O EFEITO TRANSFORMADOR DA MEDIAÇÃO EM...
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REVISTA ELETRÔNICA DÍKE Δίκη vol. 1, nº 1 (jan/jul 2011)
O EFEITO TRANSFORMADOR DA MEDIAÇÃO EM BUSCA DA SUPERAÇÃO DA CULTURA DO LITÍGIO EM DIREÇÃO A
UMA CULTURA DE PAZ1
Vera de Miranda Firmeza
Advogada e aluna do curso de Especialização em Direito Constitucional da Escola Superior da Magistratura do Estado do Ceará (ESMEC)
“Não odeies a teu inimigo, porque se o fazes, és de algum modo seu escravo”
(Jorge Luiz Borges, Elogio da Sombra)
RESUMO
Aborda as relações humanas e sua conflituosidade, sob uma ótica transdisciplinar. Apresenta os fundamentos filosóficos da mediação, discute a sua prática à luz da Teoria do Agir Comunicativo (Habermas) e da Maiêutica. Compara as diversas formas de gestão de conflitos, discutindo o papel do mediador e o efeito transformador da mediação na vida das pessoas e no cotidiano das relações.
1 AS RELAÇÕES HUMANAS NA GÊNESE DOS CONFLITOS
As relações intersubjetivas, que são de natureza familiar, trabalhista,
ambiental, empresarial, dentre outras, podem trilhar caminhos diversos, dependendo
1 Artigo conclusivo do Curso de Especialização em Direito Constitucional da Escola Superior da Magistratura do Estado do Ceará sob a orientação do prof. Ms. Flávio José Moreira Gonçalves.
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da capacidade de entendimento entres as partes. Um desses caminhos pode
resultar em um conflito que não necessariamente possui apenas aspectos negativos,
haja vista a possibilidade da reavaliação de conceitos e valores dos envolvidos,
permitindo o seu amadurecimento moral, como afirma Muszkat2, segundo a qual,
“do ponto de vista constitutivo, o conflito propicia condições de crescimento e
transformação sempre que, por intermédio da flexibilização do desejo, atinge-se a
noção de alteridade”.
Os conflitos dos quais se originam os litígios estão presentes em todos os
tipos de relacionamentos; segundo Fisher et al.3, “o conflito é uma indústria em
crescimento”, uma vez que este cresce proporcionalmente ao desenvolvimento e
amadurecimento do ser humano.
Com o século XXI, surge um novo mundo, um novo ser humano e o que
delimita esse marco na história é a mudança na forma de agir e de pensar da
humanidade. Como bem evidencia Acland4, “a mudança origina-se na mente das
pessoas e repercute na mente de outras”. Como o indivíduo é um ser em constante
metamorfose de idéias, como também um ser singular, torna-se impossível controlar
sua ideologia.
Todavia Muszkat defende a necessidade de o ser humano reconhecer a
existência do outro como um ser diferente, mas também individual, com sentimentos
e valores próprios, propiciando, a partir desse reconhecimento, a revisão de suas
posições, a prática de possíveis reparações e acordos.
Contudo, como nem todos os indivíduos possuem essa visão e as mudanças
que o acompanham afetam os relacionamentos interpessoais, faz-se necessário o
2 MUSZKAT, M. E. Guia prático de mediação de conflitos em famílias e organizações. São Paulo: Summus, 2005, p. 27.
3 FISHER, R.; KOPELMAN, E.; SCHNEIDER, A. K. Mas allá de maquiavelo. Buenos Aires: Granica, 1996, p. 15.
4 ACLAND, A. F. Cómo utilizar La mediación para resolver conflictos em lãs organizaciones. Barcelona: Paidós, 1993, p. 120.
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gerenciamento dos conflitos. Conforme assinala Fiorelli5, esse processo engloba
identificá-lo, compreendê-lo e interpretá-lo, utilizando-o para o bem-estar do
indivíduo e da sociedade.
2 FORMAS DE GESTÃO DOS CONFLITOS
Muitas vezes, as pessoas, além de não conseguirem perceber que estão em
conflito por total desconhecimento de seus sentimentos, ainda podem incorrer no
erro de, identificando-o, nada saber fazer, acomodar-se ou procurar um método que
pode ser adequado ou não àquela prática.
Surgem, dessa forma, métodos produtivos na composição de diferenças
alicerçados pela prática do diálogo que facilitam e favorecem a vida em comum.
Esses métodos de gestão de conflitos podem ser consensuais ou não.
No caso dos métodos não consensuais, a decisão está na mão de um
terceiro (juiz e/ou árbitro) que tem a responsabilidade de determinar o que as partes
devem ou não fazer. Constituem esse rol a arbitragem e o método tradicional da
busca ao Judiciário.
Já nos métodos consensuais, as partes buscam uma solução através do
diálogo e são cooperativos por excelência. Nesse procedimento, não há imposição
de um terceiro. Aqui estão inseridas a negociação, a conciliação e a mediação.
Segundo Fiorelli6:
A arbitragem, a negociação, a conciliação e a mediação são conhecidas por muitos pela sigla “MESC”, que significa “Métodos Extrajudiciais de Solução de Conflitos”. Todavia, nem todos eles são tão extrajudiciais assim, já que o Poder Judiciário se vale de alguns em seus processos. Exemplo disso, o projeto “Conciliar”, levado a efeito por incentivo do Conselho Nacional de
5 FIORELLI, J. O. Mediação e solução de conflitos: teoria e prática. São Paulo: Atlas, 2008.
6 FIORELLI, J. O. Mediação e solução de conflitos: teoria e prática. São Paulo: Atlas, 2008, p. 51.
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Justiça. A própria “mediação” vem sendo praticada no âmbito do Poder Judiciário, não pelos juízes, mas por mediadores credenciados e com experiência no trabalho.
De acordo com a Lei 9.307/96, a arbitragem constitui um método adversarial
em que a decisão compete a um terceiro escolhido pelas partes, sendo tal decisão
acatada por elas, uma vez que o laudo arbitral possui força de título executivo
judicial e se sujeita à apreciação pelo Judiciário apenas nos casos de nulidade
previstas em lei, sendo, portanto, indicada em conflitos em que a solução necessita
de conhecimentos técnicos. Tal método, contudo, não é imposto às partes, salvo
quando existir “cláusula compromissória” ou o “compromisso arbitral” pactuado pelos
envolvidos. É assegurado o direito de ampla defesa, com a participação de
advogados.
A negociação é um procedimento no qual as partes resolvem seus conflitos
sem a presença de um terceiro. Diferentemente dessa, a conciliação e a mediação
são realizadas a partir da intervenção de um terceiro sem a imposição da resolução
do conflito.
A conciliação constitui um método cooperativo em que os envolvidos entram
em acordo a partir de concessões mútuas, requisito fundamental para o sucesso
desse procedimento. Nela o conciliador possui a capacidade de interferir e
questionar os litigantes.
O objetivo da conciliação é findar a desavença, sem prestigiar, todavia, os
interesses ocultos das partes, sendo o envolvimento emocional passageiro. Esse
instituto é adequado nas situações em que não se estabelecem relações de
continuidade entre os integrantes do litígio.
3 MEDIAÇÃO
Feitas essas considerações, passemos à conceituação do tema em
comento, objeto de estudo do presente trabalho. Mediação é o processo de
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facilitação de diálogo assistido, no qual um terceiro imparcial, com competência
técnica e eleito pelas partes, auxilia na identificação de interesses comuns visando à
construção de acordos.
Como aduz Sales7, a mediação é o método mais indicado para as
desavenças ocorridas em relações continuadas, cuja preservação no tempo é
importante, como os relacionamentos familiares, empresariais, ambientais,
trabalhistas ou de vizinhança, porque enseja o restabelecimento da convivência
através da construção de um consenso, preservando as diferenças entre os
envolvidos.
Gerenciar bem um conflito é aprender a lidar com ele e substituir o rancor
pelas decisões sensatas, demonstrando sabedoria. Eis o fundamento filosófico da
mediação como preceitua Fiorelli8: “a mediação tem por fundamento filosófico, o
desenvolvimento dos mediandos, para que estes possam lidar com as situações
conflituosas de suas vidas.”
Não obstante a posição de Fiorelli, mais adiante, a Teoria da Ação
Comunicativa (Habermas) e a Maiêutica (Sócrates) serão abordadas como
fundamentos filosóficos das técnicas autocompositivas.
Como informa Muszkat9, o objetivo da mediação é buscar soluções pacíficas
entre os envolvidos no conflito, para obter a satisfação das partes, por meio do
processo de transformação positiva desenvolvida através do autoconhecimento.
Com apoio em Sales10, o fundamental na mediação é a educação das
pessoas para que possam gerir aquele e futuros conflitos com temperança e bom
7 SALES, L. M. de M. Estudos sobre a efetivação do Direito na atualidade: a cidadania em debate. Fortaleza: Universidade de Fortaleza, 2005.
8 FIORELLI, J. O. Mediação e solução de conflitos: teoria e prática. São Paulo: Atlas, 2008, p. 61.
9 MUSZKAT, M. E. Mediação de conflitos: pacificando e prevenindo a violência. São Paulo: Summus, 2003.
10 SALES, L. M. de M. Mediação familiar: um Estudo Histórico-Social das Relações de Conflitos nas Famílias Contemporâneas. Fortaleza: Expressão Gráfica e Editora Ltda., 2006.
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senso ou até evitá-los. Casos correntes em que se enquadram nesse instituto são
de vizinhança e familiar.
O instituto da mediação norteia-se pelo princípio basilar de criar o espaço
para acolher diferenças, além de paradigmas importantes como o caráter voluntário;
o poder dispositivo das partes, respeitando o princípio da autonomia da vontade,
desde que não contrarie os princípios da ordem pública; a confidencialidade do
processo; a credibilidade e a imparcialidade do mediador; a competência do
mediador; a diligência do procedimento; a boa-fé e a lealdade das práticas
aplicadas; a simplicidade tanto na linguagem, quanto nos procedimentos, de modo
que atenda à compreensão e às necessidades dos participantes, dentre outros,
conforme Fiorelli11.
Outrossim, como a mediação tem como vantagem um baixo custo, pode ser
amplamente utilizada e também ser aplicada antes, durante ou após o curso de uma
resolução judicial.
O estudo adequado da mediação passa por entre as várias epistemologias,
permitindo uma aproximação maior dos múltiplos e complexos fenômenos afetivos e
sociais, os quais a mediação encampa, irredutíveis ao conhecimento de uma única
disciplina.
Como assina Muszkat12, “a conclusão é que a mediação se define como
uma transdisciplina voltada para o estudo da pacificação dos conflitos nas inter-
relações íntimas e sociais”.
É amparada constitucionalmente pelos princípios explícitos do acesso à
justiça e pacificação social e pelo princípio da dignidade da pessoa humana, como
também está prevista no preâmbulo e em diversos artigos do texto da Constituição
de 198813.
11 FIORELLI, J. O. Mediação e solução de conflitos: teoria e prática. São Paulo: Atlas, 2008.
12 MUSZKAT, M. E. Guia prático de mediação de conflitos em famílias e organizações. São Paulo: Summus, 2005, p. 14.
13 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em
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Os direitos sociais e individuais, bem como a liberdade, segurança e bem
estar do cidadão estão assegurados, ficando, portanto, o estado vinculado à
instituição da paz, uma vez que, nesse âmbito, ela só predomina onde há
harmonização dos conflitos da sociedade.
A mediação é contemplada quando a Carta Magna conceitua o Estado
Democrático de Direito como uma sociedade fraterna que busca a solução pacífica
das controvérsias, sendo, portanto, o método mais adequado para promoção do
bem-estar social.
Vale salientar que não existe o melhor método de solução de litígios, ou que
um método seja melhor que o outro. Cada qual possui especificidades que os
enquadram para este ou aquele tipo de conflito. Porém, o que distingue a mediação
dos demais métodos é a presença dos conteúdos emocionais que são trabalhados
ao longo do processo, com o propósito de transformar divergências em
convergências, não necessariamente em concordâncias, resultando num maior
compromisso das partes em cumprir o acordado.
4 O MEDIADOR
O Brasil mobiliza-se para encampar a mediação em ampla escala e integrar
a comunidade universal adepta desse instituto. Daí a importância de conferir
uniformidade ética aos parâmetros norteadores para servir como guias éticos para
mediadores de todos os contextos de prática. Atendem a três objetivos primários:
guiar a conduta dos mediadores, informar as partes mediadas e promover confiança
pública na mediação como processo de resolução de controvérsias.
A partir desses parâmetros norteadores éticos universais, passa-se a refletir
e construir princípios próprios. Na mediação, é necessário que haja autonomia da
vontade; imparcialidade; conflitos de interesses; competência; confidenciabilidade;
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 10 Fev. 2011, 14:51:30.
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qualidade do processo; propaganda e promoção; honorários e outras cobranças;
desenvolvimento da prática da mediação.
Na visão aguçada de Almeida14:
O convite para considerarmos norteadores éticos universais para a prática da mediação advém especialmente de seu caráter transdisciplinar. Ela transcende o direito e a psicologia, especialmente, e se constrói graças ao aporte de muitos outros saberes – Filosofia, Sociologia, Antropologia, Teorias sobre comunicação humana e sobre Negociação. Por sua natureza transdisciplinar e por sua coerente não restrição à profissão de origem de seus praticantes, os mediadores, vale à pena identificarmos guias éticos unificados por seus princípios, normas e valores. Princípios, normas e valores que motivem, disciplinem e orientem sua prática e seus praticantes.
O mediador é um terceiro neutro e imparcial, com competência técnica,
eleito pelas partes para facilitar o diálogo entre duas ou mais pessoas e auxiliar na
construção de acordos mutuamente satisfatórios.
Qualquer pessoa pode ser um mediador, não precisa sequer possuir curso
superior, deve, sim, ser capacitado para a mediação. A competência técnica diz
respeito à capacitação do mediador, que envolve conhecimentos nas mais variadas
áreas, haja vista a interdisciplinaridade da mediação. Segundo Sousa15, “o
mediador não atua como advogado, nem como psicólogo, nem como assistente
social; atua como um mediador. Sua atividade pode até ser considerada um novo
tipo de profissão”.
Conforme anota Sales16, o mediador é treinado para a função primordial de
facilitar a comunicação entre as partes, possibilitar escuta, fala e questionamento,
assim como provocar reflexões e estimular uma postura ativa nos mediandos.
O mediador pode citar no seu discurso de abertura os aspectos elencados
14 ALMEIDA, T. Podemos Pensar em Norteadores Universais para a Conduta de Mediadores?. Disponível em:< http://www.mediare.com.br/08artigos_04condut_med.htm>. Acesso em: 10 Fev. 2011, 14:52:30.
15 SOUSA, L. A. A utilização da Mediação de Conflitos no Processo Judicial. Disponível em:< http://bdjur.stj.gov.br/xmlui/bitstream/handle/2011/21276/utilizacao_mediacao_conflitos_processo.pdf?sequence=1>. Acesso em: 10 Fev. 2011, 14:55:30.
16 SALES, L. M. de M. Mediare: um guia prático para mediadores. 2 ed., rev. atual. e ampl. Fortaleza: Universidade de Fortaleza, 2004.
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nos pressupostos de argumentação propostos por Habermas17, orientando as
partes sobre a importância desses fundamentos, para que possam desenvolver
confiança recíproca.
Nos ensinamentos de Almeida18:
Num processo de Mediação os diálogos facilitados pelo mediador incluem a argumentação e a contra-argumentação, instrumentos estes propiciadores de entendimento e de desentendimentos, mediadores tem considerado útil incluir como parâmetro de análise e de trabalho os pressupostos de argumentação elencados por Habermas19.
Valer-se dos paradigmas permite restaurar o diálogo fragilizado pela
subjetividade do estar em conflito e direcionar a comunicação para atos que
possibilitem a construção de um consenso.
A inserção desses parâmetros na sessão de abertura enseja resgatá-los
quando violados a partir de um acordo prévio realizado com os envolvidos.
Baseado na Teoria da Verdade, Habermas20 elenca três quesitos
preliminares: 1) como saber o que é verdadeiro ou falso. O autor afirma que, “a
verdade é a pretensão válida, aquela vinculada com os atos da fala, ou seja,
17 Jürgen Habermas é um filósofo alemão que desenvolveu teorias relativas à pragmática da comunicação humana. Ele acredita que existem pressupostos de argumentação inerentes à comunicação humana e que eles coordenam o comportamento através da linguagem. Um dos autores dedicados à filosofia analítica da linguagem, Habermas nos convida, através de sua Teoria da Ação Comunicativa, a incluir a possibilidade de uma ética discursiva universal.
18 ALMEIDA, T. Como a Teoria da Ação Comunicativa de Jürgen Habermas pode auxiliar mediadores no trabalho de facilitar diálogos. Disponível em < http://www.mediare.com.br/08artigos_05como_teoria.html>. Acesso em: 10 Fev. 2011, 14:57:30.
19 Esses pressupostos integram padrões de comportamento e referem-se à: a) Não-contradição, similaridade e manutenção do significado das palavras. Cada um de nós deve manter-se coerente ao expressar-se verbalmente durante uma interlocução, cuidando, inclusive, para que a um mesmo termo ou expressão não sejam atribuídos significados diferentes em um mesmo diálogo; b) Autenticidade e adição de tópicos: prevê que cada dialogante deve afirmar somente o que acredita e aditar tópicos à conversa quando os considera razoáveis e pertinentes ao que está sendo discutido; c) Competência, questionamento, introdução de novas asserções, auto-expressão e não-coerção: prevêem que cada interlocutor deva ter competência para participar de uma discussão, possibilidade de questionar uma asserção e de introduzir novas, oportunidade de expressar atitudes, desejos e necessidades e direito de não sofrer coerção.
20 HABERMAS, J. Teoria de La acción comunicativa: complementos y estúdios prévios. Madrid: Cátedra, 2001, p. 120.
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fazendo uso de orações, confirma-se o que se está afirmando” p120. Para ele, a
racionalidade deve ser desenvolvida com o objetivo de evitar a contradição. 2) O
segundo quesito trata das proposições da verdade que podem ser questionadas no
contexto da ação. 3) Como se relacionam as nossas afirmações com os objetos da
nossa experiência. As experiências apóiam a sua afirmação, entretanto, está só será
considerada verdadeira quando for fundamentada.
A Teoria da Ação Comunicativa tem a finalidade de apontar e restaurar a
possibilidade de se chegar a um consenso entre os participantes, sendo os mesmos
capazes de responder por suas ações, bem como buscar esse acordo, a partir de
manifestações oriundas da fala. Segundo Habermas21:
a inteligibilidade da expressão a verdade do conteúdo proporcional afirmado, a retidão da questão se referindo a um contexto regulamentar reconhecido, a veracidade do emissor no que tange as intenções que expressa.
O mediador precisa também, manter-se imparcial e neutro mesmo em
situações que mobilizem muita emoção ou provocam identificação com as partes.
Conforme Almeida22, “em função de nossa natureza humana, não acreditamos que
a neutralidade seja passível de realização uma vez que questionamento do
mediador é feito a partir do repertório que sua visão de mundo e paradigmas
possibilitam”.
Já Fiorelli23 posiciona-se sobre outro aspecto da neutralidade do mediador:
Não se acuse o mediador de neutralidade- ainda que inúmeros textos e livros a apregoem como uma vantagem da mediação! Ela não acontece, porque o mediador promove o equilíbrio entre os litigantes e, ao fazê-lo, necessariamente deixa-se de lado, para propiciar condições ao mais fraco de enfrentar as opressões do mais poderoso. O mediador não se refugia na confortável neutralidade para escapar da árdua missão de equilibrar.
21 HABERMAS, J. Teoria de La acción comunicativa: complementos y estúdios prévios. Madrid: Cátedra, 2001, p. 208-209.
22 ALMEIDA, T.; NETO, A. B. Como mediadores e advogados podem atuar colaborativamente na mediação baseada nos interesses e nas necessidades das partes. Disponível em: <http://www.mediare.com.br/08artigos_03med_adv.htm .> . Acesso em: 11 Fev. 2011, 23:12:25.
23 FIORELLI, J. O. Mediação e solução de conflitos: teoria e prática. São Paulo: Atlas, 2008, p. 149-150.
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Saber identificar os reais interesses das partes é tarefa do mediador, por
isso deve estar atento ao que existe de comunicação verbal e não verbal entre os
mediandos, aos discursos que auxiliam a identificar interesses comuns divergentes e
convergentes, aos deslizes de qualquer natureza entre os dialogantes financeiros,
cognitivos, informativos, emocionais, fomentando a desconstrução de impasses, ao
diálogo produtivo ou à construção de soluções, para bem conduzir o processo.
Ademais o mediador deve fazer jus ao pagamento de seus honorários, ao
término da sessão, mesmo que o procedimento não tenha atingido o objetivo maior,
o consenso, bastando que tenha facilitado o diálogo produtivo entre os envolvidos e,
quem sabe, possam realizar o acordo posteriormente àquela sessão, mas em
decorrência do canal aberto pelo mediador no sentido de entenderem-se sozinhos.
O mediador deve utilizar-se de técnicas e procedimentos na dinâmica do
processo de maneira correta e ter cuidado para não se envolver (fazer auto análise)
na interação do conflito, pois existe uma interdependência interativa entre o sujeito e
o objeto da intervenção, aquele que a pratica e o conjunto de técnicas e
procedimentos.
Os fatos ocorridos durante a sessão de mediação são sigilosos e
privilegiados. Isso contribui para que esse método seja mais adequado para
determinados casos em que não se queira publicidade. Aqueles que participarem do
processo devem obrigatoriamente manter o sigilo sobre todo o conteúdo a ele
referente, não podendo ser testemunha do caso, respeitado o princípio da
autonomia da vontade das partes nos termos por elas convencionados, desde que
não contrarie a ordem pública.
Diante do compromisso de manter o sigilo e do que foi exposto
anteriormente, depende a credibilidade da mediação e do respeito que o mediador
conquiste desenvolvendo a atividade com competência fundamentado por princípios
éticos. O mediador deve orientar sua conduta ética não só perante o código que o
rege, como também observar as regras dos demais códigos (de advogados,
psicólogos, entre outros)24.
24 CONIMA. Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem. Disponível em
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A mediação, por acolher a diversidade e a transversalidade, é o método
eleito como modelo dos princípios que regem os direitos humanos. O mediador, que
defende a verdade e a pacificação é o agente de transformação social, no sentido de
fomentar a cultura de paz. Como bem acentua Fiorelli25, “o mediador destaca-se
pelo senso de equidade: desloca-se com habilidade entre as imposições da ética, da
moral, da justiça e do bem-estar dos envolvidos, em um movimento em que mescla
arte, filosofia e técnica”.
5 O EFEITO TRANSFORMADOR DA MEDIAÇÃO NO COTIDIANO DAS RELAÇÕES
A prática da mediação estimula benefícios positivos entre os envolvidos.
Através da reflexão conduzida pelo mediador, num jogo de escuta e formulação de
perguntas, remetendo as partes a uma viagem interior na busca inesgotável do
autoconhecimento, análoga à maiêutica socrática, há uma transformação positiva e,
quem sabe, mudança de posicionamento, visto que aquelas pessoas nunca mais
serão as mesmas.
O método utilizado pelo instituto da mediação é o socrático, de busca da
verdade pela parturição das ideias do espírito, a maiêutica. O diálogo, sempre com
muitas perguntas, embasa o método, com a finalidade de a pessoa extrair de sua
mente o conhecimento verdadeiro. No caso da mediação, há a possibilidade de
alcançar e resolver o conflito real.
Com a mediação, os envolvidos aprendem novas maneiras de se comportar
e a experiência pela qual passaram lhes permite uma nova leitura dos fatos com
habilidade suficiente para gerir aquele e futuros conflitos, transformando-se em
autores e atores da própria vida, e saber conviver em suas relações cotidianas.
< http://www.conima.org.br/etica_mediadores.html>. Acesso em: 10 Fev. 2011, 14:59:30.
25 FIORELLI, J. O. Mediação e solução de conflitos: teoria e prática. São Paulo: Atlas, 2008, p. 150.
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6 Referências
ACLAND, A. F. Cómo utilizar La mediación para resolver conflictos em las organizaciones. Barcelona: Paidós, 1993.
ALMEIDA, T. Como a Teoria da Ação Comunicativa de Jürgen Habermas pode auxiliar mediadores no trabalho de facilitar diálogos. Disponível em <
http://www.mediare.com.br/08artigos_05como_teoria.html>. Acesso em: 10 Fev.
2011, 14:57:30.
ALMEIDA, T.; NETO, A. B. Como mediadores e advogados podem atuar colaborativamente na mediação baseada nos interesses e nas necessidades das partes. Disponível em:
<http://www.mediare.com.br/08artigos_03med_adv.htm .> . Acesso em: 11 Fev. 2011,
23:12:25.
ALMEIDA, T. Podemos Pensar em Norteadores Universais para a Conduta de Mediadores?. Disponível em:<
http://www.mediare.com.br/08artigos_04condut_med.htm>. Acesso em: 10 Fev.
2011, 14:52:30.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso
em: 10 Fev. 2011, 14:51:30.
CONIMA. Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem.
Disponível em < http://www.conima.org.br/etica_mediadores.html>. Acesso em: 10
Fev. 2011, 14:59:30.
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Conflitos nas Famílias Contemporâneas. Fortaleza: Expressão Gráfica e Editora
Ltda., 2006.
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ampl. Fortaleza: Universidade de Fortaleza, 2004.
SOUSA, L. A. A utilização da Mediação de Conflitos no Processo Judicial. Disponível em:<
http://bdjur.stj.gov.br/xmlui/bitstream/handle/2011/21276/utilizacao_mediacao_conflito
s_processo.pdf?sequence=1>. Acesso em: 10 Fev. 2011, 14:55:30.