COMPORTAMENTO DE VARIÁVEIS SOCIAIS NO USO DA LATERAL ... · de variação, de ordem ... em três...

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Web-Revista SOCIODIALETO www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 Volume 2 Número 1 julho 2012 1 COMPORTAMENTO DE VARIÁVEIS SOCIAIS NO USO DA LATERAL PALATAL /λ/: UM ESTUDO SOCIOLINGUÍSTICO EM DOIS CORPORA Josenildo Barbosa Freire(SEEC RN) [email protected] RESUMO: Este artigo é o estudo variacionista da realização do fonema lateral /λ/ em dois dialetos de divisas de Estado: Nova Cruz (RN), localizada na microrregião Agreste Potiguar, e Jacaraú (PB), localizada na microrregião da Mata Paraibana, Litoral Norte do Estado da Paraíba e que são cidades vizinhas limítrofes. Neste sentido, busca-se realizar estudo examinando como três variáveis sociolinguísticas podem exercer influência na realização da variável [λ], em particular sexo, faixa etária e anos de escolarização. Diversas pesquisas sociolinguísticas têm apontado que essas três variáveis influenciam a aplicação de uma regra variável (LABOV, 1966; FREIRE, 2011). Para análise tomam-se os pressupostos teórico-metodológicos da Teoria da Variação (LABOV, 1963). Ao se estudar a realização do segmento /λ/ em dois corpora, acredita-se que os padrões de comportamento das variáveis sociais aqui consideradas podem exibir comportamentos diferentes, uma vez que as relações sociais mantidas pelos falantes envolvidos no estudo podem ser dinâmicas e gerar dependência entre elas. A hipótese central que guia o estudo é a de que as variáveis extralinguísticas adotadas nesse estudo exercem influência durante a realização da variante [λ] nos dialetos estudados Palavras-chave: variação; lateral palatal; variáveis sociais. 1. Introdução Este artigo é o estudo variacionista da realização do fonema lateral /λ/ em dois dialetos de divisas de Estado: Nova Cruz (RN), localizada na microrregião Agreste Potiguar, e Jacaraú (PB), localizada na microrregião da Mata Paraibana, Litoral Norte do Estado da Paraíba e que são cidades vizinhas limítrofes. Neste sentido, busca-se realizar estudo comparativo examinando como três variáveis sociolinguísticas podem exercer influência na realização da variável [λ], em particular sexo, faixa etária e anos de escolarização. Diversas pesquisas sociolinguísticas têm apontado que essas três variáveis influenciam a aplicação de uma regra variável (LABOV, 1966; FREIRE, 2011). Ao se comparar a realização do segmento /λ/ em dois corpora, acredita-se que os padrões de comportamento das variáveis sociais aqui consideradas podem exibir

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COMPORTAMENTO DE VARIÁVEIS SOCIAIS NO USO DA

LATERAL PALATAL /λ/: UM ESTUDO SOCIOLINGUÍSTICO EM

DOIS CORPORA

Josenildo Barbosa Freire(SEEC – RN)

[email protected]

RESUMO: Este artigo é o estudo variacionista da realização do fonema lateral /λ/ em dois dialetos de

divisas de Estado: Nova Cruz (RN), localizada na microrregião Agreste Potiguar, e Jacaraú (PB),

localizada na microrregião da Mata Paraibana, Litoral Norte do Estado da Paraíba e que são cidades

vizinhas limítrofes. Neste sentido, busca-se realizar estudo examinando como três variáveis

sociolinguísticas podem exercer influência na realização da variável [λ], em particular sexo, faixa etária e

anos de escolarização. Diversas pesquisas sociolinguísticas têm apontado que essas três variáveis

influenciam a aplicação de uma regra variável (LABOV, 1966; FREIRE, 2011). Para análise tomam-se os

pressupostos teórico-metodológicos da Teoria da Variação (LABOV, 1963). Ao se estudar a realização do

segmento /λ/ em dois corpora, acredita-se que os padrões de comportamento das variáveis sociais aqui

consideradas podem exibir comportamentos diferentes, uma vez que as relações sociais mantidas pelos

falantes envolvidos no estudo podem ser dinâmicas e gerar dependência entre elas. A hipótese central que

guia o estudo é a de que as variáveis extralinguísticas adotadas nesse estudo exercem influência durante a

realização da variante [λ] nos dialetos estudados

Palavras-chave: variação; lateral palatal; variáveis sociais.

1. Introdução

Este artigo é o estudo variacionista da realização do fonema lateral /λ/ em dois

dialetos de divisas de Estado: Nova Cruz (RN), localizada na microrregião Agreste

Potiguar, e Jacaraú (PB), localizada na microrregião da Mata Paraibana, Litoral Norte

do Estado da Paraíba e que são cidades vizinhas limítrofes.

Neste sentido, busca-se realizar estudo comparativo examinando como três

variáveis sociolinguísticas podem exercer influência na realização da variável [λ], em

particular sexo, faixa etária e anos de escolarização. Diversas pesquisas

sociolinguísticas têm apontado que essas três variáveis influenciam a aplicação de uma

regra variável (LABOV, 1966; FREIRE, 2011).

Ao se comparar a realização do segmento /λ/ em dois corpora, acredita-se que os

padrões de comportamento das variáveis sociais aqui consideradas podem exibir

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comportamentos diferentes, uma vez que as relações sociais mantidas pelos falantes

envolvidos no estudo podem ser dinâmicas e gerar dependência entre elas.

A hipótese central que guia o estudo é a de que as variáveis extralinguísticas

adotadas nesse estudo exercem influência durante a realização da variante [λ] nos

dialetos estudados.

Ressalta-se que em virtude da amplitude da análise, limita-se a examinar os

fatores extralinguísticos relacionados ao processo em questão, ficando os elementos

linguísticos ou estruturais para análises posteriores. A abordagem nessa perspectiva

visa, também, descrever de forma detalhada o comportamento dessas variáveis no

fenômeno em discussão.

Para devida análise, o estudo está assim organizado: em 2, descreve-se o objeto

de estudo e suas variantes linguísticas; em 3, apresenta-se a fundamentação teórica

adotada; em 4, detalha-se a influência das variáveis sociais na aplicação de regras

sociolinguísticas; em 5, descrevem-se a metodologia e os corpora; em 6, provê-se os

resultados de nossa pesquisa e, discute-se as implicações desses resultados para a

análise linguística; e, finalmente, em 7, as conclusões do artigo.

2. Objeto de Estudo

A lateral palatal está incluída em um grupo de segmentos (as líquidas)1 que

aparece tardiamente no sistema fonológico dos falantes devido ao seu caráter bastante

complexo, tanto do ponto de vista articulatório quanto fonológico (MEZZOMO e

RIBAS, 2004).

Para que haja a produção das líquidas é necessária uma oclusão da corrente de ar

na cavidade oral, causada pela língua. Esse fechamento é parcial e possibilita que o ar

saia pelos lados da boca, produzindo, assim, o segmento lateral palatal (MEZZOMO e

RIBAS, op. cit.). Já segundo Silva (2005, p. 34), para que as laterais sejam produzidas,

é necessário que o articulador ativo (parte média da língua) toque o articulador passivo

(parte média do palato duro) e a corrente de ar seja obstruída na linha central do trato

1 Segundo Dickey (1997, p. 1), “quase todas as línguas do mundo têm uma líquida”.

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vocal. O ar é expelido, então, pelos lados desta obstrução, gerando os segmentos

laterais.

O segmento lateral palatal é considerado geminado fonologicamente

(WETZELS, 2000), constituído de dois tempos para ser produzido. Além disso,

apresenta um traço que expressa articulação maior [Nó Ponto de Articulação de

Consoante] e uma articulação menor [Nó Vocálico]. Por ser um segmento geminado

fonologicamente, o /λ/ apresenta as seguintes características:

1) É limitado à posição intervocálica2 das palavras:

a) Bauni/λ/a

b) Te/λ/a

2) Não pode ser precedido por uma rima ramificada, nem por vogais nasais:

a) Faú/λ/a

3) A vogal que imediatamente o precede é sempre acentuada3:

a) Té/λ/a

b) Má/λ/a

Diferentes estudos (ARAGÃO, 1999; CASTRO, 2006; BRANDÃO, 2007) têm

revelado que o segmento /λ/ apresenta a realização de quatro variantes concorrendo

entre si, respectivamente [λ], [l], [j] e [Ø].

A lateral alveolar é outra variante do segmento /λ/ aqui controlado. De acordo

com Silva (2005, p. 65), a realização de [λ ~ l] constitui-se a segunda alternativa4

articulatória daquele segmento, e para que ocorra tal processo é necessário que o falante

levante a ponta da língua em direção aos alvéolos ou aos dentes incisivos superiores,

para a corrente de ar escapar lateralmente5. Cagliari (1974, p. 80) também afirma que

2 Esta visão também é compartilhada por Cagliari (1974, p. 112) ao afirmar que a lateral palatal sempre

começa sílaba e só se realiza nessa posição. Exceto para alguns clíticos como lhe(s),lhas, lho e de lhama,

empréstimo do espanhol llama. 3 Exceto para os vocábulos classificados como verbos, uma vez que o acento desses vocábulos é

condicionado pela morfologia. 4 A primeira alternativa articulatória, segundo a autora, é a realizada como consoante lateral palatal.

5 Câmara Jr (1988, apud ESPIGA, op. cit., p. 122) descreve a articulação do /l/ semelhante à descrição

feita por Silva (2005).

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em português o segmento /λ/ tende a ser realizado com /l/6 e se localiza sempre na parte

pré-palatal.

A semivocalização do /λ/7 também será controlada neste trabalho, como no

exemplo [mu/λ/er ~ mu/j/er]. De acordo com Cagliari (op. cit., p. 93-94), esse processo

de variação, de ordem sociolinguística, é corrente entre falantes de classe social baixa e

de pouca escolaridade, e até atestado em diferentes dialetos. Ainda segundo Cagliari

(op. cit., p. 117), outra causa das mudanças das palatais, como [λ ~ j8], está no

enfraquecimento articulatório pelo qual passa esse segmento ao ser produzido. Cruz

(2009, p. 53) compreende esse processo de variação como um fato puramente fonético,

e Coutinho (1976, apud CRUZ, 2009, p. 53) o entende como sendo um fenômeno de

metaplasmo por permuta.

Cardoso (2010, p. 59-60), ao apresentar dados do Atlas Diatópico e Diastrático

do Uruguai, aponta a existência da iotização da lateral palatal no espanhol uruguaio de

informantes da classe baixa e pertencentes à segunda faixa etária, em três tipos de

situação: leitura de texto, resposta ao questionário e conversação espontânea.

A última variante linguística da lateral palatal a ser examinada nesta pesquisa é

sua realização como zero fonético, como nos exemplos [mu/λ/er ~ mué; fi/λ/o ~ fio].

Essa variação, já atestada em Silva (1997), evidencia que a lateral palatal pode sofrer

apagamento total, desaparecendo-se dos níveis métricos e melódicos do segmento.

3. Fundamentação Teórica

Foi a partir dos trabalhos de William Labov (1963, 1966) sobre o inglês falado

na ilha de Martha’s Vineyard, no Estado de Massachusetts (Estados Unidos) e sobre o

estudo do inglês vernacular falado em Nova Iorque que os estudos variacionistas

ganharam impulso. Em 1968, Weinreich et al. lançam a proposta de fundamentação

6 Segundo Cagliari (op. cit., p. 144), esse processo ocorre mais quando se tem a vogal palatal /i/ tônica

precedendo a lateral palatal, como no exemplo: mi/λ/a ~ mi/l/a. Cagliari também observa que o pronome

lhe realiza-se mais frequentemente como /l/e. (op. cit., p. 144). 7 Segundo Cagliari (op. cit., p.118) esse processo costuma também ser chamado de ieismo ou tendência

ieisante. 8 Cagliari (op. cit., p. 73) apresenta o segmento /j/ classificado como sendo segmento pré-palatal.

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teórica de uma nova perspectiva, que ficou conhecida como Sociolinguística

Variacionista ou a Teoria da Variação9, que visa descrever a língua e seus

determinantes sociais e linguísticos, ao mesmo tempo em que rejeita a concepção

homogênea de língua e incorpora a relação língua/sociedade, considerando que a

variação linguística está associada ao sistema. A Sociolinguística Variacionista surge

no cenário linguístico como reação ao modelo gerativista (CHOMSKY, 1950).

De acordo com Chambers (2003, apud TAGLIAMONTE, 2006, p. 3), a

Sociolinguística Variacionista é: “the correlation of dependent linguistic variables with

independent social variables10

.” Neste sentido, este modelo de estudo linguístico busca

incorporar à sua análise restrições de natureza extralinguística, apontando para o

condicionamento linguístico de fatores sociais, visto que podem desempenhar papel

decisivo na explicação da variação linguística de uma determinada comunidade de fala.

A Sociolinguística Variacionista toma como objeto de estudo a língua falada por

uma determinada comunidade de fala. Essa língua corresponde às produções

linguísticas feitas em diferentes situações reais de uso. Desse modo, a análise

variacionista tomará a linguagem enquanto fenômeno social. Bright (1966, apud

ALKMIM, 2001, p. 28) afirma que o objeto da Sociolinguística é a diversidade

linguística. O modelo variacionista introduz a perspectiva da heterogeneidade

linguística em detrimento do axioma da homogeneidade linguística, pois de acordo com

Weinreich et al. (1968, p. 100-1):

The key to a rational conception of language change – indeed, of language

itself – is the possibility of describing orderly differentiation in a language

serving a community…It is absence of structural heterogeneity that would be

dysfunctional.11

9 Ressalta-se que, neste trabalho, tomam-se os termos Sociolinguística Variacionista e Teoria da Variação

como sinônimos. 10

“A correlação de variáveis linguísticas dependentes com variáveis sociais independentes.” (todas as

traduções que figuram nesta pesquisa são de nossa responsabilidade). 11

“A chave para uma concepção racional da mudança linguística – na verdade, da língua em si mesmo –

é a possibilidade de descrever diferenciação ordenadamente em uma língua que serve a uma comunidade.

É a ausência da heterogeneidade estrutural que seria disfuncional.”

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Neste sentido, a variação linguística ordenada é uma característica inerente a

qualquer língua natural. De fato, a língua é um sistema que evolui permanentemente e

buscar organizar as mutações desencadeadas por diferentes fenômenos linguísticos e por

diversos parâmetros (MARQUILHAS, 1996).

Ainda de acordo com Bright (1966, apud ALKMIM, 2001, p. 28), o objetivo da

Sociolinguística Variacionista consiste em: “demonstrar a covariação sistemática das

variações linguísticas e social.” Percebe-se, portanto, que a Teoria da Variação, ao

tomar a produção de fala espontânea como objeto de estudo, possibilita encontrar

padrões em meio à fala natural, evidenciando a importância de se descrever

sociolinguisticamente as comunidades de fala, ao mesmo tempo em que aponta para a

heterogeneidade sistemática, regular e previsível, controlada por variáveis estruturais e

sociais.

A Teoria Variacionista introduz nos estudos linguísticos o conceito de regra

variável, em oposição ao conceito de regra categórica, defendida pelo paradigma

gerativista. A concepção de regra variável opõe-se ao longo caminho central percorrido

pela teoria linguística. Com os neogramáticos (PAUL, 1966), a mudança fonética era

concebida como fato categórico. Foi a primeira perspectiva linguística a observar a

regularidade na mudança do som. Para esses estudiosos, a mudança linguística se dava

de forma regular, ou seja, quando ocorria em determinado contexto, afetaria todos os

outros contextos semelhantes.

Para os estudos variacionistas, a relação entre língua e sociedade é indispensável

e não mero recurso interdisciplinar de análise. Língua e sociedade constituem também

instâncias inseparáveis. É por meio da língua, que os falantes realizam situações

comunicativas concretas na vida social. Além disso, a língua possibilita ao indivíduo se

situar na sociedade e realizar diferentes processos comunicativos com outros falantes.

Essa relação também fica evidente quando se observa aspectos relacionados, por

exemplo, às exigências atuais do mercado de trabalho, quando se percebe que a mulher,

geralmente por questões culturais, exerce o papel de principal educadora do lar ou

quando se associa língua com fatos ligados a idade, jargões de classes específicas ou a

um determinado tipo de discurso político.

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Neste sentido, percebe-se que a Teoria Variacionista adota em suas análises o

componente social como elemento de condicionamento linguístico, dando conta de

vários fenômenos linguísticos que se realizam nas comunidades de fala, diferentemente

dos enfoques estruturalista e gerativista. O contexto social é capaz de fornecer

elementos que possibilitam compreender e explicar como ocorre a variação linguística

em uma determinada comunidade. De acordo com Hora (2004, p. 18), a Teoria da

Variação:

Situa-se em relação ao conjunto língua e sociedade, considerando a variedade

das formas em uso como objeto complexo, decorrente dos fatores internos,

próprios do sistema linguístico, e dos fatores sociais que interagem no ato da

comunicação. A variação da língua constitui, portanto, um dado relevante da

teoria e da descrição sociolinguística.

A Sociolinguística Variacionista tem demonstrado que a língua de uma

comunidade de fala apresenta marcas que identificam os seus falantes. Essas marcas,

sejam elas de sexo, nível de escolaridade, classe social, etnia, evidenciam que o falante

utiliza formas diferentes de falar porque o sistema linguístico o possibilita realizar

escolhas. Desse modo, de acordo com Weinreich et al. (1968), o conceito de regra

variável contradiz o paradigma de categoricidade.

Os postulados da Teoria da Variação concebem a língua como sistema

heterogêneo e variável. A língua, desse modo, oferece ao falante diferentes

possibilidades de se expressar e de fazer referência a um dado objeto, fenômeno ou fato

da situação social em que esteja inserido. E cada uma dessas possibilidades é portadora

de um valor e desempenha alguma função durante a realização do processo

comunicativo na interação social. De acordo com Tagliamonte (op. cit., p.5-6):

The essence of variationist Sociolinguistics depends on three facts about

language that are often ignored in the field of Linguistics. First, the notion of

„orderly‟ heterogeneity (LABOV et al, 1968, p. 100), as Labov (1982, p. 17)

refers to as „normal‟ heterogeneity; second, the fact that language changes

perpetually; and third, that language conveys more than simply the meaning

of its words.12

12

“A essência da sociolinguística variacionista depende de três fatos sobre a língua que são ignorados

frequentemente no campo da Linguística. O primeiro, a noção de „heterogeneidade ordenada‟ (LABOV

et. al., 1968, p. 100), à qual Labov (1982, p. 17) se refere como heterogeneidade „normal‟; o segundo, o

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Para a Sociolinguística Variacionista, é durante a produção da fala do tipo

espontânea, sem monitoramento, diária, informal que ocorrem diferentes fenômenos de

variação linguística. É o tipo de fala que a literatura denomina vernáculo

(TAGLIAMONTE, op. cit.), que se distancia da norma idealizada e permite a realização

de processos de escolhas, de opções. Para Labov (1969), a escolha é um processo

sistemático dentro da heterogeneidade linguística, evidenciando-se, assim, a natureza

variável do sistema linguístico. Corrobora as ideias ventiladas até aqui, a afirmação de

Tarallo (2004 [1985], p.19): “a língua falada é o vernáculo: a enunciação e expressão

dos fatos, proposições, ideias (o que) sem a preocupação de como enunciá-los. Trata-se,

portanto, dos momentos em que o mínimo de atenção é prestado à língua, ao como da

enunciação”.

De acordo com Weinreich et al. (1968), dois são os princípios básicos para o

estudo da língua no campo da Sociolinguística Variacionista: (i) deixar de identificar

estrutura linguística como homogeneidade e conceber como opção racional a

possibilidade de descrever ordenadamente a diferenciação numa língua que serve à

comunidade; (ii) entender que as gramáticas nas quais uma mudança linguística ocorre

representam gramáticas de comunidade de fala.

Desse modo, esse modelo teórico-metodológico tem possibilitado uma maior

compreensão dos fenômenos linguísticos, visto que elimina os falantes ideais e,

consequentemente, a comunidade linguística homogênea. Percebe-se, assim, que a regra

variável é sensível ao contexto de sua realização, condicionado linguística e

extralinguisticamente. Além disso, tem-se evidenciado que a variação linguística pode

ocorrer em diferentes níveis da gramática, tais como o lexical, o fonológico, o

morfológico, o sintático, o discursivo/pragmático (TAGLIAMONTE, op. cit.).

A Sociolinguística Variacionista tem fornecido todo um suporte teórico-

metodológico com aparato estatístico como ferramenta de análise e quantificação dos

dados linguísticos, sobretudo ao fazer a análise multivariada e a quantificação de opções

do sistema linguístico pelo programa computacional Goldvarb X.

fato de que a língua muda continuadamente; e o terceiro, que a língua transmite mais do que

simplesmente o significado de suas palavras.”

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A partir do que propõe a Sociolinguística Variacionista, aceita-se que a

realidade linguística é variável: há variação dialetal e social dentro do indivíduo. A

gramática do falante de uma língua natural apresenta processos opcionais por

condicionamentos. Além disso, a análise sociolinguística tem considerado não apenas o

dado linguístico, mas tem incorporado dados à sua análise, como a identidade social do

emissor (falante) e a do receptor (ouvinte), o contexto social.

Neste sentido, constata-se que os parâmetros da variação linguística são diversos

e que só a análise dos dados linguísticos pode revelar as motivações linguísticas e não-

linguísticas que condicionam os fenômenos linguísticos existentes em uma determinada

comunidade de fala. Este trabalho de pesquisa também entende que a descrição de uso

de formas da língua pode ser comprovada a partir da competência do falante, daí a

necessidade de se adotar uma teoria de origem gerativista para auxiliar na explicação do

fenômeno ora analisado.

Em 1974, Cedergren & Sankoff apresentam e descrevem um modelo teórico-

metodológico baseado em dados estatísticos e probabilísticos para dá suporte ao

conceito de regra variável. Segundo eles: “[...] the option is of covariation with elements

of the linguistic environment and non-language factors such as age, class and social

context.” (CEDERGREN & SANKOFF, 1974, p. 333).

Entende-se que o conceito de opcionalidade é capaz de capturar a natureza da

variação regular que existe na gramática de um falante, uma vez que revela a língua

enquanto sistema de possibilidades, de escolhas. A noção de regra variável evidencia

que a variação linguística é parte integrante da descrição estrutural de uma língua. Daí

constitui-se um conceito essencial aos estudos variacionistas.

Ainda segundo os autores, o conceito de variabilidade além de conter a presença

ou a ausência de elementos linguísticos também incorpora a noção de condicionamento

por fatores extralinguísticos (op. cit., p. 334).

Compreende-se que a Teoria da Variação tem explicado a sistematicidade

existente na variação que ocorre em uma língua natural, e ao mesmo tempo, pode

demonstrar a importância qualitativa das relações linguísticas. Neste sentido, apropria-

se de modelo matemático formulado para explicar a o efeito de frequência de uma

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determinada regra variável utilizada por uma comunidade de fala, demonstrando que os

aspectos probabilísticos da gramática podem descrever a realização de um fenômeno

linguístico.

Desse modo, a formulação e a introdução da noção de regra variável na Teoria

da Variação possibilitaram a compreensão e reconhecimento de fenômenos variáveis

existentes em uma língua e assegurar a base teórica e funcional de seu emprego.

Neste sentido, entende-se que por meio da observação de frequências e

probabilidades pode entender o comportamento linguístico dos falantes e, assim,

reconhecer as propriedades da sua competência.

4. Detalhamento das Variáveis Sociais

Sistemáticos estudos sociolinguísticos acerca do português falado no Brasil têm

demonstrado o efeito de diversos fatores sociais sobre o uso da língua, consolidando a

tese de que o emprego linguístico está condicionado por elementos sociais, sobretudo,

sexo, faixa etária e o nível de escolaridade dos informantes.

As três variáveis independentes relevantes para a análise aqui realizada são sexo,

faixa etária e anos de escolarização dos informantes. A continuação desta seção,

detalha-se as três hipóteses associadas a cada fator.

4.1 Primeira hipótese: sexo

A variável sexo tem sido estudada como elemento extralinguístico fonte de

variação sociolinguística para diferentes fenômenos ocorridos nas línguas (FISCHER,

1958; LABOV, 1966).

Por exemplo, Mollica, Paiva e Pinto (1989), analisando o uso da supressão

variável da vibrante nos grupos consonantais (problema/pobrema;

proprietário/propietário) na variedade carioca apresenta padrões de preferências

diferentes entre os informantes masculinos e femininos. A tabela 1 mostra que mulheres

e homens têm diferentes preferências. As mulheres utilizam mais a forma padrão (sem a

supressão da vibrante) do que os homens.

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Tabela 1: Influência da variável sexo sobre a supressão

da vibrante nos grupos consonantais

Sexo Frequência Peso Relativo

Feminino 280/1137 = 25% 0,45

Masculino 468/1411 = 33% 0,57

(PAIVA, 2004, p. 34)

De acordo com as diferenças de sexo apontadas pela literatura, nossa primeira

hipótese é a de que o sexo influencie a realização do segmento /λ/. Considerando esta

hipótese, acredita-se que os resultados mostrarão que mulheres e homens apresentam

uma distribuição de uso diferente. Sexo é uma variável dicotômica com dois valores: (I)

masculino e (II) feminino.

4.2 Segunda hipótese: faixa etária

Sistemáticos estudos dialetais têm mostrado salientes diferenças quanto ao uso

de uma regra variável quando os fatores relacionados à idade dos informantes são

considerados na análise, evidenciando comportamentos linguísticos diferentes de acordo

com a faixa etária (GAL, 1979; POPLACK & SANKOFF, 1984).

A tabela 2 apresenta resultados de pesquisa feita por Poplack e Sankoff (1984)

acerca do empréstimo de palavras do Espanhol por falantes do Harlem Oriental (New

York). A análise evidencia que o uso linguístico feito por adultos e crianças pode

demonstrar tendências diferentes. Note que pelas três primeiras medidas as crianças

falam diferentes dos adultos, há apenas na quarta medida a ocorrência de uma inversão.

No global, a tabela 2 mostra que a fala varia de acordo com a idade dos informantes.

Tabela 2: Índices do empréstimo de palavras do Inglês no espanhol do Harlen

Crianças Adultos

Proporção do Inglês 62.6 51.2

Somente Inglês 56.4 44.4

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Primeira língua (Inglês) 64.2 52.6

Nativos 107.2 115.6

(Adaptação de CHAMBERS, op. cit., p. 166)

A variável faixa etária será considerada com três fatores: (I) informantes de 15 a

25 anos; (II) informantes de 26 a 49 anos; e (III) informantes de mais de 49 anos.

Considerando esses fatores, a faixa etária inicial, de falantes mais jovens, pode

evidenciar eventuais inovações linguísticas. A faixa etária intermediária, revela, em

tese, aqueles usos linguísticos que geralmente já estão estabelecidos nas comunidades

pesquisadas. E finalmente, na terceira faixa etária podem identificar-se as formas

linguísticas que poderiam estar em desuso.

Nesta visão de diferenças entre o uso da fala, de acordo com a faixa etária, a

segunda hipótese prediz que os informantes mais novos são os que mais realizam o

fonema lateral palatal /λ/.

4.3 Terceira hipótese: anos de escolaridade

Os princípios da organização da Sociolinguística Variacionista têm adotado a

variável escolaridade como sendo fonte de variação nas comunidades de fala,

configurando-se papel crítico no domínio da língua padrão pelos informantes.

A tabela 3 exibe resultados alcançados com falantes da variedade paraibana

(LUCENA, 2004) acerca do comportamento sociolinguístico da preposição para nesse

dialeto. Note que os informantes sem nenhum nível de escolarização são os que mais

aplicam a variação em estudo, diferentemente dos escolarizados que exibem índice de

(0,91) que constitui-se um número relevante para realização da regra. Neste sentido, a

variável escolaridade pode evidenciar relevantes diferenças quanto aos usos linguísticos.

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Tabela 3: distribuição de para no discurso

Fatores Aplicação Total % Peso Relativo

Universitários 85 642 13 0,91

Analfabetos 2 803 0 0,14

(LUCENA, 2004, p. 94)

Considerando que as diferenças entre os anos de escolarização podem ser

relevantes para os estudos sociolinguísticos, a nossa terceira hipótese estabelece que a

escolaridade será influente para realização do /λ/. De acordo com essa hipótese, os

informantes analfabetos tendem a realizar menos o /λ/ do que os informantes

escolarizados.

5. Metodologia e Corpora

Para realização desta pesquisa foi utilizado um corpora constituído por 24 (vinte

e quatro) informantes, sendo 12 (doze) pertencentes ao dialeto paraibano (Jacaraú), e os

outros doze falantes do dialeto norte-riograndense (Nova Cruz), e está socialmente

estratificado igualmente por sexo, faixa etária e anos de escolarização.

A coleta de dados seguiu o modelo teórico-metodológico da Teoria da Variação

(Sociolinguística Quantitativa), utilizando o Goldvarb X (SANKOFF;

TAGLIAMONTE; SMITH, 2005) para obtenção dos índices estatísticos que explicará

os efeitos de frequência da regra variável em estudo (CEDERGREN & SANKOFF,

1974).

Utilizou-se a entrevista pessoal de base sociolinguística como instrumento de

coleta de dados e a técnica de amostra aleatória, selecionando os informantes que

comporão os corpora de acordo com os critérios:

a) Ser natural de uma das comunidades investigadas ou morar nelas desde os cinco

anos; e

b) Nunca ter ausentado dessas comunidades por mais que dois anos consecutivos.

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6. Resultados e implicações para a pesquisa linguística

Nesta seção, objetiva-se apresentar os resultados obtidos em nossa análise por meio do

Goldvarb X, indicando o efeito que cada variável tem sobre a aplicação da regra em

estudo.

6.1 Resultados: Sexo

A tabela 4 mostra que sexo é estatisticamente significante (P= 0.024), mas

apenas para a variedade paraibana. As mulheres realizam mais a variante [λ], enquanto

os homens preferem a realização das outras variantes [l,j,Ø].

Tabela 4: Efeito da variável sexo sobre a variação da lateral

palatal /λ/na variedade paraibana

Fatores Aplicação/Total = Frequência Peso Relativo

Masculino 80/114 = 70% 0,39

Feminino 81/90 = 90% 0,63

Total 161/204 = 78%

Input 0.86

Significância: 0.024

6.2 Resultados: Faixa Etária

Esta variável independente mostrou-se ser significante para aplicação da regra (P

= 0.009) apenas para variedade norte-riograndense. A tabela 5 evidencia que os

informantes da faixa etária intermediária são os que mais aplicam a regra em análise,

com índice de (0,73) de favorecimento; seguidos dos falantes mais idosos, (0,55), que

exibe uma ligeira vantagem, enquanto os informantes mais novos são os tendem a não

aplicar a regra.

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Tabela 5: Efeito da variável faixa etária sobre a variação da

lateral palatal /λ/ na variedade norte-riograndense

Fatores Aplicação/Total = Frequência Peso Relativo

15 a 25 anos 63/66 = 82% 0,21

26 a 49 anos 48/49 = 98% 0,73

+ de 49 anos 41/50 = 95% 0,55

Total 152/165 = 92%

Input 0.94

Significância: 0.009

6.3 Resultados: Anos de escolarização

Os resultados na tabela 6 indicam que esse fator é estatisticamente significante

(P= 0.024) para realização do fenômeno variável em estudo apenas na variedade

paraibana. Os falantes jacarauenses com maior o nível e grau de escolarização são os

que mais tendem à aplicação da regra (0,88), enquanto os menos escolarizados e

analfabetos não exibem índices favorecedores, respectivamente, (0,47) e (0,18), que

constituem índices matematicamente inibidores da realização do fenômeno em

discussão.

Tabela 6: Efeito da variável anos de escolarização sobre o uso

variável da lateral palatal /λ/ na variedade paraibana

Fatores Aplicação/Total = Frequência Peso Relativo

Analfabetos 30/57 = 52% 0,18

1 a 8 anos de escolaridade 85/100 = 85% 0,47

+ de 8 anos de escolaridade 46/47 = 97% 0,88

Total 161/204 = 78%

Input 0.86

Significância: 0.024

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7. Considerações Finais

Até o momento, os resultados deste estudo indicam uma forte tendência das

variáveis sociais exercerem influência na realização do fonema lateral palatal /λ/,

mesmo que a distribuição da estratificação social tenha sido diferente nas duas

variedades estudadas; os índices matemáticos alcançados oferecem impressão que

confirmam a nossa hipótese central de que o uso linguístico está condicionado por

restrições sociolinguísticas.

A análise atual provou que as variáveis sociais podem exibir comportamento

diferente, dependendo da variedade considerada. Para a variedade paraibana, duas

variáveis independentes mostram-se relevantes para aplicação da regra, exibindo

significância estatística e índice de peso relativo favorecedores, respectivamente, sexo e

anos de escolarização; enquanto a variável faixa etária não foi selecionada como fonte

condicionadora de variação do /λ/. Acredita-se que os falantes de qualquer idade do

dialeto paraibano parecem não demonstrar receio e/ou estigma entre a realização do [λ ~

l], [λ ~ j] e [λ ~ Ø], e, assim, não evidenciam preferências. Já na variedade norte-

riograndense, apenas a variável faixa etária mostrou-se relevante para realização do

fenômeno em estudo, demonstrando que os informantes adultos são os que mais tendem

a produzir o segmento /λ/. Entende-se que esse comportamento pode está vinculado a

duas situações: a primeira, a de que, naturalmente, esse período da vida está associado a

fixação de diferentes comportamentos sociais (casamento, trabalho, constituição de

família, aquisição de casa própria, de carro, etc.); a segunda, que esses informantes

podem estar sujeitos às pressões atuais do mercado de trabalho, Nova Cruz (RN) tem

um diversificado e exigente mercado de trabalho, constituindo-se um espaço de maior

dinamicidade que reflete centralidade regional em relação à outras cidades

(COUTINHO, 2010).

Neste sentido, a realização das variantes [l,j,Ø] pode apresentar claramente

traços de estigmatização social e linguística nessa comunidade de fala, daí serem

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variantes que tendem a não ser produzidas pelos adultos que buscam sua inserção no

mercado de trabalho, confirmando o que aponta Chambers (op. cit., p.183) que os

adultos tendem a estandardizar sua fala mais do que os informantes jovens.

Há evidências encontradas para se afirmar que a realização do /λ/ constitui um

fenômeno variável social (variação diastrática) na variedade paraibana, uma vez que se

constatou que a variação desse segmento está vinculada ao nível e ao grau de

escolaridade dos informantes pesquisados.

Estudos que revelam a relevância de variáveis extralinguísticas contribuem

significativamente para a literatura sociolinguística, ao evidenciar que a configuração

Detalhada do processo de variação compreende-se em função das forças sociais

que afeta esse fenômeno.

As variáveis sociais associadas aos estudos dialetais podem evidenciar que no

uso da língua há forças sociais exercendo influência sobre ela, validando diversas

hipóteses particulares que são levantadas para a pesquisa linguística.

Sistemáticos estudos variacionistas têm, ao tomarem as variáveis sociais durante

à análise, apontado diversas implicações para os trabalhos em Linguística (seja na

perspectiva teórica ou aplicada), especificando o efeito que uma variável independente

pode manter sobre o fenômeno em discussão, e ao mesmo tempo, pode estabelecer o

significado social da variação linguística.

Questões como as que levantamos aqui são essenciais para a Sociolinguística,

evidenciando que implicações há para os estudos dialetais ao se perceber que nos usos

linguísticos refletem distinções sociais em que os falantes dessas comunidades estão

inseridos.

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