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1 III FÓRUM DE PESQUISA FAU.MACKENZIE I 2007

A TIPOGRAFIA NA REVISTA GRÁFICA: MUTABILIDADE, DIÁLOGO E IDENTIDADE

Daniele Rodrigues de OliveiraΘ

Zuleica SchincariolΘ

O artigo discute a tipografia no design gráfico editorial da Gráfica, revista brasileira de caráter internacional publicada desde 1983, que apresenta produções projetuais do campo do design. É parte de uma pesquisa que analisa o projeto gráfico desde a origem desse periódico, relacionado às decisões da pauta editorial e contextualizado no debate contemporâneo da disciplina. Aqui é enfatizada a questão das escolhas e articulações tipográficas na revista, relacionando concepção e processos no design gráfico editorial, a proposta editorial e conceitos que fundamentam orientações e posicionamentos de projeto.

Revista: Legibilidade e Comunicação

As revistas, objetos gráficos com características de portabilidade, repetitividade, tatilidade, compõem-se essencialmente, segundo Leslie1, da combinação entre textos e imagens criada através da colaboração entre redatores e designers. O aspecto fundamental nessa interação é a “química” gerada entre essas duas disciplinas, “um bom designer de revistas deve captar a essência de periodicidade, e um bom redator deve entender a importância do design” 2. É nessa interação que, decisões de projeto – como, o formato, a estrutura básica de referência, as tipografias e demais componentes – contribuirão em conjunto, para criar a identidade e a materialidade da revista.

A seqüencialidade, aspecto importante desse tipo de publicação, pode ser percebida como um processo orgânico e contínuo no tempo. A periodicidade permite a incorporação gradual de mudanças no design gráfico, possibilita transformações “sem perder a natureza nuclear da revista” 3. Cada novo número oferece a oportunidade de testar algo novo como reação aos números anteriores, a oportunidade de refletir, inclusive de questionar e propor rupturas.

Formato e configuração da capa comunicam identidade do projeto4. A capa de cada revista caracteriza suas edições como pertencentes a uma série e ao mesmo tempo sinaliza a singularidade de cada exemplar. Assim, a articulação entre elementos constantes e variáveis

Θ Bacharel em Desenho Industrial pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e bolsista do Programa Institucional de Bolsas para Iniciação Científica da Universidade Presbiteriana Mackenzie

Θ Professora Mestre e pesquisadora do curso de Desenho Industrial da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie

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pode possibilitar ao leitor essa percepção de individualidade com presença no conjunto. O elemento principal de identificação constante é o nome da revista e a forma como é apresentado. Para os leitores, o reconhecimento se dá através da relação precisa entre o nome, o design do nome e o conteúdo da revista.

O autor enfatiza a relação entre elementos textuais e não textuais destacando a organização da tipografia no espaço visual. A ordenação tipográfica, unida aos demais componentes do projeto, constrói a personalidade da publicação: (...) esses elementos são chaves em qualquer estrutura e planejamento, já que localizam sutilmente o conjunto de elementos fixos que compõem a primeira página de qualquer artigo: o título, a introdução, a fotografia, os créditos, e por último, o texto. O que define o caráter de uma revista é a maneira como se projetam e se combinam essas partes, a maneira como interagem as palavras.5

Leslie apresenta no design contemporâneo de revistas uma tensão entre projetos com identidades e estruturas definidas, que enfatizam legibilidade e comunicação, e projetos que interferem nesses princípios, “tradicionalmente” reconhecidos no design gráfico editorial.

A tradição referida advém do assentamento do paradigma funcionalista, que estabelece como parâmetros essenciais de projeto a ordenação, a clareza, a legibilidade, a facilidade de codificação e a rapidez de absorção da comunicação pelo observador. Um processo que se inicia no final da Bauhaus e se expande mundialmente com a Escola Norte-Americana e a Escola Suíça, como mostra Villas-Boas.6

A emergência de produções que não seguem esses princípios, a partir dos anos de 1970, anuncia uma crise no design gráfico: (...) crise esta que, na verdade se configura numa crise do funcionalismo e, indo mais a fundo, denota a crise do próprio Modernismo. Especialmente, nos anos 80, experiências não-canônicas vão demonstrando que os cânones funcionalistas não dão mais conta como norteadores incondicionais.7

Esses projetos de tendências não-canônicas, como denominados por Villas-Boas, propõem um rompimento com os aspectos conceituais ou técnico-formais dos cânones funcionalistas. Busca-se dificultar a comunicação, ou, estabelecer propositadamente uma comunicação não-imediata, “subvertendo o cânone maior do ideário funcionalista” 8, até mesmo a legibilidade é questionada, como nos bastante comentados projetos de revistas de David Carson e Neville Brody.

Outra questão importante a ser considerada no design gráfico de revistas é o papel do designer como mediador entre a mensagem do autor, a materialização de sua forma impressa e o leitor. Grusynsky 9, traz o debate com ênfase na tipografia, situando uma tensão entre dois pólos: uma mediação que tende ao invisível, relacionada à noção de transparência, ou uma mediação atuante, relacionada à noção de co-autoria.

O pólo da invisibilidade orienta-se pela comunicação clara e objetiva, evitando interferências e ruídos na mensagem, utilizando para isso princípios de legibilidade, ordem e clareza. Já o design posicionado como co-autoria, apresenta-se impactante e subjetivo, com soluções interpretativas e ousadas, chamando a atenção, primeiro, para a composição, a compreensão

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da informação é colocada em segundo plano. Mas, é importante atentar para a advertência da autora: (...) a atividade do design é sempre de mediação, porém o contexto em que se insere, exigirá do profissional e de outros envolvidos no processo de estruturação da mensagem, a decisão de aproximá-la mais da transparência ou da co-autoria, realizando esta escolha sempre em função de cada projeto.10

A Revista Gráfica

Criada por Oswaldo Miranda, ou Miran, que projetou, editou e bancou os custos de produção dos primeiros 17 números, a revista Gráfica inicia a sua trajetória como uma “uma revista catálogo”. Em entrevista, Miran11 assim a define: A Gráfica não é uma revista que critica, que discute o que é mais importante para área, nem questiona o trabalho de outros. Para isso tem a "Eye" inglesa. Também não é didática, para isso tem centenas. A revista é uma divulgadora daquele que já é sucesso e ao mesmo tempo apresenta aquele desconhecido que está despontando e que a revista ajuda a crescer. É também uma revista democrática mostrando todo mundo, brasileiros e estrangeiros lado a lado a cada número.

Segundo Straub12, a revista tem origens no suplemento cultural quinzenal O Raposa, que circulou como encarte no jornal Diário do Paraná. Era um espaço onde ilustradores, cartunistas, escritores e poetas expunham suas idéias e divulgavam seus trabalhos com humor e descontração. Foi criado em 1976, com design gráfico e direção de arte sob responsabilidade de Miran, passou a ser editado pela Fundação Cultural de Curitiba, entre 1978 e 1982, ano em que foi extinto.

O projeto gráfico valorizava a ilustração, juntamente com uma presença marcante do contraste entre o preto e o branco, ilustração e tipografia interagindo com espaços vazios na página, planejados para privilegiar a relação entre o texto e as imagens. Ainda segundo o autor, essas características de design, como a acuidade com a tipografia e a caligrafia, criaram uma forte identidade que percorre não só revista Gráfica como todo o trabalho do designer. Esse projeto transita internacionalmente, trazendo contatos com importantes ilustradores e designers gráficos, o que mais tarde seria de extrema importância para a criação da Gráfica e de sua editoria.

Paralelamente às edições de O Raposa, Miran organizou em Curitiba, no início dos anos de 1980, as exposições “Grafia”, apresentando produções do design gráfico, especialmente tipográficos, na Galeria Acaiaca, que incluía autores mundialmente conhecidos. A “Grafia”, como afirma Straub, traz a percepção do pouco diálogo entre a produção internacional e o design gráfico nacional, ainda a dificuldade de acesso a publicações da área. Assim, analisando situação e mercado, em 1983 Miran cria a revista Gráfica e publica o seu primeiro número, que surge em forma de catálogo, para documentar os trabalhos presentes nas mostras.

Devido aos altos custos de produção, a revista inicialmente foi editada sem periodicidade definida, mas apesar disso, já se tornava conhecida e respeitada internacionalmente. Em

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1987, passou a ser publicada 4 vezes ao ano, nesta época, já no número 18, ingressam na sociedade Carlos Ferreira e Orestes Woestenhoff, como responsáveis pelas áreas comerciais e administrativas da editora e em 1990, com o reconhecimento e prestígio internacional, passa a ser distribuída na Europa pela editora suíça Rotovision. Novas crises financeiras, em 1994, comprometem a periodicidade e no ano seguinte, com a saída dos sócios, Miran volta a ter controle total sobre a revista e publica os números 43/44, 45, 46, 47, 48, 50 e 51 com tiragens reduzidas, a única exceção consiste no número 49, editada em 1999. Os números 52 e 53 contaram com a parceria da Editora Escala, a 52 foi publicada com uma das maiores tiragens de toda a história da Gráfica. Já os números de 54 a 59 foram realizados em parceria com a Posigraf, nesta fase a revista tem periodicidade bimestral e apresenta mudanças no conteúdo e no layout, com artigos mais extensos.

Com objetivo de divulgação da produção no campo do design, a pauta da Gráfica propõe artigos em portfólios, com intenção de mostrar de forma clara as principais características dos trabalhos em textos breves, que apresentam o designer e suas obras. Se as revistas são criadas na interação entre redatores e designers, no caso da Gráfica, esse é um ponto a ser destacado, já que Miran acumula os dois papéis. Seus critérios de seleção buscam privilegiar o talento individual, os trabalhos de qualidade gráfica e a inovação, visando padrão internacional, tanto na pauta como em seu projeto gráfico. Ao todo, a Gráfica publicou trabalhos voltados à tipografia, fotografia, ilustração, design gráfico, design de produtos, arquitetura. Passeando por esses temas de forma a privilegiar um ou outro em determinados números.

Tipografia: Mutabilidade, Diálogo, Identidade

Interagindo com a proposição de sua pauta editorial, o projeto gráfico tem como princípio valorizar os trabalhos publicados, mas nunca permite uma percepção ausente de atitude ou posição frente ao design. Miran em entrevista13 esclarece a opção pelo que ele próprio define como “design clássico”: Criei um layout que me obriga a ser invisível. Não posso "enfeitar o Pavão", exibindo o meu malabarismo gráfico (como faz David Carson) e os meus maneirismos. Quem deve aparecer são os meus convidados. Procuro dar um toque de elegância, tudo de forma discreta. Gosto de brincar com os espaços em branco, de "estourar" determinada foto ou ilustração dando um "corte" quase pessoal, mas não exagero.

O projeto gráfico é marcado pelo alto contraste entre o preto e branco para os elementos gráficos, que traz unidade às edições e representa uma das características marcantes das soluções gráficas de Miran. A unidade também é percebida na interação entre os elementos impressos e os espaços vazios nas páginas, no recurso a uma estrutura guia que orienta a articulação dos elementos no espaço gráfico, no rigor com a seleção e espacialização da tipografia que hierarquizam o conteúdo textual, na constância do formato da revista e solução para a capa. O design gráfico inicial foi recebendo modificações, ajustes, atualização ao longo do tempo, sem que sua essência e identidade se perdessem, a sensibilidade em

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relação à tipografia – design do tipo, composição, espacialização, articulações – é protagonista desse processo.

O logotipo da publicação apresenta caráter mutável nos primeiros 28 números, com variações na forma tipográfica, posição no campo gráfico e escala14, composto em Garamond, Helvética, Futura ou uma fonte caligráfica traçada pelo próprio designer, entre outras. Ainda que o melhor reconhecimento da publicação se dê através da relação precisa entre o nome, o design do nome e o conteúdo da revista, afirmar que essas alterações dificultassem a identificação por parte do seu leitor não seria pertinente: um público específico, que compreende a linguagem visual e reconhece os procedimentos que caracterizam uma série. Além disso, a constância do formato e a ênfase clara dada à imagem de uma obra trazida do interior da revista ou realizada por convidados, conferem força ao conjunto, propondo um jogo entre unidade no todo e singularidade para cada exemplar. Esse recurso não é desconhecido, no período, pelas revistas de design, como referência, citada pelo próprio autor do projeto, aproxima-se da Graphis. No entanto, a partir da Gráfica 29 editada em 1988, essa decisão de projeto adotada para os primeiros 28 números é repensada e passa a se configurar como um padrão. O nome agora é apresentado em uma tarja localizada na margem superior da capa, composto com a fonte Futura extra bold e em caixa alta, designado ainda para um segundo olhar. Em 1990 há novamente uma modificação no design do tipo, permanecendo entretanto o peso gráfico. A marca da revista passa a ser composta em Gothic-Gráfica, projetada por Miran a partir de uma fonte de madeira desenhada em 1838 por George Nesbitt. Essa mesma fonte receberá formato digital por Denis-Ortiz Lopez, em 1993, recebendo o nome de Smokler. Apesar das reticências quanto ao leve achatamento das formas arredondadas do O, G, Q, S, Miran passa a usá-la, é, atualmente, a tipografia que dá forma ao nome em todas as capas da Gráfica.

Gráfica 54, primeira e quarta capas, design do logotipo com a fonte Smokler.

Uma estrutura definida em duas colunas por página percorre toda o design gráfico da revista, articulando os elementos textuais e não textuais, ainda que de forma flexível, atento ao ritmo seqüencial, com deslocamentos e redimensionamentos guiados pela formatação das obras publicadas, principalmente nos números mais recentes. Outra característica constante é a organização do espelho na abertura dos artigos15: na página par posicionam-se titulação, início do texto e frequentemente uma fotografia do autor tratado, sempre

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impressos em preto, já a página ímpar traz em evidência a reprodução de um de seus trabalhos. Se a revista prioriza portfólios, essa ênfase fica assim esclarecida. Entretanto, mesmo sem “malabarismos” é no tratamento com a tipografia que o projeto vai mostrar toda a sua acuidade.

O contraste entre formas constrói, basicamente, a identidade tipográfica da revista, encontram-se sempre presentes duas famílias em todas as edições, uma serifada e outra sem serifa, mas na seleção das fontes específicas, nas soluções gráficas que articulam suas variações, nos detalhes de composição que singularizam as transformações no tempo, o olhar se detém.

Nos primeiros números, o corpo de texto é composto em Garamond normal, caixa baixa, justificado, espaçamentos entre letras e palavras, entrelinhas, relação entre corpo e comprimento de linha, favorecendo legibilidade e leiturabilidade. Um grande contraste de peso e forma marca a abertura dos artigos com o título grafado em caixa alta e baixa, parte na versão itálica e parte em Helvética medium ou bold, com freqüência distinguindo nome e sobrenome. Contraste ainda mais acentuado quando justaposta às formas geométricas da Futura extra bold em caixa alta, como nos número 20-21 e 23, as origens caligráficas e a organicidade da Garamond evidenciam-se ainda mais. Note-se a presença e destaque, nas edições 6, 20-21, 23, da expressão do traço caligráfico na assinatura pessoal do autor tratado, recurso experimentado em um dos artigos da primeira edição e que é trazido novamente para o projeto, em outra configuração de layout. O texto abre em duas colunas, posicionado abaixo da metade inferior da página, com parágrafos sinalizados por recuo à direita. Na abertura da Gráfica 25, edição especial sobre as manifestações femininas no design, o texto passa a ocupar uma coluna e a primeira linha do texto segue a largura total da malha gráfica, impressa em porcentagem do preto, em leve contraste. O destaque dado à primeira linha será incorporado ao projeto, na Gráfica 27, reaparece abrindo o texto, em contraste aumentado, de forma e peso, composta em Futura bold caixa alta e impresso em preto, o texto segue composto em Garamond, ocupando somente a coluna da direita. A constante e gradual transformação do design sempre está atenta aos detalhes tipográficos, o projeto é repensado, experimentando insistentemente outras variações guiadas por uma concepção base.

Durante a década de 1990, certamente a partir do número 29, aparece uma interferência na legibilidade e leiturabilidade, o corpo do texto passa a ser composto todo em Futura light, caixa alta, justificado, com espaçamento aberto entre letras, equilibrado com os espaços entre palavras, sem recuo de parágrafos. Nota-se a constante atitude do designer frente à questão tipográfica, aqui a tipografia não rivaliza com os trabalhos publicados, já que apresenta peso gráfico mais leve, mas também não passa despercebida. Essa solução se mantém até a Gráfica 35, onde a Garamond passa a ser a fonte de texto, porém na mesma composição. Outra alteração importante ocorre também na abertura dos artigos com a diminuição da extensão da primeira linha, que é trazida para a largura da única coluna, ainda em destaque, a inclusão de capitular extra bold, em primeiro plano, reposicionamento do título, alinhado à coluna, eliminando os deslocamentos à esquerda. Essa configuração geral da abertura permanece até os números atuais, mas o corpo de texto volta a ter

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composição com princípios pautados pela legibilidade, em Franklin Gothic light, a partir da Gráfica 52, alguns detalhes, como o editorial, em Bodoni, fonte eleita para os textos na Gráfica 59 e sua itálica substitui a Garamond já na Gráfica 54, de julho/agosto de 2005. A Fudoni, fonte criada por Max Krisman, a partir da fusão da Futura com a Bodoni, também aparecerá em numerais.

Gráfica 30. Abertura de artigo, contraste entre Garamond itálica e variações da Futura, corpo do texto composto em Futura light, caixa alta.

Gráfica 35. Abertura de artigo,contraste entre variações da Garamond e da Futura, corpo do texto composto em Garamond caixa alta.

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Gráfica 35. Dupla de artigo, estrutura em duas colunas por página, texto em Garamond caixa alta.

Além das transformações graduais e freqüentes ao longo da trajetória da revista, o design gráfico estabelece diálogos visuais entre edições, como entre o número 49 e o 52, ou com a manifestação de algum designer publicado, como no caso da Gráfica 49, que apresenta o portfólio de David Carson. Neste número, ilegibilidade, sobreposições, ruídos visuais, contaminam não só o artigo dedicado a esse designer, mas ainda outro, alternados às soluções projetuais então estabelecidas, como a frisar essa abertura de diálogo e ao mesmo tempo marcar uma identidade. A conversa chega ao logotipo presente em capas internas, interessante notar essa proposição, nas externas está presente a marca padrão da revista. Várias soluções e elementos gráficos gerados nessa experimentação irão reaparecer na Gráfica 52, e que geram outras, como a composição das páginas duplas que separam seções, introduzidas agora, e que reaparecerão, novamente transformadas, mas recorrendo a essa memória visual, na Gráfica 59. Mirán acaba constituindo algo como um arquivo visual, uma espécie de banco de dados, que permanece na memória tanto do designer quanto do leitor, para serem restabelecidos e percebidos de outra forma e em outro contexto.

Gráfica 49. Expediente e sumário.

Gráfica 49, dupla do artigo sobre David Carson.

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Gráfica 52, expediente.

Gráfica 52, abertura de seção.

Gráfica 52, abertura de artigo, contraste entre a fonte Smokler, Garamond itálica, e corpo do texto composto em Franklin Gothic.

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Gráfica 59, separação de seção, texto em Bodoni.

Gráfica 59, abertura de artigo, contraste entre a fonte Smokler e variações da Bodoni.

Gráfica 59, corpo do artigo, texto composto em Bodoni.

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O design gráfico editorial da revista Gráfica orienta-se essencialmente pela legibilidade e comunicação, percorrer as edições desde o início da publicação possibilitou perceber um processo orgânico e contínuo, inquieto por transformações, que incorpora mudanças ora sutis, outras mais evidentes, mas de forma gradativa, refletindo o repensar das escolhas em cada novo número, sem deixar desaparecer por completo sua “natureza nuclear”, ou diria, seu tema visual geral.

Entretanto, essa orientação, nunca fez da Gráfica um projeto “transparente”. Mesmo sendo criado com um posicionamento “neutro” do designer, em nenhum momento mostra-se completamente invisível, e isso, em grande parte, deve-se à construção minuciosa das relações tipográficas, que atua como catalisadora nas transformações, propõe diálogos, traz identidade.

REFERÊNCIAS

1

LESLIE, Jeremy. Novo design de revistas 2. Barcelona: Gustavo Gili, 2003.

2

Idem, p.6.

3

Ibid.

4

LESLIE, Jeremy. Nuevo diseño de revistas . Barcelona: Gustavo Gili, 2000.

5

Idem, p.110.

6

VILLAS-BOAS, André. Utopia e Disciplina. Rio de Janeiro: 2AB, 1998. Sobre os princípios da Escola Suíça, ver RUDER, Emil. Typogaphy. Zurich: Arthur Niggli, 2001 e MÜLLER-BROCKMANN, Josef. Grid Sistems. Sulgen: Arthur Niggli, 1996.

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7

Idem, p. 90.

8

Idem, p. 116.

9

GRUSZNSKI, Ana Cláudia. Design Gráfico: do invisível ao ilegível. Rio de Janeiro: 2AB, 2000.

10

Idem, p. 88.

11

Cf. entrevista dada a Daniele Rodrigues de Oliveira, por email, em abril de 2007.

12

STRAUB, Ericson. Gráfica: a vida, a vida... e a vida da mais importante revista de design do Brasil. Revista abcDesign, Curitiba, n. 1, p. 4-15, nov. 2001.

13

Cf. entrevista dada a Daniele Rodrigues de Oliveira, por email, em abril de 2007.

14

Ver STRAUB, Ericson. Gráfica: a vida, a vida…e a vida da mais importante revista de design do Brasil. Revista abcDesign, Curitiba, no. 1, p. 4-15, nov. 2001, onde estão reproduzidas todas as capas da Gráfica até o número 52.

15

Note-se que a Gráfica 1, primeira edição, tem projeto distinto, apresenta-se mais como catálogo da exposição Grafia.