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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

ESCOLA DE VETERINÁRIA E ZOOTECNIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA ANIMAL

Disciplina: SEMINÁRIOS APLICADOS

USO DE OPIOIDES PELA VIA EPIDURAL EM CÃES E GATOS

Louise Pereira Mortate Orientador: Juan Carlos Duque Moreno

GOIÂNIA 2013  

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LOUISE PEREIRA MORTATE USO DE OPIOIDES PELA VIA EPIDURAL EM CÃES E GATOS

Seminário apresentado junto à Disciplina de Seminários Aplicados do Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal da Escola de Veterinária e Zootecnia da Universidade Federal de Goiás. Nível: Mestrado

Área de Concentração: Patologia, Clínica e Cirurgia Animal

Orientador: Prof. Dr. Juan Carlos Duque Moreno - UFG

Comitê de Orientação: Profa. Dra. Celina Tie Nishimori Duque - UFG

Prof. Dr. Luiz Augusto de Souza - UFG

GOIÂNIA 2013

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SUMÁRIO 1INTRODUÇÂO 01

2 REVISÂO DE LITERATURA 03

2.1 Indicações do uso dos opioides pela via epidural 03

2.2 Receptores opiodes e classificação dos fármacos opioides 04

2.3 Fisiologia da dor aguda 06

2.3.1 Dor somática 06

2.3.2 Dor visceral 09

2.4 Mecanismo de ação dos opioides 09

2.5 Farmacocinética dos opioides administrados pela via epidural 10

2.6 Técnica da injeção epidural 11

2.7. Principais opioides utilizados pela via epidural 12

2.7.1 Morfina 12

2.7.2 Butorfanol 12

2.7.3 Metadona 13

2.7.4 Buprenorfina 14

2.7.5 Tramadol 15

2.7.6 Fentanil 16

2.7.7 Sufentanil 17

2.8 Associação dos opioides a outras classes de fármacos 18

2.8.1 Anestésicos locais 18

2.8.2 Agonistas de receptores adrenérgicos α-2 19

2.8.3 Dissociativos 20

2.9 Efeitos adversos 21

2.9.1 Depressão Respiratória 21

2.9.2 Retenção urinária 23

2.9.3 Prurido 25

2.9.4 Vômito 26

2.9.5 Mioclonia 26

2.9.6 Disforia 27

3 Considerações Finais 28

4 Referencias 30

   

1 INTRODUÇÃO

A partir da semente da papoula é extraído um liquido leitoso, do qual é

obtido o ópio. Em 1806, um farmacêutico alemão chamado Friedrich Wilhelm

Adam Sertürner isolou a morfina, que recebeu esse nome em homenagem a

Morfeu, o deus do sono. Desde então, os opioides são utilizados na medicina e na

medicina veterinária para o controle da dor (SCHUMACHER, 2006). Os opioides

são substâncias com propriedades analgésicas utilizados no controle da dor

aguda e crônica (LUMB & JONES, 2007). O termo “opioide” é usado para todos

os fármacos naturais, semissintéticos ou sintéticos com propriedades similares às

da morfina, incluindo os peptídeos endógenos. Enquanto que o termo opiaceo é

utilizado para designar os derivados do ópio, incluindo a morfina, os derivados

semissintéticos e a codeína (FANTONI, 2012).

A anestesia epidural consiste na deposição de fármacos com

propriedades anestésicas locais no espaço epidural, que se localiza entre a dura-

máter e o canal vertebral (KLAUMANN & OTERO, 2013). A presença intensa de

receptores opioides na substancia gelatinosa no corno dorsal da medula espinhal

sugeriu que a administração de doses pequenas de opioides no espaço epidural

produz analgesia, o que posteriormente foi comprovado (YAKSH & RUDY, 1976).

A administração de opioides via epidural induz analgesia mais profunda

e prolongada, com doses baixas e sedação menos intensa, em comparação com

a via parenteral. Diferentemente dos anestésicos locais, a administração epidural

de opioides para o tratamento da dor bloqueia os impulsos nociceptivos sem

afetar as atividades motora e autonômicas geradas na medula espinhal,

fornecendo analgesia sem produzir hipotensão, ou convulsões (COUSINS &

MATHER, 1984; FANTONI, 2012). As indicações para administração de opioides

pela via epidural são o fornecimento de analgesia nos períodos trans e

perioperatório, além do controle da dor aguda e crônica por períodos prolongados,

pelo uso de cateteres epidurais (FANTONI, 2012).

Quando a dor não é manejada de forma adequada, o paciente pode

apresentar arritmias cardíacas, hipercapnia, aumento do catabolismo proteico,

atraso na cicatrização de feridas e prolongamento da hospitalização (MATHEWS,

2000); isso demonstra claramente a importância do controle da dor, na qual os

2    

opioides tem papel primordial. Dentro deste contexto a via epidural é um item

auxiliar, já que promove analgesia sem os efeitos colaterais típicos da

administração dos opioides pela via parenteral, que por muitas vezes, são motivos

da suspensão dos fármacos analgésicos, comprometendo a recuperação do

paciente.

Com esta revisão de literatura objetiva-se abordar a farmacocinética e

farmacodinâmica dos principais opioides utilizados pela via epidural em cães e

gatos nos períodos trans e perioperatório para o controle da dor aguda, bem

como seus efeitos desejáveis e indesejáveis. Nesta revisão não será abordado o

uso dos opioides por via epidural no controle da dor crônica, pois a patogenia

dessa doença e a abordagem terapêutica a estes pacientes são diferentes.

3    

2 REVISÂO DE LITERATURA 2.1 Indicações do uso dos opioides pela via epidural

As indicações para administração de opioides pela via epidural são o

fornecimento de analgesia nos períodos trans e pós-operatório e, através da

colocação de cateter epidural, o alívio de dores agudas e crônicas por períodos

prolongados (FANTONI, 2012). A dor aguda é um sinal relacionado com alguma

doença, já a dor crônica é uma doença propriamente dita, sendo nociva e

independente do estimulo que a gerou (FANTONI & MASTROCINQUE, 2002).

Há recomendações para o uso dos opioides pela via epidural no

período perioperatório de intervenções cirúrgicas que podem ocasionar dor

intensa e prolongada como, por exemplo, cirurgias abdominais, torácicas,

genitourinárias, ortopédicas, em pacientes com alto risco cirúrgico, obesos,

portadores de insuficiência respiratória e idosos (McMURPHY, 1993)

O trauma cirúrgico ou acidental induz à liberação de mediadores

químicos inflamatórios que diminuem o limiar das fibras aferentes, levando ao

aparecimento da sensibilização periférica (hiperalgesia) e central (alodinia).

(VALADÂO et al., 2002). A hiperalgesia é o aumento da resposta a um estímulo

nocivo e pode ser primária, quando a hiperalgesia se localiza na região da lesão,

e secundária quando a hiperalgesia se localiza na região que circunda a lesão. O

termo alodinia é definido como a dor que surge como resultado de estimulação

não nociva sobre a pele normal (FANTONI & MASTROCINQUE, 2002). A redução

das alterações ocasionadas pela sensibilização central devido aos estímulos

nociceptivos durante a dor aguda previne o desenvolvimento da dor crônica, cujo

tratamento é mais laborioso e desafiador se comparado à dor aguda (OTERO,

2005).

Por causa da ação analgésica dos opioides, há diminuição da dose dos

anestésicos gerais intravenosos e redução da concentração alveolar mínima

(CAM) dos anestésicos inalatórios necessários para manter a anestesia,

reduzindo assim os efeitos indesejados dos anestésicos gerais, tais como

depressão respiratória e hipotensão (CAMPAGNOL et al., 2012). A CAM é

definida como a concentração de um anestésico inalatório, em uma atmosfera,

4    

necessária para abolir movimentos em resposta a um estimulo nocivo em metade

dos pacientes testados (OLIVA, 2002). A associação de técnicas e fármacos em

doses baixas com a finalidade de reduzir seus efeitos adversos é baseada na

teoria da anestesia multimodal, desejável para um procedimento anestésico

seguro e que garanta qualidade analgésica para o paciente (POSSO &

ASHMAWI, 2012).

2.2 Receptores opioides e classificação dos fármacos opioides

O efeito dos opioides é mediado por sua ligação a receptores

específicos encontrados no sistema nervoso central, mimetizando os efeitos

decorrentes da ligação dos peptídeos endógenos (FANTONI & GODOI, 2012).

Existem pelo menos três tipos de receptores opioides, os receptores mi

ou mu (µ), kappa (κ) e delta (δ). Os receptores µ são divididos nos subtipos µ1, µ2

e µ3, sendo distribuídos ao longo de toda a medula espinhal e são os principais

responsáveis pela analgesia quando se utiliza fármacos opioides (VALADÃO et

al., 2002; FANTONI & GODOI, 2012). Os receptores κ são divididos em pelo

menos quatro subtipos: κ1a, κ1b, κ2 e κ3 , e se localizam no segmento lombo-sacral

da medula espinhal (VALADÃO et al., 2002; FANTONI & GODOI, 2012). Os

receptores δ são divididos em dois subtipos, δ1 e δ2, porem os seus efeitos não

são totalmente compreendidos (FANTONI & GODOI, 2012). Esses receptores tem

sua distribuição restrita aos segmentos cervicais (VALADÃO et al., 2002).

Foi caracterizado recentemente um quarto tipo de receptor opioide, o

receptor para nociceptina, que produz um efeito anti-opioide, ou seja, pró-

nociceptivo, ao contrario dos outros receptores opioides (FANTONI & GODOI,

2012).

Os receptores µ e δ são responsáveis pela inibição dose dependente

das respostas aos estímulos termocutâneos e os receptores κ estão relacionados

à potente supressão da resposta aos estímulos químicos viscerais, mas não

interferem na nocicepção somática (VALADÃO et al., 2002).

Existem diferenças na farmacodinâmica dos opioides para os

receptores no sistema nervoso central (SNC) entre as espécies animais, mas, de

5    

forma geral, a analgesia espinhal é mediada pela ativação dos receptores µ1, µ2, κ

e δ (VALADÃO et al., 2002).

Os opioides se classificam em agonistas puros, agonistas parciais,

agonistas-antagonistas e antagonistas. Essas diferenças se devem à interação

entre o fármaco ligante e o receptor, no qual dois fatores são considerados: a

afinidade e a eficácia. A eficácia é descrita como dose-efeito de um fármaco. No

caso dos opioides o efeito é a analgesia; por exemplo, um agonista pleno ou total

produzirá o máximo de efeito possível ao se ligar ao receptor, enquanto que um

antagonista não produz nenhum efeito ao se ligar ao receptor. A afinidade é a

habilidade do fármaco de se ligar ao receptor. A potencia do fármaco esta

relacionada à afinidade, sendo a potencia definida como a dose necessária para

se obter um efeito desejado (FANTONI & GAROFALO, 2012).

Os opioides agonistas puros como, por exemplo, a morfina e o fentanil,

possuem grande afinidade pelos receptores µ e atuam com alta potência e

eficácia. Como exemplo de agonista parcial, ou seja, que possui efeito “teto”

menor que o efeito máximo possível produzido pelo agonista total, pode-se citar a

buprenorfina. Já os agonistas-antagonistas, como o butorfanol e a nalbufina,

apresentam ação agonista total ou parcial em um tipo de receptor e antagonista

em outro, neste caso, µ-antagonista e κ-agonista (quadro 1) (SCHUMACHER et

al., 2006).

Quadro 1- Afinidade dos principais opiodes por receptores µ, δ e κ. Opioide µ δ κ

Morfina +++ +/- +/-

Metadona +++ - -

Fentanil +++ - -

Tramadol + + +

Buprenorfina +++ - ++

Butorfanol ++ - ++

Fonte: OTERO (2005); FANTONI & GAROFALO (2012).

A maioria dos opioides analgésicos utilizados são agonistas seletivos

de receptor µ. A ativação dos receptores µ causa analgesia, euforia, depressão

respiratória, miose, sedação, redução da atividade gastrointestinal e dependência

6    

física. Os opioides agonistas seletivos de receptor κ também são clinicamente

utilizados, porém com menor frequência. A ativação dos receptores κ produz

analgesia e pode causar miose, diurese, sedação e disforia, mas não causa

dependência. Nenhum agonista seletivo de receptor δ foi introduzido na pratica

clínica, mas sabe-se que a estimulação dos receptores δ produz analgesia e pode

acarretar disforia, dependência, depressão respiratória e efeitos cardíacos

excitatórios (SCHUMACHER et al., 2006).

2.3 Fisiologia da dor aguda

A detecção de estímulos nocivos é iniciada pela transformação dos

estímulos ambientais nocivos físicos ou químicos em potenciais de ação que, das

fibras nervosas periféricas, são transmitidas para o sistema nervoso central. Na

medula espinhal, o estimulo seguirá pelas vias ascendentes, chegando ao córtex

onde ocorre a percepção consciente da dor (SAKATA & ISSY, 2004).

2.3.1 Dor somática

A dor pode ser entendida como a percepção central e consciente de

uma lesão tecidual e envolve quatro processos: transdução, transmissão,

modulação e percepção (figura 1) (FANTONI & MASTROCINQUE, 2012). A dor

somática acontece pela presença de um estímulo nocivo em pele, músculos,

articulações ossos e ligamentos. É frequentemente caracterizada como uma dor

aguda localizada em uma área específica (MEINTJES, 2012).

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FIGURA 1 - Sistema nociceptivo. Ilustração do percurso do potencial de ação

desencadeado pelo estimulo nociceptivo, que se inicia na

transdução, onde ocorre a captação do estimulo e termina na

percepção, no córtex.

Adaptado de FERRANTE, (1993).

Após injuria tecidual ocorre um processo inflamatório que resulta em

profundas alterações no ambiente químico dos nociceptores (LAMONT, 2008).

Ocorre liberação de várias substâncias algogênicas responsáveis pela

sensibilidade exacerbada e pela vasodilatação observada em lesões traumáticas,

inflamatórias e isquêmicas (TEIXEIRA, 2001). Esse processo consiste na

sensibilização periférica.

No processo de transdução os estímulos nocivos térmicos, mecânicos

ou químicos são transformados em potenciais de ação pelos nociceptores e

seguem pelas vias aferentes primárias até a medula espinhal. As fibras aferentes

primárias são classificadas em quatro classes: fibras A-delta, fibras C e fibras A-

beta e A-alfa (TEIXEIRA, 2009). As fibras A-delta têm diâmetro médio e

velocidade intermediaria de condução. As fibras C possuem pequeno diâmetro e

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baixa velocidade de condução, enquanto que as fibras A-beta e A-alfa possuem

grande diâmetro e alta velocidade de condução. A maior parte das fibras C e A-

delta são nociceptivas (OTERO, 2005). No processo de transmissão essas fibras

chegam à medula espinhal pelas raízes dorsais dos nervos espinhais e fazem

sinapse com lâminas especificas no interior da substância cinzenta medular

(LAMONT, 2008). Os impulsos nociceptivos gerados são processados nas

lâminas do corno dorsal onde se encontram os interneurônios, que interferem no

processamento das informações sensitivas inibindo ou facilitando a transmissão

dos sinais para os centros superiores do sistema nervoso central (TEIXEIRA,

2009).

A substância cinzenta da medula espinhal possui dez lâminas e o

corno dorsal medular contem as seis primeiras. Os neurônios nociceptivos do

corno dorsal estão localizados nas lâminas mais superficiais, a I (lâmina marginal)

e a II (substância gelatinosa). A maior parte da substância gelatinosa é formada

por interneurônios excitatórios e inibitórios, alguns respondendo a estímulos

nociceptivos e outros a estímulos inócuos (TEIXEIRA, 2009). Os estímulos

nociceptivos são transportados da medula espinhal para estruturas encefálicas

por meio de feixes neuronais de projeção ascendente compostos de fibras longas

denominados tratos (PISERA, 2005).

Na medula espinhal excitabilidade e inibição determinam a mensagem

que é transmitida aos centros supraespinhais. Nesse processo estão envolvidos

neurotransmissores excitatórios, como o glutamato, a substancia P e aspartato; e

neurotransmissores inibitórios como o acido gama-aminobutírico (GABA),

serotonina, encefalina, glicina, acetilcolina e noradrenalina (MUIR, 2009).

A substância P tem papel importante, pois causa redução do limiar de

excitabilidade das sinapses e ativação de sinapses anteriormente silenciosas,

além de induzir sensibilização de neurônios a distância, com aumento da

extensão da dor. Os neurotransmissores excitatórios atuam em receptores

inotrópicos dos tipos N-metil-D-aspartato (NMDA) e acido α-amino-3-hidroxi-5-

metil-4-isoxazol propiônico (AMPA) (SAKATA & ISSY, 2004).

Após a transmissão ocorrem a modulação e a percepção central da dor

nos centros supraespinhais. O estimulo nociceptivo é modulado em diversos

locais do SNC que possuem sistemas anatômica e neurofisiologicamente

9    

diferentes, podendo um mesmo estimulo ser percebido de maneira diversa em

cada individuo. A mensagem inicial pode ser exacerbada ou inibida a cada

sinapse (SAKATA & ISSY, 2004).

A substância cinzenta periaquedutal mesencefálica é uma área de rica

celularidade que circunda o aqueduto cerebral. É um local envolvido no sistema

de analgesia endógena, por apresentar alta concentração de peptídeos

endógenos e receptores opioides. Os peptídeos opioides inibem a descarga dos

neurônios GABAérgicos inibitórios, ativando as vias descendentes da modulação

inibitória da dor (PISERA, 2005). Outros importantes neurotransmissores que

participam da modulação inibitória da dor são a serotonina e a noradrenalina. A

serotonina é liberada por neurônios serotoninérgicos que, no SNC se concentram

nos núcleos da rafe (LUMB & JONES, 2007).

2.3.2 Dor visceral

Nas vísceras há a presença de fibras A-delta e fibras C, com maior

proporção da última. Tais particularidades fazem que a sensibilidade visceral se

diferencie da somática. As vísceras são mais sensíveis a distensões musculares,

isquemia e inflamação. A dor visceral apresenta a característica de ser difusa e

mal localizada, o que se deve ao fato de as vísceras apresentarem pouca

densidade de fibras aferentes com grandes campos receptivos (TEIXEIRA, 2009).

As respostas ao estímulo nociceptivo visceral envolvem ativação do sistema

autonômico produzindo taquicardia, taquipnéia, náuseas e sudorese (MEINTJES,

2012).

2.4 Mecanismo de ação dos opioides

A administração de opioides alivia a dor somática e visceral por

bloqueio seletivo dos impulsos nociceptivos sem interferir com a função sensorial

e motora, além de não interferir com o funcionamento do sistema nervoso

simpático (LAMONT & MATHEWS, 2013).

Os receptores opioides são encontrados nas terminações nervosas

pré-sinápticas e a interação fármaco-receptor resulta na diminuição da liberação

10    

de neurotransmissor e na inibição da geração do potencial de ação. A ação direta

dos opioides ocorre por dois mecanismos. O primeiro envolve o fechamento dos

canais de Ca2+ regulados por voltagem nas terminações nervosas pré-sinápticas,

o que promove diminuição do influxo desse íon e redução da liberação de

neurotransmissores como a substancia P. O segundo mecanismo consiste na

hiperpolarização dos neurônios pós-sinápticos por meio da abertura dos canais de

K+, inibindo as vias nociceptivas ascendentes (LAMONT & MATHEWS, 2013).

Há ainda um terceiro mecanismo proposto no qual a ligação do opioide

aos receptores µ ativa os canais dependentes de potássio presentes nas

terminações GABAérgicas. A inibição da liberação do GABA para a fenda

sináptica suprime a influencia inibitória e aumenta a transmissão antinociceptiva

supraespinhal descendente na substância cinzenta periaquedutal (SKARDA &

TRANQUILLI, 2013).

2.5 Farmacocinética dos opioides administrados pela via epidural

Os fármacos administrados por via epidural podem sofrer receptação

por 3 vias: absorção sistêmica pela rede capilar do espaço epidural, sequestro

pelo tecido adiposo epidural e absorção para o liquido cefalorraquidiano. Os

fármacos administrados pela via epidural, portanto, não realizam suas ações

exclusivamente por mecanismos espinhais, pois à medida que são absorvidos

para a via sistêmica são redistribuídos para os locais de ação supraespinhais. As

vias de receptação são influenciadas pelas propriedades físico-químicas de cada

fármaco (VALVERDE, 2008).

O perfil clínico de um analgésico opioide está intimamente ligado à

estrutura química da molécula e às suas propriedades físico-químicas. As

propriedades físico-químicas mais importantes incluem a constante de ionização

em um dado pH (pKa), a lipossolubilidade e a capacidade de ligação às proteínas

(VALADÃO et al., 2002).

De todos os fatores, o mais determinante na distribuição dos opioides é

a lipossolubilidade. Quanto maior a lipossolubilidade, maior o índice de

recaptação do fármaco e mais efeitos sistêmicos serão observados. Devido a

essa alta taxa de captação para outras vias, tais como corrente sanguínea e

11    

tecido adiposo, a permanência e dispersão cranial dos fármacos lipossolúveis são

limitadas, acarretando o que é conhecido como efeito segmentar, pois sua ação

se restringe a região na qual foi feita a administração do fármaco. As doses de

opioides lipofílicos requeridas para produzir analgesia epidural podem ser altas,

aproximando-se às requeridas para administração parenteral (MARUCIO &

COTES, 2012).

Particularidades como o tamanho da molécula, a fórmula espacial e a

afinidade pelos receptores, podem compensar a lipossolubilidade, como ocorre no

caso da buprenorfina. Este opioide é altamente lipofílico, mas penetra lentamente

as meninges, tendo um período de latência maior e mantendo ação analgésica

por tempo mais prolongado (SINATRA, 1993 citado por VALADÃO et al., 2002).

Quanto mais hidrossolúvel o fármaco, mais tempo permanecerá no

líquor e, portanto, maior será o período de ação (TORSKE & DYSON, 2000;

FANTONI, 2012). A morfina, por exemplo, possui baixa lipossolubilidade, o que

lhe permite permanecer durante longos períodos no canal medular, aumentando

sua biodisponibilidade no liquido cefalorraquidiano e tendo maior dispersão cranial

e duração dos efeitos, podendo oferecer analgesia até em dermátomos torácicos

(KLAUMANN & OTERO, 2013).

2.6 Técnica de injeção epidural

A abordagem ao espaço epidural em pequenos animais se realiza

habitualmente no espaço lombossacro (L7-S1). Contudo, é importante destacar

que é possível acessar o espaço epidural em qualquer espaço intervertebral da

coluna lombar (KLAUMANN & OTERO, 2013).

Na abordagem lombossacra o animal é posicionado em decúbito

esternal ou lateral, mantendo o eixo longitudinal da coluna vertebral paralelo à

mesa. Colocam-se os dedos polegar e médio da mão esquerda sobre as asas do

íleo e, com o dedo indicador, localiza-se a depressão situada entre a apófise

espinhosa de L7 e o sacro. A mão direita guia a agulha até o espaço epidural

(OTERO, 2005). A agulha é inserida através da pele e da musculatura até

encontrar uma estrutura que oferece maior resistência, o ligamento amarelo.

Quando a ponta da agulha vence a resistência oferecida pelo ligamento amarelo,

12    

entra no espaço epidural e é possível perceber a perda da resistência tanto à

progressão da agulha, quanto à injeção de ar ou da solução contida na seringa

(KLAUMANN & OTERO, 2013).

Quando necessário, o volume do fármaco a ser administrado pode ser

ajustado e diluído em solução fisiológica, resultando em um volume total de 0,2 a

0,26 mL/kg, para que se aumente a distribuição do opioide utilizado no espaço

epidural. O efeito analgésico pouco se altera com essa diluição (MARUCIO &

COTES, 2012).

2.7 Principais opioides utilizados pela via epidural

2.7.1 Morfina

A vantagem do bloqueio nociceptivo com a utilização da morfina é o

longo período de alivio da dor, sem produzir paralisia muscular ou significativos

efeitos hemodinâmicos (SKARDA & TRANQUILLI, 2013). Devido à

hidrossolubilidade deste fármaco doses relativamente baixas produzem analgesia

mais potente e duradoura do que a administração parenteral, além de ocorrer

progressão cranial e analgesia distante do ponto de injeção, podendo o fármaco

administrado pela via lombossacra dar adequada analgesia a pacientes que

passaram por toracotomia (POPILSKIS et al., 1993). Na dose de 0,1 mg/kg (um–

décimo da dose administrada pela via parenteral) tem inicio de ação entre 20 e 60

minutos e duração de 16 a 24h (MARUCIO & COTES, 2012).

2.7.2 Butorfanol

O butorfanol é um opioide sintético com ação antagonista nos

receptores µ e ação agonista nos receptores κ, promovendo analgesia e sedação

com mínimos efeitos adversos. Apresenta efeito “teto”, ou seja, o aumento da

dose não necessariamente aumenta a eficácia analgésica, mas pode prolongar a

duração (MARUCIO & COTES, 2012).

O butorfanol é um opioides lipofílico, o que significa que os efeitos do

fármaco pela via epidural se assemelham aos observados após administração

13    

pela via parenteral. Nestes casos, a analgesia pode ser decorrente da absorção

vascular sistêmica e consequentes efeitos nas estruturas supraespinhais

(TRONCY, 1996). O butorfanol é utilizado na dose de 0,25 mg/kg. O período de

latência é de 10 a 20 minutos e o período de duração entre 3 e 4 horas (OTERO,

2005).

2.7.3 Metadona

A metadona atua em receptores opioides tipo µ e também como

antagonista de receptores NMDA na medula espinhal (WAGNER, 2002).

Conforme demonstrado em estudo desenvolvido no homem, a metadona é 82

vezes mais lipossolúvel em relação à morfina, o que explicaria seu curto período

de ação (COUSINS & MATHER, 1984). Em cães, o período de latência foi de 20

minutos, com duração do efeito analgésico por cerca de seis horas após injeção

epidural (LEIBETSEDER et al., 2006).  

A administração epidural de metadona em gatos culminou com

aumento no limiar nociceptivo térmico por até 16 horas, sugerindo efeito

antinociceptivo de longa duração (PYPENDOP et al., 2008).

CAMPAGNOL et al. (2012) avaliaram os efeitos da metadona pelas

vias epidural e intravenosa sobre a concentração alveolar mínima do isofluorano

em cães. Foram realizados 3 tratamentos em que os animais receberam 0,5mg/kg

de metadona pela via intravenosa ou epidural. Quando a administração era pela

via epidural, realizavam-se estímulos elétricos em membro torácico ou pélvico.

Cinco horas após a injeção epidural houve redução na concentração alveolar

mínima de isoflurano no grupo que recebia estimulo elétrico nos membros

toracicos, indicando progressão cranial do fármaco na coluna espinhal, além

disso, houve redução mais significativa da concentração alveolar mínima nos

grupos que receberam a epidural em comparação com a intravenosa. Neste

mesmo experimento foram observados que em todos os tratamentos houve

redução da frequência cardíaca e aumento da pressão arterial sistólica no

momento 2,5h, que poderia ser explicado pelo aumento da resistência vascular

periférica, conferida pelo fármaco.

14    

Em estudo realizado por BERNARDI et al. (2012), avaliou-se os efeitos

analgésicos, sedativos e neuroendócrino decorrentes da administração epidural e

intramuscular da metadona em gatas submetidas à ovariossalpingohisterectomia

(OSH). Conclui-se que a administração de metadona pela via epidural resulta em

menor necessidade do analgésico no pós-operatório e que a analgesia é mais

prolongada quando comparada à obtida pela via intramuscular. Neste trabalho, foi

observada hipertermia em consequência ao uso de opioide em alguns animais.

Segundo BRANSON et al. (2001), o aumento da temperatura determinado pelos

opioides pode ser atribuído ao incremento de atividade muscular e a um

mecanismo hipotalâmico ainda não bem explicado.

2.7.4 Buprenorfina:

A buprenorfina é um opioide agonista parcial do receptor µ com alta

lipossolubilidade e baixa atividade intrínseca. Possui período de latência mais

longo que os demais opioides, sendo seu efeito analgésico observado cerca de

50 minutos após a sua administração (FANTONI, 2012).

Como é um fármaco altamente lipofílico, há especulações sobre se ele

pode exercer seus efeitos sistemicamente ou através da migração dentro do canal

medular ou em ambos os locais (STEAGALL et al., 2009). O efeito prolongado

pode ser explicado pela ligação forte da buprenorfina aos receptores, com

dissociação lenta, o que conduz a um longo período de duração (COWAN et al. ,

1977).

STEAGALL et al. (2009) encontraram período de ação analgésica de

até 24 horas em gatos que receberam injeção epidural de buprenorfina.

NOVAKOVSKI et al. (2011), pesquisaram sobre a concentração

plasmática da buprenorfina (20 µg/kg) pela via epidural em gatos conscientes. A

concentração plasmática máxima foi obtida 15 minutos após a injeção, se

manteve a um nível intermediário entre 4 e 12 horas e reduziu a concentração de

forma drástica no momento 24h. ROBERTSON et al. (2005) observaram que a

antinocicepção estava presente nos animais quando a concentrações no plasma

era acima de 1,2 ng/mL, o que foi observado durante todo o período do

experimento de NOVAKOSVSKI et al (2011). Concluiu-se que a maior parte do

15    

efeito analgésico pode ser devido à absorção sistêmica após a administração

epidural, embora este trabalho tenha tido limitações, pois não foram mensuradas

as concentrações no liquido cefalorraquidiano.

A eficácia analgésica da buprenorfina (4 µg/kg) foi comparada com a

da morfina (0,1 mg/kg), ambas administradas com volume total de 0,2 mL/kg, pela

via epidural, para alivio da dor pós operatória em 20 cães submetidos a correção

cirúrgica de ruptura de ligamento cruzado cranial. A epidural com buprenorfina

aparentemente foi tão efetiva quanto a da morfina no alivio da dor pós-operatória

em membro pélvicos e ofereceu algumas vantagens com relação a morfina, tais

como maior disponibilidade na forma livre de conservantes e custo relativamente

baixo (SMITH & YU, 2001).

STEAGAL et al. (2009) compararam os efeitos antinociceptivos da

buprenorfina 0,02 mg/kg, medetomidina 0,01 mg/kg e buprenorfina mais

medetomidina (metade das doses de cada fármaco) via epidural em gatos. A

analgesia do grupo buprenorfina durou até 24 h, a analgesia do grupo

medetomidina variou de 4 a 6 horas, mas com efeitos como vómito e sedação. O

grupo buprenorfina teve o maior período de analgesia, seguido da associação de

buprenorfina com medetomidina e por ultimo, o grupo medetomidina, com o

menor período de analgesia.

2.7.5 Tramadol

O tramadol é um analgésico de ação central que difere dos agonistras

opioides µ quanto a ligação, atividade e metabolismo, sendo este fármaco

considerado um opioide atípico. O tramadol não só se liga a receptores opioides,

como também inibe a receptação da noradrenalina e da serotonina (LEHMANN,

1997). Outro mecanismo de ação é seu efeito como anestésico local, pelo

bloqueio dos canais de Na+ voltagem-dependentes nas fibras nociceptivas C e A-

delta. O tramadol tem sua ação analgésica parcialmente inibida pela naloxona, o

que confirma que ela possui outros mecanismos de ação além da ligação aos

receptores opioides (WANG et al, 2010).

Este fármaco é composto por uma mistura racêmica de dois

enantiomêros. É um análogo da codeína, entretanto tem menor afinidade por

16    

receptores opioides que esta e menor potencial para tolerância e depressão

respiratória, além de não causar liberação de histamina. Sua afinidade pelo

receptor µ é baixa, sendo que seu metabólito O-desmetil-tramadol tem maior

afinidade por esse receptor (MARUCIO & COTES, 2012). O período de ação é de

6 horas para cães e gatos (OTERO, 2005).

MASTROCINQUE et al. (2012) compararam os efeitos analgésicos do

tramadol administrado via epidural ou via intramuscular no período pós-operatório

em cadelas submetidas a ovariossalpingohisterectomia. Vinte animais, divididos

aleatoriamente em dois grupos, receberam tramadol na dose de 2mg/kg pela via

epidural (EPI) ou intramuscular (IM). Não houve diferenças entre os dois grupos

em relação às variáveis cardiorrespiratórias, fração de isoflurano expirado e

escores de dor. O cortisol e a epinefrina aumentaram significamente no grupo

intramuscular. Concluiu-se com esses resultados que a resposta neuroendócrina

à dor foi mais bem modulada, porém não abolida, no grupo epidural quando

comparado ao grupo intramuscular. Isso pode ser explicado pela rápida e direta

ligação de tramadol aos receptores de opióides na medula espinhal, que

promoveu a ativação do mecanismo antinociceptivo e consequentemente, menor

liberação de epinefrina.

CASTRO et al. (2009) compararam o efeito analgésico da morfina e do

tramadol via epidural em gatos. Foram utilizados 6 gatos saudáveis, que

receberam isofluorano, somente para permitir a injeção epidural, e em seguida,

receberam os seguintes tratamentos: tratamento controle (CT), em que cada gato

recebeu injeção de soro fisiológico 0,22 ml /kg; tratamento tramadol (TT) na dose

de 1 mg / kg e tratamento morfina (TM) na dose de 0,1 mg /kg. Concluiu-se que o

tramadol foi capaz de fornecer analgesia por 6 horas enquanto que no grupo

morfina a analgesia foi observada até o final do experimento (24h). Neste estudo

foi observado ainda que os gatos apresentaram comportamento eufórico de até

12horas em ambos os grupos, porém nenhum apresentou disforia.

2.7.6 Fentanil

O fentanil é um opioide sintético, agonista µ, de curta duração, com

potência analgésica 75 a 125 vezes maior do que a da morfina. O uso pela via

17    

epidural é bastante discutido, já que pela sua alta solubilidade e fácil

permeabilidade pelas meninges seu tempo de ação é reduzido. Apresenta

vantagens como não provocar hipotensão grave por não desencadear liberação

de histamina, como ocorre no caso da morfina e da meperidina (VALVERDE,

2008).

DINIZ et al.(2013), analisaram 16 cadelas com o objetivo de avaliar o

efeito cardiovascular e qualidade analgésica utilizando-se a lidocaína associada

ao fentanil ou metadona pela via epidural em procedimento de

ovariossalpingohisterectomia. Os animais foram separados em 2 grupos, o grupo

1 recebeu fentanil (5µg/kg) e o grupo 2 recebeu metadona (0,3mg/kg) pela via

epidural. Anestesia suplementar era fornecida por propofol (5mg/kg) sempre que

a analgesia fosse insatisfatória. No grupo fentanil, a pressão se apresentou mais

baixa em comparação ao grupo metadona nos primeiros 5 minutos, porém sem

apresentar hipotensão (PAS˂90 mmHg). 50% das cadelas do grupo fentanil

precisaram de resgate com propofol durante procedimento cirúrgico contra 62%

do grupo metadona.

Conclui-se que não houve depressão cardiorrespiratória em nenhum

dos grupos demonstrando a estabilidade cardiovascular dos protocolos, porém, a

analgesia para o procedimento de ovariohisterectomia foi insuficiente em ambos

os grupos, o que sugere que a dispersão cranial das drogas injetadas no espaço

epidural foi insuficiente para alcançar terceira vertebra lombar, de onde se origina

a inervação dos ovários, prejudicando a manipulação dos ovários.

2.7.8 Sufentanil

O sufentanil é um opioide agonista sintético análogo do fentanil, mas

de 5 a 10 vezes mais potente. Apresenta meia-vida plasmática em torno de 17

minutos e meia vida de eliminação de 2,2 a 4,6 horas (MARUCIO & COTES,

2012).

Em comparação com a morfina, o sufentanil pela via epidural apresenta

as vantagens de ampla margem terapêutica, alta afinidade aos receptores µ e

baixos índices de efeitos adversos. Como desvantagens estão a alta

lipossolubilidade e o baixo peso molecular, o que resulta em baixa

18    

biodisponibilidade nos receptores opioides na medula espinhal, sequestro pela

gordura epidural e rápida absorção sistêmica (ADAMI, 2012).

NATALINI et al. (2011) compararam a qualidade e duração da

analgesia, além das alterações cardiorrespiratórias resultantes da administração

epidural de clonidina ou sufentanil em cadelas anestesiadas com halotano

submetidos a procedimento de ovariohisterectomia. Foram utilizados 20 animais

adultos divididos em dois grupos, o grupo clonidina (CLO) recebeu 150µg e o

grupo sufentanil (SUF) recebeu 50 µg. A Concentração alveolar mínima de

halotano, frequência cardíaca e temperatura apresentaram diminuição em ambos

os grupos. Houve queda significativa na frequência respiratória e no volume

minuto no grupo sufentanil indicando depressão respiratória. No entanto este

grupo apresentou menores escores de dor durante as 5h de avaliação.

A redução da frequência cardíaca pode ser explicada pela redução no

tônus do sistema nervoso simpático, visto que o sufentanil possui discreta

atividade simpatolítica e vagotônica (BOVILL, 1993). Já os agonistas adrenérgicos

de receptores α-2 podem causar bradicardia por efeito parassimpatomimético

(MANTZ, 2000).

2.8 Associação de opioides a outras classes de fármacos

A intensidade e a duração da analgesia obtida pela injeção epidural de

opioides podem ser aumentadas com a administração concomitante de outras

substâncias (VALADÂO et al., 2002).

2.8.1 Anestésicos locais

A administração de anestésicos locais em associação com opioides

pode oferecer vantagens, já que o anestésico local produz bloqueio imediato,

tanto sensitivo como motor, aliviando a dor e favorecendo, posteriormente, a ação

analgésica de longa duração dos opioides (VALADÂO et al., 2002).

A adição de anestésicos locais aos opioides pela via epidural mostrou

aumentar a intensidade e a duração da analgesia, além de reduzir a dose de

opioide e a incidência de efeitos indesejáveis e sedação (ALMEIDA et al. 2007).

19    

ADAMI et al. (2012) avaliaram a analgesia e o bloqueio motor

perioperatório utilizando a ropivacaína, sufentanil e efedrina pela via epidural em

cães. Os 40 animais foram separados em 4 grupos: grupo R1 (1mg/kg de

ropivacaina a 0,5%), grupo R 0,5 (0,5mg/kg de ropivacaina a 0,25%), grupo SR

0,5 (1µg/kg de sufentanil associado a 0,5mg/kg de ropivacaina a 0,25%), grupo

SER 0,5 (1µg/kg de sufentanil associado a 6µg/kg de epinefrina e a 0,5 de

ropivacaina a 0,25%). Não houve diferenças estatísticas em pressão arterial e

frequência cardíaca entre os grupos, nenhum grupo apresentou bradicardia e

hipotensão. O grupo SER 0,5 foi o que apresentou menores scores de dor,

seguido pelo grupo R1. Todos os animais urinaram espontaneamente após 4

horas. O grupo SER 0,5 mostrou menor bloqueio motor que o grupo R1. Os níveis

séricos de ropivacaina foram maiores no grupo SR 0,5 do que no grupo SER 0,5.

Esses resultados podem ser explicados pelo fato de a epinefrina

reduzir o fluxo sanguíneo no espaço epidural, reduzindo a absorção sistêmica do

opioide e do anestésico local. No referido estudo, a adição de epinefrina foi eficaz

em retardar a absorção sistémica da ropivacaína por cerca de 200 minutos após a

injeção epidural, porém, teve pouco efeito sobre a concentração sérica do

sufentanil.

2.8.2 Agonistas de receptores adrenérgicos α-2

A administração epidural de agonistas α-2 tem sido usada para

produzir analgesia mais intensa e prolongada sem indução de ataxia. A

associação desses agentes com a morfina aumenta o período de analgesia em

cães (KEEGAN et al., 1995). O uso conjunto de agonistas α-2 e opioides pode ser

de grande utilidade, já que as duas substâncias têm sítios de ligação específicos

na medula espinhal (VALADÂO et al., 2002).

A analgesia induzida por agonistas α-2 aplicados por via espinhal

ocorre por meio da ativação dos adrenorreceptores α-2 pré-sinápticos localizados

nas fibras C aferentes primarias que adentram às laminas superficiais do corno

dorsal da medula espinhal (BUERKLE & YAKSH, 1998). A ativação desses

receptores induz a síntese de proteína G diminuindo o influxo de cálcio, a

liberação de neurotransmissores e a atividade nociceptiva (TAKANO et al., 1993).

20    

A ativação dos heterorreceptores alfa-2, localizados nos neurônios pós-sinápticos

de larga faixa dinâmica, os quais projetam seus axônios para as fibras aferentes

primárias do corno dorsal, causa hiperpolarização dos neurônios, ativando canais

de potássio acoplados à proteína G, produzindo analgesia espinhal mediada pós-

sinapticamente (SKARDA & TRANQUILLI, 2013).

Os efeitos mais evidentes da ativação dos adrenorreceptores α-2

espinhais, além de aumento do limiar nociceptivo, são bradicardia e hipotensão

(SEDIGHI, 2003). Pode-se citar como exemplo de α-2 agonista a xilazina, a

medetomidina e a dexmedetomidina (OTERO, 2005).

2.8.3 Dissociativos

Dos fármacos dissociativos, a cetamina é o fármaco mais estudado

pela via epidural. A cetamina pela via epidural age por três possíveis mecanismos

de ação. O primeiro é a sua ação como antagonista de receptores NMDA,

podendo impedir hiperexcitabilidade durante a cirurgia e o período pós-cirúrgico,

reduzindo a dor e a hiperalgesia. Um segundo mecanismo se baseia no bloqueio

dos canais de sódio e potássio voltagem-dependentes, suprimindo a condução

elétrica nas fibras nervosas, agindo como anestésico local. Essa ação com o

anestésico local é de curta duração. O terceiro mecanismo é a interação com

subtipos de receptores opioides, propionato, cainato e GABA do tipo A (SKARDA

& TRANQUILLI, 2013). Essa interação complexa da cetamina com os receptores

dificulta a determinação do local especifico do efeito analgésico produzido pela

cetamina (MARUCIO & COTES, 2012).

VALADÂO et al. (2002b) avaliaram os efeitos analgésicos da cetamina

ou morfina pela via epidural no período pós-operatório. Foram avaliados 14 cães

mestiços. Os cães receberam injeção epidural de morfina (0,1mg/kg) ou cetamina

(0,2mg/kg) diluídas em 0,3ml/kg de solução salina. Foi feita um incisão

experimental no coxim plantar com o intuito de realizar o teste de von Frey. O

teste de von Frey é realizado tocando a região próxima a incisão com filamentos

de diferentes diâmetros, dos mais finos para os mais grossos. O grau de dor

aumenta quando se aumenta o diâmetro do filamento. O limiar de sensibilidade

21    

estaria entre o valor do filamento de maior diâmetro que não produziu resposta e

o filamento de menor diâmetro que produziu resposta aversiva.

No grupo morfina o período de latência foi de 30 minutos, persistindo o

efeito analgésico até o fim da avaliação (24h) enquanto que no grupo cetamina

observou-se aumento progressivo da resposta à dor durante estimulação pelos

filamentos de von Frey desde os 90 minutos até 24 horas. Concluiu-se que a

morfina teve maior período de ação do que cetamina, que forneceu analgesia por

90 minutos. As doses sugeridas dos fármacos utilizados pela via epidural estão

resumidas no quadro 2.

QUADRO 2- Fármacos mais utilizados pela via epidural, com suas respectivas classificações, doses e duração de analgesia.

Fármaco Classificação Dose Latência Analgesia

Morfina Opioide agonista total

0,1 mg/kg 30 a 60 minutos

10 a 24 horas

Metadona Opioide agonista total

0,2-0,3 20 minutos 4 a 9 horas

Butorfanol Opioide agonista-antagonista

0,25mg/kg 10 a 20 minutos

1 a 4 horas

Buprenorfina Opioide agonista parcial

10 a 20 µg/kg 50 a 60 minutos

8-24 horas

Fentanil Opioide agonista total

1 a 5 µg/kg 10 a 20 minutos

3 a 5 horas

Sufentanil Opioide agonista total

0,7 a 1µg/kg 10 a 15 minutos

1 a 4 horas

Xilazina Agonista α2 0,02 a 0,25 mg/kg

10 a 30 minutos

2 a 5 horas

Bupivacaina Anestésico local

1 mg/kg 10 a 20 minutos

4 a 6 horas

Cetamina Dissociativo 2 mg/kg 5 a 10 minutos

1 a 4 horas

Fonte: MARUCIO & COTES (2012), OTERO (2005).

2.9 Efeitos adversos

2.9.1 Depressão respiratória

22    

A depressão respiratória é caracterizada como baixa frequência

respiratória, altos valores arteriais de PaCO2, baixos níveis de saturação de

oxihemoglobina, diminuição do nível de consciência, aumento do nível de

sedação, resposta ventilatória deprimida em situação de hipóxia e hipercapnia e

necessidade de tratamento com naloxona (KO et al., 2003). Os fatores

associados à depressão respiratória são o uso de opioides hidrofílicos, doses

totais altas, doses repetidas e a administração concomitante de opioides por via

parenteral (ETCHES et al., 1989).

Há tempos, acreditava-se que a depressão respiratória durante a

anestesia epidural era causada pela interação entre o opioide no liquido

cefalorraquidiano e os receptores de opioides na medula ventral. Recentemente

foi identificado o complexo preBötzinger, localizado na medula espinhal e

responsável pela diminuição da frequência respiratória após a administração

sistêmica de opioides. Neurônios no complexo preBötzinger que expressam

receptores de neurocinina-l são seletivamente inibidos por opioides e, portanto,

são os mediadores da depressão respiratória induzida por esses fármacos

(SULTAN, et al, 2011).

A depressão respiratória é classificada como precoce (< 2 horas) ou

tardia (> 2 horas), em relação à administração epidural do opioide. A depressão

respiratória tardia é um fenômeno associado a opioides hidrofílicos,

principalmente a morfina, pois permanece por longos períodos no liquido

cefalorraquidiano podendo ocorrer progressão cranial do fármaco até o tronco

encefálico. Em cães e gatos a dose da morfina via epidural é de 0,1 mg/kg, o

período de latência é de 20 a 60 minutos e o período de duração é de 16 a 24

horas (FANTONI, 2012). A depressão respiratória da morfina é dose-dependente,

o que explicaria o fato de baixas doses apresentarem baixa incidência deste efeito

indesejado (SULTAN et al.,2011).

Os opioides lipofílicos, como, por exemplo, o fentanil, têm menor efeito

sob a função respiratória do que os opioides hidrofílicos, mas a depressão

respiratória precoce é mais comumente observada após a administração dos

lipofílicos. A depressão respiratória precoce pode ter menor importância que a

depressão tardia, quando a injeção epidural for realizada antes da cirurgia, já que,

23    

nesse caso, o paciente estará sendo monitorizado continuamente (SINATRA,

1993, citado por VALADÃO et al., 2002). A incidência de depressão respiratória

profunda após administração epidural de fentanil é muito baixa (JEFFREY &

GRASS, 1992).

O tratamento da depressão respiratória inclui o fornecimento de

oxigênio ao organismo, evitando assim a hipóxia, além do uso de antagonistas

opioides. O uso da naloxona pode levar a perda da analgesia, resultando em

dificuldade no manejo da dor. Além disso, pode ocorrer renarcotização devido à

curta meia vida da naloxona (TAFF, 1983, citado por CHUMBLEY & THOMAS,

2010).

O uso da naloxona tem sido discutido em função dos efeitos adversos

da reversão da analgesia e liberação de catecolaminas. Estes efeitos adversos

incluem dor, estimulação psicológica e resposta simpaticomimética (TAFF, 1983,

citado por CHUMBLEY & THOMAS, 2010).

Para cães e gatos, recomenda-se a administração lenta e diluída da

naloxona na dose de 0,04 a 1 mg/kg (OTERO, 2005).

ALBERSON et al. (2011) realizaram experimento com 16 cães que

passariam por esplenectomia, os animais foram separados em 2 grupos, o

primeiro grupo recebeu morfina epidural 0,1mg/kg e o segundo grupo recebeu a

morfina 0,1mg/kg mais uma dose de 0.25 mg/kg de bupivacaina a 0.167%. Foram

avaliadas função motora e dor por meio de uma pontuação numérica da escala de

dor da Universidade de Melbourne (UMPS). Hemogasometria arterial foi realizada

a cada duas horas após a administração epidural para verificar se havia

comprometimento respiratório. Não houve diferenças estatisticamente

significativas em escores motores, escore de dor, quantidade de resgate

analgésico e PaCO2 entre os grupos de tratamento. Nenhum cão demonstrou

depressão respiratória ou disfunção motora profunda durante o estudo.

2.9.2 Retenção urinária

A micção normal é uma função reflexa da coluna vertebral com

mediação do tronco cerebral caudal. Os sinais de estiramento da bexiga pela

urina são recebidos no músculo detrusor, essa informação sensorial é passada

24    

através do nervo pélvico para a medula sacral espinhal e tronco cerebral. A

seguir, os sinais de contração do detrusor são retransmitidos através de axônios

eferentes parassimpáticos pelo nervo pélvico. A micção é facilitada pelo

relaxamento da bexiga e da uretra proximal, através da inibição de neurônios

simpáticos alfa-adrenérgicos (de LAHUNTA, 1983 citado por HERPENGER,1998).

A retenção urinária após administração epidural ou parenteral de

opioides em cães tem sido atribuída à perda do tônus no músculo detrusor,

devido ao bloqueio parassimpático (HENDRIX et al., 1996). A morfina liga-se aos

receptores opioides µ e δ na medula espinhal, inibindo os axônios

parassimpáticos eferentes do nervo pélvico, os quais controlam a contração do

músculo detrusor, produzindo hipotonicidade da bexiga e distensão por retenção

urinária. Os receptores κ não intervêm neste processo (YAKSH, 1993;

HERPERGER, 1998). A retenção urinária causada por administração de opioides

pela via epidural é relatada em 10 a 15 % na literatura médica (DARRA et al.,

2009) e menos de 11% na literatura veterinária (LYNCH.et al, 2001).

SONG et al. (2011), descreveram um relato de caso sobre uma

suspeita de doença urinária crônica e disfunção intestinal causada por morfina

pela via epidural em um gato com suspeita de linfoma intestinal. Foi administrado

0,43 ml (0,43 mg) de morfina diluído em 0,86 ml de solução salina pela via

epidural. Quatro dias após a alta o animal retornou com incontinência urinária e

ausência de peristaltismo intestinal. O exame neurológico revelou um déficit no

reflexo do períneo e tônus anal. O animal desenvolveu infecção urinária seis e

dez meses após a cirurgia. Neste caso é possível que à retenção urinária tenha

ocorrido inicialmente por causa da administração de morfina pela via epidural, e

posteriormente, a hipotonia da bexiga associada a retenção urinaria tenha

lesionado o musculo detrusor causando dano à elasticidade da bexiga urinária.

A administração intratecal de fentanil causa relaxamento da bexiga,

produzindo, também, um marcante efeito relaxante na uretra, quando comparado

com a morfina, buprenorfina e metadona. A buprenorfina não apresenta efeito

algum sobre essas estruturas. A conclusão dos autores aponta que o relaxamento

uretral ocasionado pelo fentanil poderia prevenir a distensão excessiva da bexiga

associada à retenção urinária. Essas características fazem desses dois opioides

25    

os mais apropriados nos pacientes em que as complicações urinárias devem ser

evitadas particularmente (DRENGER & MAGORA, 1989). 2.9.3 Prurido

O prurido é outro possível efeito adverso induzido pela administração

epidural de morfina e parece ser dose dependente. A frequência de apresentação

no homem varia entre 90 e 100%, para a dose total de 10 mg, e entre 1 e 28%,

para doses totais entre 2 e 5 mg. A explicação para esse fenômeno ainda não é

clara. Suspeita-se que a causa seja a alteração da modulação do sistema

sensorial cervical, ocasionada pela difusão cranial do opioide. Para alguns

autores, a liberação de histamina (ocasionada pelos conservantes presentes na

substância injetada) não tem um papel importante; mas para outros é evidente a

participação desses agentes no processo, após injeção epidural de morfina

(McMURPHY, 1993).

O uso de anti-histamínicos é questionável, embora o uso de

difenidramina possa, eventualmente, aliviar os sinais. A naloxona pode ser usada,

apesar de existirem relatos de ineficácia com este procedimento (CASTRO et al.,

1991).

Doses sub-hipnóticas de propofol têm sido usadas para controlar o

prurido nestes casos, tendo-se sucesso em aproximadamente 85% dos pacientes.

O propofol produz marcada depressão dos cornos ventral e dorsal da medula

espinhal, tendo sido postulado que sua ação antipruriginosa é devido à inibição da

transmissão pós-sináptica. O propofol é um modulador do receptor de GABA e

pode exercer o seu efeito antipruriginoso no cérebro (GENT et al., 2013). A dose

de propofol usada nesses casos não produz sedação, hipnose ou diminuição da

intensidade da analgesia.(McMURPHY, 1993).

GENT et al (2013) relataram dois casos de prurido após administração

de morfina pela via neuraxial em gatos em procedimento cirúrgico ortopédico. O

primeiro gato recebeu a morfina pela via intratecal e o segundo pela via epidural.

O prurido foi observado de 3 horas e meia a 4 horas após injeção epidural. No

gato que recebeu a morfina pela via epidural realizou-se infusão continua de

medetomidina na dose de 1 a 1,5µg/ kg por hora. O resultado foi que com a dose

26    

menor (1 µg/ kg) não houve controle do prurido e na dose maior (1,5 µg/ kg)

houve controle, mas houve também sedação. Após a infusão o animal dormiu por

8 horas e não houve mais prurido.

No gato que recebeu a morfina pela via epidural, foram feitos 4 bolus

de propofol (formulação em emulsão lipídica) em 20 minutos na dose de 0,1

mg/kg, o animal diminuiu o comportamento de lamber e apresentou sinais de leve

sedação, mas ainda alerta e responsivo. Posteriormente não foi observado

prurido.

2.9.4 Vômito

O vômito é um efeito adverso dose-dependente. Elevadas quantidades

de morfina no LCR facilitam a ativação da zona quimiorreceptora na área

postrema (McMURPHY, 1993). Em gatos o vômito é relativamente mais comum

do que em cães, principalmente após injeção epidural de morfina (VALVERDE et

al., 1989).

2.9.5 Mioclonia

A mioclonia é um efeito adverso raramente observado em pequenos

animais. Estudos em animais e culturas neuronais espinhais levaram a duas

teorias que explicam a hiperatividade muscular, que são a interação da morfina

com receptores GABA e glicina no sistema nervoso central, ocorrendo o bloqueio

da inibição pós-sináptica e, a ativação dos sistemas serotoninérgicos espinhais

(BALANTINE et al. ,1988)

A ineficácia da naloxona no tratamento das mioclonias indicam que os

receptores não opioides podem estar envolvidos no mecanismo de ação (IFF et

al, 2012). Estes autores relataram um caso de mioclonia e prurido em uma cadela

após administração intratecal de morfina em procedimento de correção de ruptura

de ligamento cruzado cranial. O animal recebeu a epidural na dose de 0,05 mg/kg

de morfina sem conservantes associada a 0,62 mg/kg de lidocaína e 0,31 mg/kg

de peso corporal de bupivacaína resultando em um volume total de 3,16 ml.

27    

Durante a recuperação o animal apresentou inquietação, lambedura e mordedura

dos membros e espasmos musculares na cauda.

O tratamento foi feito utilizando metadona na dose de 0,1 mg/kg pela

via endovenosa e em seguida aplicou-se a cetamina na dose de 0,5 mg/kg pela

via intramuscular. Houve diminuição no ato de lamber, mas não nos espasmos

musculares, que se tornaram mais severos 3 h após a extubação. Foi então

administrado diazepam na dose de 1mg/kg via intravenosa, seguido de outra dose

15 minutos depois, pois o animal ainda apresentava os sinais clínicos. Houve

persistência da mioclonia, e foram ainda administrados buprenorfina 0,01 mg/kg e

butorfanol 0,2 mg/kg , 2 e 3 h após a extubação , respectivamente. Ambos os

agentes foram ineficazes

2.9.6 Disforia

Nos gatos, principalmente, existe uma grande preocupação com

relação ao uso de opioides em razão da possível excitação e disforia dose-

dependente desencadeada por esses analgésicos, no entanto, quando doses

adequadas são empregadas, esse efeito não é observado (CAPNER et al., 1999).

Doses adequadas conferem a essa espécie efeitos comportamentais

que incluem a euforia com ronronar, rolar e amassar com as patas (ROBERTSON

& TAYLOR, 2004).

28    

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os opioides são os fármacos mais utilizados no controle da dor aguda.

A via epidural é uma opção viável, que tem uma série de vantagens, como a

redução dos efeitos adversos e o aumento do período de ação.

Nesse contexto, a morfina é referência em relação aos outros opioides,

visto que a ação farmacológica de outros opioides e seus efeitos no organismo

são comparados, na maioria dos estudos científicos, com as características

farmacológicas da morfina. Devido ao seu longo período de ação e poucos efeitos

adversos apresentados nas espécies canina e felina, a morfina é amplamente

utilizada pela via epidural.

Alguns fármacos não estão disponíveis no Brasil, como por exemplo, a

buprenorfina, amplamente utilizada em outros países. O butorfanol ainda pode ser

encontrado no mercado, porém com grande dificuldade. A ausência desses e de

outros fármacos opioides em nosso país, dificulta o trabalho do anestesiologista,

que possui uma pequena gama de opioides para serem utilizados pela via

epidural.

Os fármacos de curto período de ação, como o fentanil e o tramadol,

são ideais para analgesia nos períodos transoperatório e pós-cirúrgico imediato. A

vantagem do uso desses opioides é a menor possibilidade de efeitos adversos no

pós-operatório, se comparados com a morfina.

A meperidina, opioide de uso comum pela via parenteral não foi citado

neste trabalho devido aos poucos estudos com a sua utilização pela via epidural.

Isso pode ser explicado pela sua curta duração, de 2,5 a 3,5 horas, associado aos

efeitos adversos que pode causar, comparando-se nesse quesito, aos efeitos

adversos causados pela morfina.

A associação de opioides a outas classes de fármacos é extremamente

benéfica, pois a associação dos mesmos resulta em redução das doses e

diminuição dos efeitos adversos, além de aumentar a qualidade e tempo de

duração analgésico.

Os felinos merecem atenção especial, pois alguns efeitos adversos se

manifestam de forma diferente. O prurido intenso aparentemente é mais comum

nessa espécie, visto que vários trabalhos foram encontrados a este respeito. Já a

29    

disforia é superestimada nessa espécie, pois o uso de doses adequadas de

opioides confere baixa incidência desse efeito adverso.

Acredita-se que a subutilização dos fármacos opioides pela via epidural em

cães e gatos se deve ao medo e desconhecimento de seus efeitos no organismo,

a resistência do médico veterinário e do proprietário à pratica da epidural e a

pequena diversidade de fármacos disponíveis no Brasil, sendo que este último

fator, pode dificultar a seleção do fármaco ideal para cada caso especifico. Os

efeitos adversos são raramente observados em cães e gatos, e geralmente são

dose-dependentes, o que permite que a realização do procedimento de forma

correta tenha pequena chance de intercorrências.

30    

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