejam suas taças novamente cheias, dirão à vida: uma vez mais". Para Nietzsche, portanto, o verdadeiro oposto a Dioniso não é mais Sócrates, mas o Crucificado. Em outros termos, a verdadeira oposição é a que contrapõe, de um lado, o testemunho contra a vida e o empreendimento de vingança que consiste em negar a vida; de outro, a afirmação do devir e do múltiplo, mesmo na dilaceração dos membros dispersos de Dioniso. Com essa concepção, Nietzsche responde ao pessimismo de Schopenhauer: em lugar do desespero de uma vida para a qual tudo se tornou vão, o homem descobre no eterno retorno a plenitude de uma existência ritmada pela alternância da criação e da destruição, da alegria e do sofrimento, do bem e do mal. O eterno retorno, e apenas ele, oferece, diz Nietzsche, uma "saída fora da mentira de dois mil anos", e a transmutação dos valores traz consigo o novo homem que se situa além do próprio homem. Esse super-homem nietzschiano não é um ser, cuja vontade "deseje dominar". Se se interpreta vontade de potência, diz Nietzsche, como desejo de dominar, faz-se dela algo dependente dos valores estabelecidos. Com isso, desconhece-se a natureza da vontade de potência como princípio plástico de todas as avaliações e como força criadora de novos valores. Vontade de potência, diz Nietzsche, significa "criar", "dar" e "avaliar". Nesse sentido, a vontade de potência do super-homem nietzschiano o situa muito além do bem e do mal e o faz desprender-se de todos os produtos de uma cultura decadente. A moral do além-do-homem, que vive esse constante perigo e fazendo de sua vida uma permanente luta, é a moral oposta à do escravo e à do rebanho. Oposta, portanto, à moral da compaixão, da piedade, da doçura feminina e cristã. Assim, para Nietzsche, bondade, objetividade, humildade, piedade, amor ao próximo, constituem valores inferiores, impondo-se sua substituição pela virtù dos renascentistas italianos, pelo orgulho, pelo risco, pela personalidade criadora, pelo amor ao distante. O forte é aquele em que a transmutação dos valores faz triunfar o afirmativo na vontade de potência. O negativo subsiste nela apenas como agressividade própria à afirmação, como a crítica total que acompanha a criação; assim, Zaratustra, o profeta do além-do-homem, é a pura afirmação, que leva a negação a seu último grau, fazendo dela uma ação, uma instância a serviço daquele que cria, que afirma. Compreende-se, assim, porque Nietzsche desacredita das doutrinas igualitárias, que lhe parecem "imorais", pois impossibilitam que se pense a diferença entre os valores dos "senhores e dos escravos". Nietzsche recusa o socialismo, mas em Vontade de Potência exorta os operários a reagirem "como soldados".

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1) UFU 2010 - 2 Friedrich Nietzsche (1844 – 1900) opõe à moral tradicional, herdeira do pensamento socrático-platônico e da religião judaica-cristã, a transvaloração de todos os valores. Conforme Aranha e Arruda (2000): “Ao fazer a crítica da moral tradicional, Nietzsche preconiza a „transvaloração de todos os valores‟. Denuncia a falsa moral, „decadente‟, „de rebanho‟, „de escravos‟, cujos valores seriam a bondade, a humildade, a piedade e o amor ao próximo”. Desta forma, opõe a moral do escravo à moral do senhor, a nova moral. (ARANHA, M. L. de A. e MARTINS, M. H. P. Filosofando:

introdução à filosofia. São Paulo: Moderna, 2000, p. 286.)

Assinale a alternativa que contenha a descrição da “moral do senhor” para Nietzsche. A) É caracterizada pelo ódio aos instintos; negação da alegria. B) É negativa, baseada na negação dos instintos vitais. C) É transcendental; seus valores estão no além-mundo. D) É positiva, baseada no sim à vida. 2) UFU 2009 - 2 Leia atentamente o texto a seguir. “O cristianismo, por sua vez, esmagou e alquebrou completamente o homem, e o mergulhou como que em um profundo lamaçal: então, no sentimento de total abjeção, fazia brilhar de repente o esplendor de uma piedade divina, de tal modo que o surpreendido, atendido pela graça, lançava um grito de embevecimento e por um instante acreditava carregar o céu inteiro em si.” NIETZSCHE, F. Humano, demasiado humano. Col. Os Pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1987. p. 59.

Com base no texto de Nietzsche, responda as seguintes questões: A) O cristianismo pode ser considerado “moral do escravo” ou “moral do senhor”? B) Selecione uma frase do texto que apresenta a característica fundamental do cristianismo para Nietzsche. C) Com base na frase selecionada, explique se, para Nietzsche, o cristianismo é uma doutrina que nega ou que valoriza a força, a saúde e a vida. 3) Com base nos seus conhecimentos a respeito da filosofia de Nietzsche, comente a influência das narrativas mitológicas e as teorias do filósofo Alemão.

4) De acordo com as teorias de Friedrich Nietzsche discorra: a) Noção de Super-Homem b) Vontade de Potência

c) Apolíneo e Dionisíaco

*************************************************************** Assista o filme Clube da Luta e estabeleça uma possível relação entre a proposta filosófica de Friedrich Nietzsche e o enredo do filme

Vida e obras Jean-Paul Sartre nasceu em Paris, a 21 de junho de 1905, filho único, não chegou a conhecer o pai que morreu em 1906. Viveu a primeira infância com a mãe e os avós maternos em Maudon,

Interior da França. Segundo suas memórias, esse foi um período feliz, em que começou a ensaiar os primeiros passos na literatura, ainda menino, escrevia histórias de capa-espada para a mãe.

ATIVIDADES

JEAN-PAUL SARTRE (1905-1980)

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ALEXSANDER

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Filósofo francês, pertencente à linha existencialista, ou seja, que defendem que no homem, a existência precede a essência; engajado, ateu, adepto das idéias marxistas, e foi um filósofo contemporâneo com grande notoriedade e fama internacional. Além de filósofo, foi romancista e teatrólogo e escreveu romances, peças de teatro, roteiros para cinema e textos de intervenção política. Sua produção intelectual foi fortemente marcada pela Segunda Guerra Mundial e pela ocupação nazista da França. Podemos dizer que há um Sartre de antes da guerra e outro do pós-guerra, tal o impacto da resistência Francesa sobre sua concepção política de engajamento. Ele foi, nesse século, o exemplo mais brilhante do intelectual engajado, isto é, do “homem de letras” que não se furta a usar sua autoridade intelectual como instrumento para agir sobre seu tempo. Engajamento significa a necessidade de o pensador estar voltado para a análise da situação concreta em que vive tornando-se solidário nos acontecimentos sociais e políticos de seu tempo. Pelo engajamento, a liberdade deixa de ser apenas imaginária e passa a estar situada e comprometida na ação. Lecionou em Liceus (escolas) e nunca almejou uma carreira universitária. Ao lado de Simone de Beauvoir, também filósofa existencialista e sua companheira de toda a vida, Sartre participou da vida política não só da França, mas mundial. Apesar de marxista, nunca deixou de criticar o autoritarismo, sobretudo quando as forças soviéticas invadiram a Tchecoslováquia. Saía à rua em protestos e, com a imunidade que lhe conferia a sua figura de cidadão do mundo, vendia nas esquinas (uma prática proibida) La Cause du Peuple (A Causa do Povo) Jornal maoísta, sem que ninguém ousasse prendê-lo. Em 1964, toma conhecimento de que pretendem conceder-lhe o Prêmio Nobel de Literatura. Escreve uma carta ao comitê em Estocolmo, informando que recusará o prêmio. Ainda assim, este lhe é concedido, mas Sartre mantém a recusa. Afirma que a outorga da distinção tem sido política, privilegiando escritores do Ocidente ou aqueles que, do bloco socialista, se rebelaram. Segundo ele, o escritor não deve deixar-se transformar em instituição. Essa rejeição – Única no gênero – provoca discussão na mídia francesa e mundial aproxima novamente Sartre do grande público. Escreveu grandes obras como O ser e o nada (sua principal em 1943), A Náusea (um romance de 1938), O existencialismo é um humanismo (colocando o como centro do objeto de estudo), O idiota da família (sua última grande obra, sobre o escritor francês Flaubert, onde coloca em questão o homem singular), A cerimônia do adeus (poucos anos antes de sua morte, narrados por Simone de Beauvoir), As palavras (um pequeno livro de memórias de sua infância, publicado em 1963, que talvez o mais belo e o mais bem escrito de seus livros), dentre outros. Em 1973 fica completamente cego, o que o impedia de fazer o que mais gostava – escrever - e vítima de complicações renais, morre em Abril de 1980

aos 75 anos de idade. Seu enterro foi acompanhado por cerca de cinqüenta mil pessoas, que provavelmente se formaram à luz do mito Sartre.

Essência e Existência

O existencialismo forjou uma das expressões mais conhecidas do vocabulário filosófico: “A existência precede a essência”. O que ela significa? Se pensarmos nos objetos que conhecemos, concluiremos que antes de existirem efetivamente, eles são concebidos segundo uma “receita” de como produzi-los, e têm uma finalidade preestabelecida (por exemplo, antes de se fazer um corta-papel, há uma concepção e uma técnica de como fazê-lo, e ele é feito com uma finalidade precisa que está na mente do fabricante antes que exista de fato como cortador de papel). Ou seja, antes de o corta-papel ser esse objeto que posso manipular, havia o projeto dele: sabíamos como produzi-lo e como utilizá-lo. Nesse caso, podemos dizer que a essência precede a existência. Ora, para o existencialismo esse raciocínio não pode ser aplicado aos seres humanos. Para compreendermos a razão disso, é preciso saber que o existencialismo sartriano é ateu. Assim, se não há um Deus criador, se não há um Deus para conceber o homem e para lhe dar uma finalidade prévia (tal como o artesão faz com o corta-papel), um Deus que construiria o homem à sua imagem e semelhança, então o homem simplesmente existe, e a sua “essência” será apenas aquilo que ele fizer de si mesmo, aquilo que ele se quiser. Por isso especifica que, ao contrário das coisas e animais, no homem a existência precede a essência, e isso “significa que o homem primeiramente existe, se descobre, surge no mundo; e que só depois se define. O homem, tal como o concebe o existencialista, se não é definível, é porque primeiramente não é nada. Só depois será alguma coisa e tal como a si próprio se fizer. Assim, não há natureza humana, visto que não

PAPO DE SURDO E MUDO O Rappa

o nascimento de uma alma

é coisa demorada não é partido ou jazz em que se improvise não é casa moldada laje que suba fácil

a natureza da gente não tem disse me disse

(...)

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há Deus para concebê-la. O homem é não apenas como ele se concebe, mas como ele quer ser, como ele se concebe depois da existência, como ele se deseja após este impulso para a existência; o homem não é mais do que ele faz. Tal é o primeiro princípio do conhecimento.” (J. P. Sartre, O existencialismo é um Humanismo). Isso significa que o homem é antes de tudo livre não há destino, vontade de Deus. Em todas as suas ações, o homem só pode contar consigo mesmo. Ora, isso implica uma nova responsabilidade. Não podemos mais aderir ao bem porque essa é a vontade de Deus e porque temos medo da punição divina. Ou seja, a moral tradicional, baseada nos valores cristãos, não serve para essa filosofia. Assim, o existencialismo filosófico chega à necessidade de se fundar uma nova moral, uma moral laica, sem Deus. O próprio filósofo procura lembrar que sua doutrina “não pode ajudar” aquelas pessoas ávidas de escândalo e agitação, que, ao contrário, o existencialismo. Sendo assim, o que tornou Sartre tão famoso, conhecido de um público que pouca ou nenhuma intimidade tinha com a filosofia? Qual é a diferença entre o homem e as coisas? É que só o homem é livre. O homem nada mais é do que o seu projeto. A palavra projeto significa, etimologicamente: “ser lançado adiante”, assim como sufixo ex da palavra existir significa “fora”. Ora, só o homem existe (existe) porque o existir do homem é um “para-si”, ou seja, sendo consciente, o homem é um “ser-para-si”, pois a consciência é auto-reflexiva, pensava sobre si mesma, é capaz de pôr-se “fora” de si. Portanto, a consciência do homem o distingue das coisas e dos animais, que são “em si”, como não são conscientes de si, também não são capazes de se colocar “do lado de fora” para se auto-examinarem. O que acontece ao homem quando se percebe “para-si”, aberto à possibilidade de construir ele próprio a sua existência? Descobre que, não havendo essência ou modelo para lhe orientar o caminho, seu futuro se encontra disponível e aberto, estando, portanto irremediavelmente “condenado a ser livre”. É o próprio Sartre que cita a frase de Dostoiévski em Os irmãos Karamazov: “Se Deus não existe, então tudo é permitido”, para relembrar que os valores não são dados nem por Deus nem pela tradição: só ao próprio homem cabe inventá-los. Enfim, o existencialismo é uma moral da ação, porque considera que a única coisa que define o homem é o seu ato. Ato livre por excelência, mesmo que o homem sempre esteja situado em determinado tempo ou lugar. Não importa o que as circunstâncias fazem do homem, “mas o que ele faz do que fizeram dele”.

Homem x Coisas/animais

Coisas (‘em-si): não são livres, mas determinadas e

definidas (fechadas e, si mesmas).

Homem (‘para-si’): é indeterminado e indefinido. É

livre para fazer escolhas (criar essências e valores), pelas quais é responsável: a liberdade é o valor fundamental para a condição humana.

Liberdade e angústia

De todas as suas ações, apenas uma lhe é negada: a recusa de sua liberdade. Quando reconhece a dimensão de sua liberdade, se angustia. Angústia: tomada de consciência da liberdade. Suas ações sob sua total responsabilidade.

A má fé: a via do fingimento.

O homem não é “em - si”, ele é “para-si”, que a rigor não é nada, pois se a consciência não tem conteúdo, não é nada, não é coisa alguma. Mas esse vazio é justamente a liberdade fundamental do “para-si”, que, movendo-se através das possibilidades, poderá criar-lhe um conteúdo. Eis que o homem, ao experimentar a liberdade de ao sentir-se como um vazio, vive a angústia, fogem dela. A má fé é atitude característica do homem que finge escolher, sem na verdade escolher. Imagina que seu destino está traçado, que os valores são dados; aceitando as verdades exteriores, “mente” para si mesmo, simulando ser ele próprio o autor dos seus próprios atos já que aceitou sem críticas os valores dados. Não se trata propriamente de uma mentira, pois esta supõe os outros para quem mentimos, enquanto a má fé se caracteriza pelo fato de o indivíduo dissimular para si mesmo com o objetivo de evitar fazer uma escolha da qual possa se responsabilizar. O homem que recusa a si mesmo aquilo que fundamentalmente o caracteriza como homem, ou seja, a liberdade torna-se “safado”, “sujo”, pois nesse processo recusa a dimensão do “para-si” e torna-se “em-si”, semelhante às coisas. Perde a transcendência e reduz-se à facticidade. Sartre chama tal comportamento de espírito de seriedade. O homem sério é aquele que recusa a liberdade para viver o conformismo e a respeitabilidade da ordem estabelecida e da tradição. Esse processo é exemplificado no conto A infância de um chefe. A fim de ilustrar o comportamento de má fé, Sartre descreve o garçom cuja função exige que ele aja não como um “ser-para-si”, mas como um “ser-para-outro”, comporta-se como deve se comportar um garçom, de tal forma que ele se vê com os olhos dos outros. È assim que Sartre o descreve em O ser e o nada: Consideremos esse garçom de café. Tem um gesto vivo e apurado, preciso e rápido; dirige-se aos consumidores num passo demasiado vivo, inclina-se com demasiado zelo, sua voz e seus olhos experimentam um interesse demasiado cheio de solicitude para o pedido do freguês (...) Ele representa, brinca. Mas representa o quê? Não é preciso observá-lo muito tempo para perceber: ele representa ser garçom de café.

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Outro tipo de má fé da mulher que, estando com um homem, deixa-se "seduzir" por ele, dissimulando para si mesma, desde o início, o caráter sexual do encontro.

A responsabilidade; a relação com o outro e os outros.

Tais colocações a respeito do existencialismo poderiam fazer supor que se trata de um pensamento que depende o individualismo, em que cada um estaria preocupado com a própria liberdade e ação. Contra esse mal-entendido, Sartre adverte: “Mas se verdadeiramente a existência precede a essência, o homem é responsável por aquilo que é. Assim, o primeiro esforço do existencialismo é o de pôr todo homem no domínio do que ele é e lhe atribuir a total responsabilidade da sua existência. E quando dizemos que o homem é responsável por si próprio, não queremos dizer que o homem é responsável pela sua restrita individualidade, mas que é responsável por todos os homens. (...), com efeito, não há dos nossos atos um sequer que, ao criar o homem que desejamos ser, não crie ao mesmo tempo uma imagem do homem como julgamos que deve-ser. Escolher ser isto ou aquilo é afirmar ao mesmo tempo o valor do que escolhemos, porque nunca podemos escolher o mal, o que escolhemos é sempre o bem, e nada pode ser bom para nós sem que o seja para todos. Se a existência, por outro lado, precede a essência e se quisermos existir, ao mesmo tempo em que contribuímos a nossa imagem é válida para todos e para toda a nossa época. Assim, a nossa responsabilidade é muito maior do que poderíamos supor, porque ela envolve toda a humanidade”. Poderíamos até relacionar essa teoria sartriana com um dito popular que diz: “a minha liberdade termina onde começa a do outro”, pois, independente da liberdade que tenho, devo ter a responsabilidade de garantir também a liberdade das outras pessoas. Se o homem é livre, é conseqüentemente responsável por tudo aquilo que escolhe e faz.

O absurdo: a morte O cristão encara a morte como o início de uma nova vida, onde passa o que é velho e tudo se faz novo na vida eterna. Ao vê-lo, caí como morto aos seus pés. Ele, porém, pôs sobre mim sua mão direita e disse: “Não temas! Eu sou o Primeiro e o Último, e o que vive. Pois estive morto, e eis-me de novo vivo pelos séculos dos séculos; tenho as chaves da morte e da região dos mortos (...)”. (Apocalipse 1,17-18). E ainda: Vi então, um novo céu e uma nova terra, pois o primeiro céu e a primeira terra desapareceram e o mar já não existia. Eu vi descer do céu, de junto de Deus, a Cidade Santa, a nova Jerusalém, como uma esposa ornada para o esposo. Ao mesmo tempo, ouvi do trono uma grande voz que dizia: “Eis aqui o tabernáculo de Deus com os homens. Habitará com eles e serão o seu

povo, e Deus mesmo estará com eles. Enxugará toda a lágrima de seus olhos e já não haverá morte, nem luto, nem grito, nem dor, porque passou a primeira condição”. (Apocalipse 21,1-4). Alguns aceitam o fracasso de seus projetos, imaginando ter uma recompensa após a morte. Como por exemplo, se não são aprovados em alguma prova, ganham um salário ruim em seus empregos, abdicam de suas vidas em prol de cuidar de um parente enfermo ou outros fatores. Chegam até mesmo se sentirem confortados com a situação, pois, “bem aventurado os que choram, porque serão consolados”. (Mateus 5,4). Sartre também discute a questão da morte. Diferentemente de Heidegger, que concebe a morte como aquilo que confere significativo à vida, Sartre acha que ela lhe retira qualquer sentido. A morte é a “nadificação” dos nossos projetos, ou seja, a certeza de que um nada total nos espera. O conceito de náusea, usado no romance de mesmo nome, refere-se justamente ao sentimento experimentado diante do real, quando se toma consciência de que ele é desprovido de razão de ser, absurdo. Roquetin, a personagem principal do romance, numa célebre passagem, ao olhar as raízes de um castanheiro, tem a impressão de existir à maneira de uma coisa, de um objeto, de “estar-ai”, como as coisas são. Tudo lhe surge como pura contingência, gratuitamente, sem sentido. Por isso, Sartre conclui pelo absurdo da morte e, simultaneamente, da vida, que é uma “paixão inútil”: Se nós temos de morrer, a nossa vida não tem sentido, porque os seus problemas não recebem qualquer solução e porque até a significação dos problemas permanece indeterminada. É um absurdo saber, que quando morro, morre comigo os meus projetos.

A existência precede a essência

Quando concebemos um Deus criador, esse Deus identificamo-lo quase sempre com um artíficie duma doutrina como a de Descartes ou a de Leibniz, admitimos sempre que a vontade segue mais ou menos a inteligência ou pelo menos a acompanha, e que Deus, quando cria, sabe perfeitamente o que cria. Assim o conceito do homem, no espírito de Deus, é assimilável ao conceito de um corta-papel no espírito do industrial; e Deus produz o homem segundo técnicas e uma concepção, exatamente como o artífice fabrica um corta-papel segundo uma definição e uma técnica. Assim o homem individual realiza um certo conceito que está na inteligência divina. No século XVIII, para o ateísmo dos filósofos, suprime-se a noção de Deus, mas não a ideia de que a essência precede a existência. Tal ideia encontramo-la nós um pouco em todo o lado: encontramo-la em Diderot, em Voltaire e até mesmo

LEITURA COMPLEMENTAR:

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num Kant. O homem possui um natureza humana; esta natureza, que é o conceito humano, encontra-se em todos os homens, o que significa que cada homem é um exemplo particular de um conceito universal – o homem; para Kant resulta de tal universalidade que o homem da selva, o homem, o homem primitivo, como o burguês, estão adstritos à mesma definição e possuem as mesmas qualidades de base. Assim, pois, ainda ai, a essência do homem precede essa existência histórica que encontramos na natureza. (...)

O existencialismo ateu, que eu represento, é mais coerente. Declara ele que, se Deus não existe, há pelo menos um ser no qual a existência precede a essência, um ser que existe antes de poder ser definido por qualquer conceito, e que este ser é o homem ou, como diz Heidegger, a realidade humana. Que significará aqui o dizer-se que a existência precede a essência? Significa que o homem primeiramente existe, se descobre, surge no mundo; e que só depois se define. O homem, tal como o concebe o existencialista, se não é definível, é porque primeiramente não é nada. Só depois será alguma coisa e tal como a si próprio se fizer. Assim, não há natureza humana, visto que não há Deus para concebê-la. O homem é não apenas como ele se concebe, mas como ele quer ser, como ele se concebe depois da existência, como ele se deseja após este impulso para a existência; o homem não é mais do que ele faz. Tal é o primeiro princípio do existencialismo. É também a isso que se chama subjetividade, e o que nos censuram sob este mesmo nome. Mas que queremos dizer nós com isso, senão que o homem tem uma dignidade maior do que uma pedra ou uma mesa? Porque o que nós queremos dizer é que o homem primeiro existe, ou seja, que o homem, antes de mais nada, é o que se lança para um futuro, e o que é consciente de se projetar no futuro. (...) Mas se verdadeiramente a existência precede a essência, o homem é responsável por aquilo que é. Assim, o primeiro esforço do existencialismo é o de pôr todo homem no domínio do que ele é e de lhe atribuir a total responsabilidade da sua existência. E, quando dizemos que o homem é responsável por si próprio, não queremos dizer que o homem é responsável pela sua restrita individualidade, mas que é responsável por todos os homens. (SARTRE, Jean-Paul, O existencialismo é um

Humanismo. Col. Os pensadores. São Paulo, Abril Cultural, 1973. P.11-12).

1) Entre os tipos de existencialismo, destacamos:

a) o cristão e o humanista. b) o ateu e o idealista. c) o pernóstico e o humanista. d) o semita e o kantiano. e) o ariano e o cristão.

2) Assinale a alternativa que contenha a palavra final da seguinte frase: “Em Sartre, o existencialismo é um _________”. a) racionalismo. b) criticismo. c) idealismo. d) empirismo. e) humanismo.

3) Por que Sartre nega a existência de Deus?

4) O que é a má-fé para Sartre?

5) Assinale (V) ou (F) para as seguintes proposições do pensamento de Jean-Paul Sartre. ( ) Se o homem é livre e consciente, deve ser responsável

por suas escolhas e atitudes. ( ) A “má-fé” é a demonstração de que o homem quer ser e

também não quer ser o que ele é. Ele finge escolher sem, na verdade, escolher. Ele não quer se angustiar, mas não consegue. ( ) O homem é responsável por seus atos e jamais deve

considerar a liberdade de outrem, porque o outro nunca é livre. ( ) Para Sartre, a existência precede a essência.

6) (...) não encontramos, já prontos, valores ou ordens que possam legitimar a nossa conduta. Assim, não teremos nem atrás de nós, nem na nossa frente, no reino luminoso dos valores, nenhuma justificativa e nenhuma desculpa. Estamos sós, sem desculpas. É o que posso expressar dizendo que o homem está condenado a ser livre. Condenado, porque não se criou a si mesmo, e como, no entanto, é livre, uma vez que foi lançado no mundo, é responsável por tudo o que faz.

SARTRE, Jean-PauL. O existencialismo é um humanismo. 3. ed. São Paulo: Nova Cultural, 1987, p. 9.

Tomando o texto acima como referência, assinale a al-ternativa correta. a) Sartre afirma que o homem está condenado a ser livre e que, por esta razão, deve ser responsável por tudo o que acontece ao seu redor. b) Sartre considera que o homem não é responsável por seus atos, “porque não se criou a si mesmo”, sendo, por esta razão, totalmente livre. c) Ao dizer que “(...) não encontramos, já prontos, valores ou ordens que possam legitimar a nossa conduta”, Sartre defende que o existencialismo não admite qualquer valor, nem a liberdade. d) O existencialismo de Sartre defende a tese da absoluta responsabilidade do homem em relação aos atos que pratica, porque sua moral parte do princípio de uma liberdade coerente e comprometida com o bem comum.

7) Por que, para Sartre, a liberdade gera angústia?

8) Explique por que Sartre considera que a existência precede a essência.

9) Segundo a filosofia de Sartre, estabeleça a distinção entre os homens e as coisas.

10) De acordo com a filosofia de Sartre estabeleça a relação entre liberdade e responsabilidade.

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NA NET

http://alrocha-antenacultural.com.br/

http://www.paralerepensar.com.br/

http://www.mundodosfilosofos.com.br/

http://www.indekx.com/

http://www.mundojovem.com.br/

O QUE ESTOU

LENDO? Os Simpsons e a filosofia

NO RÁDIO

Society – Eddie Vedder

Carta aos missionários – Uns e outros

SUGESTÕES

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O quadro abaixo apresenta a história da filosofia de maneira bastante simplificada, com o objeto de que vocês possam localizar com facilidade em que período da história da filosofia se localiza o pensador que estamos estudando ou algum outro pensador que seja do seu interesse. Assim, as características de cada etapa da história da filosofia que constam na última coluna do quadro abaixo devem ser tomadas apenas como indicações e não dão conta de toda complexidade de um período da história do pensamento humano.

Etapas Datas Aprox. Principais Autores e Escolas Algumas Características

Filosofia Antiga

séc.VI a.C.

/

séc. II - III d. C.

Tales, Anaximandro,

Pitágoras, Demócrito,

Heráclito, Parmênides,

sofistas, Sócrates, Platão,

Aristóteles, estóicos,

epicuristas, céticos, Cícero,

Sêneca, Plotino

- Diálogo com o mito

- Tentativa de compreender

(lógos, noêin) o princípio

(arché) do real (ón), da

natureza (physis)

- Questionamento do ser do

homem (ánthropos)

Filosofia Medieval

séc. II - III

/

séc. XV

Clemente, Orígenes,

Gregório de Nissa,

Agostinho, Anselmo de

Aosta, Pedro Abelardo,

Alberto Magno, Tomás de

Aquino, Boaventura, Duns

Scoto, Guilherme de

Ockham

- Busca da conciliação entre

as verdades da fé e as

verdades da razão (ratio)

- Teocentrismo

Filosofia Moderna

séc. XVI

/

séc. XVIII

Bacon, Descartes, Leibniz,

Spinosa, Pascal, Hobbes,

Locke, Hume, Montesquieu,

Rousseau, Voltaire, Kant

- Distanciamento ente fé e

razão

- Rejeição do passado

- Desenvolvimento da crítica

- Confiança na razão

Filosofia Contemporânea

séc. XIX

/

Hoje

Fichte, Schelling, Hegel,

Marx, Kierkegaard, Comte,

Schopenhauer, Nietzsche,

Bergson, Husserl, Scheler,

Jaspers, Heidegger, Sartre,

Frege, Russel, Foucault,

Deleuze, Lukács, Escola de

Frankfurt

- Pluralismo de idéias

- Historicidade

- Fenomenologia

- Questionamento da

existência

- Filosofia (analítica) da

linguagem

- Pós-modernidade

QUADRO DA HISTÓRIA DA FILOSOFIA

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Edições Didáticas do Sistema COC de ensino. 1º Ano do Ensino Médio. Ribeirão Preto.

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda & MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: introdução à

filosofia. São Paulo: Moderna, 2006

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução: Leonel Vallandro e Gerd Bornheim da versão inglesa de

W. D. Ross. SP: Nova Cultural, 1987. (Coleção Os Pensadores).

ARISTÓTELES. Política.

CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 1997.

COTRIM, Gilberto. Filosofia temática. São Paulo: Saraiva, 2008.

DIMENSTEIN, Gilberto. Dez lições de filosofia. São Paulo: FTD, 2008.

HOBBES, T. Leviatã. Organizado por Richard Tuck. Tradução de João Paulo Monteiro, Maria Betariz

Nizza da Silva; revisão da tradução Eunice Ostrensky. São Paulo: Martins Fontes, 2003

INCONTRI, Dora; BIGHETO, Alessandro Cesar. Filosofia: Construindo o Pensar. São Paulo: Escala,

2008.

MARX, Karl. Contribuição à Crítica da Economia Política. São Paulo: Martins Fontes, 1977.

MARX, Karl & ENGELS, Friedrich. A Ideologia Alemã. São Paulo: Ciências Humanas, 1979.

MARX, Karl. O Capital. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980.

ROUSSEAU, Jean-Jacques. Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os

homens. São Paulo: Abril Cultural, 1978. [OS PENSADORES]

ROUSSEAU, Jean-Jacques. O Contrato Social. São Paulo: Abril Cultural, 1978. [OS PENSADORES]

NIETZSCHE, Friedrich. Crepúsculo dos ídolos ou como se filosofa com um martelo. Tradução,

apresentação e notas de Renato Zwick. Porto Alegre, RS: L&PM, 2009. (Coleção L&PM Pocket, v.799)

___________________. Humano, demasiado humano. Um livro para espíritos livres.

___________________. Obras incompletas. Seleção de textos de Gerárd Lebrun; tradução e notas de

Rubens Rodrigues Torres Filho; posfácio de Antônio Cândido de Mello e Souza. 2 ed. São Paulo: Abril

Cultural, 1978. (Coleção Os Pensadores)

___________________. Assim falou Zaratustra. Um livro para todos e para ninguém. Tradução de

Mário da Silva. São Paulo: Círculo do Livro, [s.d.].

SARTRE, Jean-Paul. O existencialismo é um humanismo. São Paulo: Abril Cultural, 1978. (Coleção Os

Pensadores)

_________________. O ser e o nada.

REFERÊNCIAS