Capítulo VI Ondas Acústicas e Piezoeletricidade · Pode-se demonstrar que Tij é um tensor de...
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Capítulo VI Ondas Acústicas e Piezoeletricidade
6.1 INTRODUÇÃO
No capítulo 5, referente ao efeito eletroóptico, estudou-se a propagação de ondas ópticas
em meios cujas propriedades relevantes ( μ , ε ) eram independentes do tempo. No caso da
interação acústico-óptica, a ser estudada no próximo capítulo, a permissividade é controlada por
uma onda elástica, tornando-se uma função do tempo e do espaço [1]. A fim de desenvolver o
modelo da interação acústico-óptica é importante se estudar, primeiramente, as propriedades da
propagação de uma onda elástica no meio onde ocorre esta interação. As características da onda
elástica, que são de interesse para acústico-óptica, são: polarização, velocidade de fase,
comprimento de onda, freqüência, potência e impedância acústica [2].
Ondas de natureza mecânica podem se propagar com velocidade e polarização bem
definidas, e em uma faixa de frequências bastante ampla − entre dezenas de Hz a centenas de
GHz. Essa velocidade de fase em um meio ilimitado é, tipicamente, inferior a 12 × 103 m/s.
Portanto, a onda de natureza mecânica é eminentemente uma onda lenta quando comparada com
uma onda eletromagnética propagando-se no mesmo meio. Em decorrência deste fato, em
frequências de microondas significativamente baixas (alguns MHz), o comprimento de onda da
onda acústica é de algumas dezenas de μm. Por exemplo, se num dado material a onda se
propaga com velocidade de fase vp = 3000 m/s e com frequência fa = 10 MHz, então, o
comprimento de onda será igual a Λa = vp/fa = 300 μm. Por outro lado, se esta fosse uma onda
eletromagnética com f =10 MHz e propagando-se no mesmo meio, seu comprimento de onda
seria da ordem de λ ∼ c/f ~ 30 m. Uma vez constatado que Λa é baixo, pode-se inferir que a
maioria dos dispositivos à onda acústica exibe dimensões reduzidas.
170
6.2 ONDAS ELÁSTICAS EM SÓLIDOS NÃO-PIEZOELÉTRICOS
Quer sejam ondas sonoras, ondas na superfície da água, ondas eletromagnéticas, etc.,
todas têm em comum o fato de constituir um distúrbio em movimento e de conduzir energia de
uma local para outro. Um erro comum no entendimento de ondas é supor que elas estão
associadas ao movimento do meio físico que as suportam, por exemplo, quando se interpreta
erroneamente que uma onda propagando-se na superfície da água também envolve o transporte
de água. Contudo, este não é o caso, sendo que a onda – o distúrbio − é quem se move através
da água.
Ao contrário das ondas eletromagnéticas, as ondas elásticas podem apresentar polarização
transversal ou longitudinal. Na onda transversal o distúrbio é perpendicular à direção de
propagação, como no caso da onda propagando-se numa corda, como mostrado na Fig.6.1.
Observa-se que o movimento da mão de quem provoca o distúrbio ocorre na direção vertical,
para cima e para baixo, porém, a onda se propaga na direção horizontal.
Figura 6.1 – Propagação de onda numa corda.
Ondas transversais também ocorrem quando se lança uma pedra na superfície de um lago,
como mostrado na Fig.6.2 a). As partículas de água oscilam, para cima e para baixo, em torno
das suas posições de equilíbrio. A oscilação de uma bóia, como mostrado na Fig.6.2 b), é similar
ao de uma massa fixada na extremidade de uma mola vertical.
171
(a)
(b)
Figura 6.2 – Onda se propagando na superfície da água. a) O arremesso de uma pedra proporciona energia para gerar a onda. b) Movimento transversal de uma bóia.
No caso da onda longitudinal, o distúrbio ocorre paralelamente à direção de propagação
da onda, como na Fig.6.3 a), que ilustra uma onda propagando-se numa mola, ou, na Fig.6.3 b),
relativa a uma onda sonora.
(a)
(b)
Figura 6.3 – Ondas longitudinais. a) Onda numa mola. b) Onda sonora.
Como se observa na Fig.6.3 b), as partículas de ar não se deslocam com a onda sonora,
mas simplesmente oscilam quando esta as atravessam. As partículas de ar simplesmente oscilam,
para frente e para trás, em torno de suas posições de equilíbrio.
Considere-se a seguir um meio material arbitrário através do qual se propaga uma onda
elástica. Em geral, os meios considerados em dispositivos acústico-ópticos são sólidos ou
líquidos, com maior ênfase para os do primeiro tipo. Neste capítulo, é dada ênfase à distribuição
de forças de contato, isto é, forças que as partículas adjacentes a uma dada amostra elementar
geram sobre a amostra. Formalmente, a polarização da onda elástica refere-se à orientação do
172
deslocamento das partículas, em torno da posição de equilíbrio, em relação à direção de
propagação. Se u denotar o deslocamento da partícula em relação a sua posição de equilíbrio,
tem-se:
a) Onda elástica longitudinal
Na onda elástica longitudinal as partículas oscilam (vibrações microscópicas) na mesma
direção de propagação da onda. Na Fig. 6.4 ilustra-se esse processo, onde aK
refere-se ao vetor
de onda da onda elástica e onde aKu // ou 1ˆ// xKu a
.
X3
X 2 aK
u
Partícula
a1 K//)t,x(u
X1
Figura 6.4 – Onda elástica longitudinal. b) Onda elástica transversal
No caso de onda transversal, as partículas oscilam na direção perpendicular à direção de
propagação da onda elástica. Nas Figs. 6.5a) e 6.5b) ilustram-se esse processo, nas quais 2ˆ// xu e
3ˆ// xu , respectivamente.
x3
x1
x2
2x̂//u
aK
Partícula
(a)
x3 x1
x2
3x̂//u
aK
Partícula
(b)
Figura 6.5 – Propagação de onda elástica transversal. a) Polarização na direção x2. b) Polarização na direção x3.
Antes de prosseguir com a análise, é importante definir algumas grandezas físicas
relevantes para a compreensão das ondas elásticas.
173
6.2.1 Tensão Mecânica ou Stress ( N/m2 )
Com o auxílio da Fig.6.6, serão definidas as componentes do tensor denominado tensão
mecânica ou stress, Tij, cuja dimensão é de força por unidade de área, N/m2.
x1
x2
x3
ΔAj
iF
jx̂
Figura 6.6 – Grandezas para a definição de stress.
Na Fig. 6.6, a componente de força Fi , que atua na direção xi , é aplicada sobre a área do
elemento diferencial de volume, ΔAj, cuja normal está na direção xj. Desta forma, define-se a
componente de stress Tij como ( faceforçaT , ):
Tij = 0lim
→Δ jA
Δ j
i
AF (6.1)
ou seja, uma tensão mecânica aplicada sobre um elemento de área ( jAΔ ) cuja normal é jx̂ , e que é gerada por uma força ( iF ) que ocorre ao longo da direção ix̂ . No exemplo da Fig. 6.6, tem-se uma força de cisalhamento.
Pode-se demonstrar que Tij é um tensor de segunda ordem, e, quando o meio está em
equilíbrio de rotação, isto é, quando o torque externo é nulo, tem-se [3]: Tij = Tji (6.2)
ou seja, é simétrico. _____________________________________________________________________________ Exemplo 6.1: Mostrar que em equilíbrio de rotação ocorre T12=T21. Solução: A componente de stress T12 refere-se à força aplicada na direção x1, denominada
de 1FΔ , sobre a face cuja normal é x2, isto é, 2n̂ , como mostrado na Fig. 6.7. Portanto
174
)( 31121 xxTF ΔΔ=Δ , sendo )( 31 xx ΔΔ a área em questão. Obviamente, esta é uma força de
cisalhamento. De forma análoga, pode-se considerar a componente de força aplicada na face cuja
normal é ( 2n̂− ), posicionada em x2=0 (não mostrada na figura).
ΔF1ΔF2 2n̂
1n̂ Δx1Δx2
Δx3
τ1
τ2
x1
x2
x3
Figura 6.7 – Elemento diferencial de volume em equilíbrio de rotação.
Por outro lado, T21 está relacionada à força aplicada na direção x2, denominada de 2FΔ ,
sobre a face cuja normal é x1, isto é, 1n̂ . Assim, )( 32212 xxTF ΔΔ=Δ é a força de cisalhamento
atuando sobre a área )( 32 xx ΔΔ . De forma análoga, pode-se considerar a componente de força
aplicada na face cuja normal é ( 1̂n− ), posicionada em x1=0 (não mostrada na figura).
Como, em equilíbrio de rotação, o torque resultante é nulo, então, o torque calculado em
torno do eixo x3 será tal que
132212311221 )()( xxxTxxxT ΔΔΔ=ΔΔΔ= ττ
(onde τ1 e τ2 são torques, Nm) o qual implica em que T12=T21 .
6.2.2 Deformação Mecânica ou Strain
A deformação mecânica ou strain é uma medida do deslocamento relativo de partículas
num meio material. Com isso, é uma grandeza adimensional (ou porcentual). A componente de
strain Skl é definida como [2]:
Skl =
∂∂+
∂∂
k
k
xu
xu
21 (6.3)
sendo que ku (k, = 1, 2, 3) referem-se às componentes do vetor deslocamento mecânico das
partículas, e xk e x estão associados às coordenadas cartesianas do sistema de referência.
175
Além de ser uma grandeza adimensional, o strain é um tensor de segunda ordem
simétrico, no qual
Sk = S k (6.4)
a qual decorre de considerações termodinâmicas [1-3].
É possível demonstrar que, na situação k=, ocorre elongação do material, enquanto que,
para k≠, ocorre rotação ou torção do material. A título de ilustração, considerem-se os casos
onde k==1, e, onde k=1 e =2, relativos às componentes de strain S11 e S12, respectivamente:
S11=
∂∂+
∂∂
1
1
1
1
21
xu
xu =
1
1
xu
∂∂ (6.5 a)
S12=
∂∂+
∂∂
1
2
2
1
21
xu
xu (6.5 b)
Conforme esquematizado na Fig.6.8, para um elemento de área no plano x1x2 (fora de
escala, pois, na realidade, as deformações são microscópicas), o primeiro caso (k==1)
corresponde a uma variação das posições das partículas (em torno do ponto de equilíbrio) em
relação à coordenada x1. Na figura, Δu1 corresponde à deformação na direção x1, em um
elemento linear de comprimento Δx1. Conforme se verifica, houve elongação do corpo sólido.
Figura 6.8 – Componente de deformação longitudinal.
Por outro lado, na situação onde k=1 e =2, verifica-se a presença de forças de
cisalhamento e deformações conforme as mostradas nas Figs. 6.9a), b) e c).
176
x1
Δx1
Δu2
x2
φ2
1
22 x
u∂∂=φ
(a)
x1
Δx2
Δu1
Δx1
φ1x2
2
11 x
u∂∂=φ
(b)
(c)
1,2
2,12,12,1 x
utg
ΔΔ
≅≅ φφ
∂∂+
∂∂=+=
1
2
2
12112 2
12 x
uxuS φφ
Figura 6.9 – Componentes de deformação por cisalhamento. a) Cisalhamento na direção x2. b) Cisalhamento na direção x1. c) Torção do corpo.
Na Fig. 6.9 a), por exemplo, observa-se que Δu2 varia (aumenta) de acordo com o
comprimento Δx1 do corpo. Observa-se, também, que 12 / xu ΔΔ corresponde aproximadamente
ao ângulo φ2 associado com deformação na direção x2. Por sua vez, 21 / xu ΔΔ (Fig. 6.9 b))
corresponde aproximadamente ao ângulo φ1 associado com a deformação na direção x1.
Finalmente, para ângulos φ1 e φ2 muito pequenos, define-se que S12 é aproximadamente igual à
média aritmética entre estes ângulos, ou seja, metade do ângulo total associado com a
deformação transversal que ocorre no plano x1x2.
6.2.3 Lei de Hooke Tensorial
Sabe-se, da física elementar, que a lei de Hooke estabelece a relação entre a força e a
elongação em um meio material. No presente estudo, considerar-se-á que os materiais
envolvidos possuam anisotropia mecânica arbitrária e, portanto, deve-se recorrer à lei de Hooke
na forma tensorial. Neste estudo preliminar, o efeito piezoelétrico será desconsiderado na lei de
Hooke, deixando-se para discuti-lo na seção 6.3. Na Fig. 6.10 ilustra-se uma haste delgada
submetida a uma força F e que sofre uma deformação Δ na direção longitudinal. Segundo a
177
física elementar tem-se Δ= .kF , onde k é a constante elástica do material. Contudo, observa-se
que além da deformação devido à força de elongação, também ocorrem forças de cisalhamento
nas direções transversais, o que não é previsto nesta equação simples.
F F
Δ
Figura 6.10 – Deformação em uma haste delgada.
Será considerado na análise, que o meio material seja linear sob o ponto de vista elástico.
Nesta situação, a lei de Hooke tensorial, a qual estabelece que a relação entre os tensores stress e
strain (relação constitutiva), é dada por [4]:
Tij = cijkl Skl (6.6) onde cijkl [N/m2] é um tensor de quarta ordem correspondente as constantes elásticas de rigidez
(ou simplesmente constantes elásticas, ou ainda, stiffness) do meio material.
Em princípio, o tensor cijkl apresenta 34=81 elementos, contudo, como os tensores stress
e strain são simétricos, isto é, Tij = Tji e Sij = Sji , então
cijkl= cjikl= cijlk (6.7) e assim, o número de elementos de cijkl reduz-se a 36. Considerações de simetria cristalina
estabelecem quantos elementos serão nulos e qual a relação entre os remanescentes.
O tensor das constantes elásticas do material, em notação de índices reduzidos (11=1,
22=2, 33=3, 23=32=4, 13=31=5, 12=21=6), torna-se [2]:
ijklc = cmn , 6,...,2,1,e3,2,1,,, == nmlkji (6.8)
e, com isso, o tensor das constantes elásticas pode ser representado por uma matriz de ordem
6×6. No caso de meio sólido elasticamente isotrópico, [c] é tal que:
[ ]c =
000
12
12
11
ccc
000
12
11
12
ccc
000
11
12
12
ccc
00
000
44c
0
0000
44c
44
00000
c
=
6
5
4
3
2
1
44
44
44
111212
121112
121211
6
5
4
3
2
1
000000000000000000000000
SSSSSS
cc
cccccccccc
TTTTTT
(6.9)
178
sendo ,111 TT = ,222 TT = ,333 TT = ,234 TT = ,135 TT = ,126 TT = ,111 SS = ,222 SS = ,333 SS =
,234 SS 2= ,135 SS 2= 126 SS 2= (ATENÇÃO!), e onde c44 = ( c11 – c12 )/2 [2].
Por exemplo, para sólidos isotrópicos como o quartzo fundido (densidade ρ =2,2×103
kg/m3), tem-se c11=78,5×109 N/m2, c12=16,1×109 N/m2 e c44=31,2×109 N/m2. Relativamente às
matrizes das constantes elásticas para meios com anisotropia mecânica como, por exemplo: Ge,
GaAs , PIn (simetria cúbica), CdS, ZnO (simetria hexagonal), quartzo cristalino, LiNbO3 e
LiTaO3 (simetria trigononal), sugere-se que o leitor consulte o livro do Yariv [1].
6.2.4 Lei de Newton Tensorial
Como se sabe, 11T corresponde à componente de stress na face cuja normal é 1x̂ , devido a
componente força aplicada segundo a direção xl. Esta componente é responsável por uma
elongação do corpo na direção x1. Um raciocínio semelhante se aplica às demais componentes do
tensor stress. Na Fig.6.11 ilustram-se as componentes de stress atuando sobre a face cuja normal
é 1x̂ . Pela figura, observa-se que T11 é uma componente de elongação, enquanto que T21 e T31
são duas componentes de cisalhamento. A componente T11 contribui para a força total F1
aplicada nesta face e apontada na direção x1. Na face oposta tem-se uma situação semelhante,
com uma força total na direção (−x1).
Figura 6.11 – Componentes de stress na face perpendicular a x1.
O balanço de forças na direção x1 estabelece que a diferença entre forças antagônicas é:
179
( )32111 xxABCD
TF ΔΔ=Δ − ( )3211 xxEFGH
T ΔΔ (6.10)
Porém, aplicando-se a série de Taylor em torno de x1=0, obtém-se
( ) ( ) ...210 2
121
112
11
111111111 +Δ
∂∂+Δ
∂∂+==Δ= x
xTx
xTxTxxT (6.11)
sendo que apenas as duas primeiras parcelas são suficientes para o caso de um elemento
diferencial de volume em sólidos. Além disso, por inspeção da Fig.6.11, conclui-se que
( )111111 xxTABCD
T Δ== , (6.12 a)
)0( 11111 == xTEFGH
T (6.12 b)
as quais, substituídas em (6.10), e, com o auxílio de (6.11), conduzem a
1FΔ =1
11
xT
∂∂
321 xxx ΔΔΔ (6.13)
Procedendo-se de forma similar com relação às tensões nas outras faces, cujas normais
são 2x̂ e 3x̂ , determinam-se as demais parcelas de força segundo a direção 1x̂ (forças de
cisalhamento), e assim, a resultante da força total segundo 1x será
∂∂+
∂∂+
∂∂=Δ
3
13
2
12
1
111 x
TxT
xTF
total
V
xxxΔ
ΔΔΔ 321 (6.14)
Se VΔ for o elemento diferencial de volume, sua massa será obtida através de m = ρ VΔ ,
onde ρ é a densidade de massa [kg/m3]. Assim, aplicando-se a lei de Newton (força = massa ×
aceleração, sendo aceleração = 21
2 / tu ∂∂ ), vem:
∂∂+
∂∂+
∂∂=Δ
3
13
2
12
1
111 x
TxT
xTF
total
VΔ = ρ VΔ 21
2
tu
∂∂ (6.15)
a qual constitui a lei de Newton na forma pontual.
Pode-se mostrar que, para uma direção "i" arbitrária, (6.15) torna-se
180
2
2
3
3
2
2
1
1
tu
xT
xT
xT iiii
∂∂=
∂∂+
∂∂+
∂∂ ρ (6.16)
ou então,
= ∂
∂=∂∂3
12
2
j
i
j
ij
tu
xT
ρ 2
2
tu
xT i
j
ij
∂∂=
∂∂
ρ , j=1,2,3 (6.17)
sendo j um índice repetido.
_________________________________________________________________________
Exemplo 6.2: Deslocamento longitudinal Considere-se uma onda elástica propagando-se em meio isotrópico na direção x1 e polarizada
nesta mesma direção, tal que o vetor deslocamento de partículas seja (notação de fasor girante):
−
=11
1
xKtjeUuaω
1x̂ = 111 ˆ),( xtxu (longitudinal!)
onde U1 é a amplitude, ωa é a frequência angular e K1 é a constante de fase da onda. As
componentes de strain são calculadas como
1111
111
111 ujK
xKtjeUjKxuS
a−=
−−=
∂∂=
ω
e 01223133322 ===== SSSSS (verificar isto!)
Desta forma, a lei de Newton conduz a (para i=1, direção 1x̂ ):
21
2
3
13
2
12
1
11
tu
xT
xT
xT
∂∂=
∂∂+
∂∂+
∂∂
ρ
Por outro lado, da lei de Hooke (6.6) [ou (6.9)], deduz-se que
111112161315231433132212111111 222 ScScScScScScScT =+++++=
e onde 3322 ,TT não interessam no momento. Além disso, 0231312 === TTT , e assim, obtém-se
12)(
12
21
211)( ueUj
tu
axKtj
aa ρωωρρ ω −==
∂∂ −
Substituindo-se as informações acima na expressão de ...)/( 111 +∂∂ xT , obtém-se
181
12
12
21
2
12
11112
111
1111111
1111
111
1
1111
1
11
||||
))((
uutuuKcuKc
xKtjeUjKjKcxKtjeUjK
xc
xSc
xT
aa
aa
ρωρωρ
ωω
−=−=∂∂
=−=−=
−−−=
−−
∂∂=
∂∂
=∂∂
( ) ( ) 0|| 12
112
112
112
1 =−=− ucKucK aa ρωρω Para que esta equação possua solução não trivial ( )01 ≠u , o termo entre parênteses deve ser
nulo. Daí, obtém-se
ρω 11
1
cK
v aL ==
correspondente à velocidade de fase da onda longitudinal (não confundir com velocidade de
partículas).
Exemplo 6.3: Onda transversal Seguindo um procedimento similar ao do exemplo anterior, agora para uma onda transversal
212
2 x̂xKtjeUu
a
−
=ω
pode-se mostrar que a velocidade de fase será
ρω
21211
2
ccK
v aT
−==
(deixa-se a cargo do leitor, como exercício, a tarefa de demonstrar esta equação). _________________________________________________________________________
Comparando-se as expressões resultantes para as velocidades das ondas longitudinal e
transversal, observe-se que vT < vL para um mesmo material e mesma direção de propagação.
Na Tabela 6.1 apresentam-se alguns valores de velocidades de ondas elásticas
longitudinais e transversais. Deve ser lembrado que em meios líquidos invíscidos (sem
viscosidade) só existe a possibilidade de propagação de ondas longitudinais, uma vez que não
suportam forças de cisalhamento.
182
Tabela 6.1 – Propriedades mecânicas de materiais.
Material λ(μm) n ρ (g/cm3) vL (km/s) vT (km/s) Quartzo-fundido 0,63 1,46 2,2 5,95 3,76 H20 0,63 1,33 1,0 1,5 - LiNbO3 , longitudinal 0,63 2,2 (ne) 4,7 6,57 [11-20] - LiNbO3 360Y - - 4,7 7,36 - LiNbO3 Y-cut - - 4,44 LiNbO3 X-cut - - 4,8 LiTaO3 , longitudinal 0,63 2,18 (ne) 7,54 6,19 [0 0 1] -
6.2.5 Relações de Similaridade
Nesta seção discute-se a similaridade entre a onda acústica e a onda eletromagnética.
Considere-se o caso unidimensional, de uma onda acústica longitudinal que se propaga na
direção x2, conforme mostrado na Fig. 6.12.
x1
x2
x3
0
Ka
Figura 6.12 – Onda acústica plana, ilimitada e longitudinal.
As seguintes relações devem ser obedecidas (em apenas uma dimensão):
tuva ∂
∂= 2 22
2
tu
tva
∂∂
=∂
∂ (6.18 d)
2
22 x
uS∂∂= (6.18 b)
2ScT = (6.18 c)
2
2
22
2
2
22
2
2
22
2
22
2
2
)/(t
cTtS
xu
txT
tu
tv
xT a
∂∂=
∂∂=
∂∂
∂∂=
∂∂
∂
∂=∂
∂=∂∂ ρρρρρ (6.18 a)
onde c, a constante elástica do meio, não deve ser confundida com a velocidade da luz no vácuo.
Uma relação similar pode ser obtida para a velocidade de partículas, va . Assim,
183
02
2
22
2
=∂∂−
∂∂
tT
cxT ρ (6.19 a)
02
2
22
2
=∂∂−
∂∂
tv
cxv aa ρ (6.19 a)
O leitor deve comparar as equações de onda (6.19 a-b) com as equações de Helmholtz do
eletromagnetismo, em termos de campos (E, H) ou de potenciais (tensão V, corrente I) [5]:
02
2
22
2
=∂∂−
∂∂
tE
xE με ou 02
2
22
2
=∂∂−
∂∂
tVLC
xV (6.20 a)
02
2
22
2
=∂
∂−∂∂
tH
xH με ou 02
2
22
2
=∂∂−
∂∂
tILC
xI (6.20 a)
Isto evidencia que as grandezas mecânicas T e va satisfazem equações formalmente equivalentes
àquelas obedecidas pelas grandezas eletromagnéticas (E, H) [ou (V, I), no caso de linha de
transmissão – LT, sendo V=V(x2,t) e I=I(x2,t) as ondas de tensão e de corrente, respectivamente].
Além disso, observa-se uma analogia entre μ (ou L) com ρ, e, entre ε (ou C) com 1/c. Esta
analogia, contudo, não é completa pois uma onda eletromagnética não pode ser longitudinal.
Por similaridade com a impedância intrínseca (2.62), ou seja, η=E/H (em caso de
campos), ou impedância característica, Z0=V/I (em caso de LT) [5], dos casos eletromagnéticos,
pode-se definir uma relação matemática equivalente denominada de impedância acústica:
aa v
TZ −= (6.21)
onde tuva ∂∂= / é a velocidade das partículas e cuja unidade é [kg/m2s ou rayls]. A necessidade
do sinal algébrico (−) deve ficar mais evidente a partir do exemplo a seguir.
_____________________________________________________________________________
Exemplo 6.4: Considere-se uma onda acústica longitudinal dada por (fasor girante)
222 ˆ)](exp[ xxKtjUu aa −= ω
onde ρω // 11cKv aaL == e que se propaga num meio isotrópico.
a) Calcular a impedância acústica Za.
b) Determinar a expressão do comprimento de onda acústico Λa.
184
Solução: a) A única componente de stress não nula é
22222222222222222 )](exp[/ uKjcxKtjUKjcxucScT aaaa −=−−=∂∂== ω
(surgiu um sinal negativo no stress). Por outro lado, a velocidade das partículas é dada por:
2222 )](exp[ ujxKtjUjt
uv aaaaa ωωω =−=∂
∂=
Assim, sendo ρω //1/1/ 11cvK Laa == para 2211 cc = , calcula-se a impedância acústica (6.21):
La
a
aa vccc
ccK
vTZ ρρρ
ρω=====−= 112222
2222
22
/1
onde ρ/11cvL = é a velocidade da onda transversal. Note-se que, se não fosse usado o sinal (−)
em (6.21), Za resultaria negativa, o que não é possível (por definição).
O leitor deve comparar o resultado acima com aquele do caso elétrico no qual η=μ.vp (ou
então, pLvZ =0 , para o caso de LT), onde vp é a velocidade de fase da onda eletromagnética [5].
b) Para o cálculo do comprimento de onda, calcula-se primeiramente a velocidade de fase da
onda acústica, a partir da fase instantânea total do campo acústico (frente de onda)
2xKt aai −= ωφ = constante. Derivando esta relação em relação ao tempo, tem-se
a
aLpaa Kt
xvvt
xK ωω =∂
∂===∂
∂− 22 0
Por sua vez, derivando a fase instantânea em relação a x2 :
22
2
2
0)( xKKx
xKtx aia
aai Δ−=Δ−=∂−∂=
∂∂ φωφ
O comprimento de onda acústico (Λa) é definido como o espaço associado a uma diferença de
fase instantânea igual a 2π rad (ou então, −2π rad, indiferentemente):
a
La
Lapaaaaa f
vvfvK
K =Λ===ΛΛ−=−/2
2/
222π
πω
πππ
uma relação similar ao obtido no caso eletromagnético ( fvp /=λ ). ___________________________________________________________________________
185
Na Tabela 6.2 apresentam-se alguns valores de impedâncias acústicas para meios normalmente usados em dispositivos acústico-ópticos.
Tabela 6.2 – Propriedades acústicas de materiais. Material Direção de
propagação ρ [Kg/m3] vL [m/s] Za ×10-6 [kg/m2.s]
Quartzo X 2650 5740 15,2 LiNbO3 Z 4640 7330 34 LiNbO3 470 de Y 4640 6300 47
Quartzo fundido isotrópico 2200 5970 13,1 Acetona (300C) líquido 791 1158 0,916
Ar (200C) gás 1,21 340 411,4x10-6
Uma relação adicional, obtida por similaridade com o vetor de Poynting eletromagnético
( 2/*HES = , em módulo), refere-se ao vetor de Poynting acústico, Π [W/m2], cuja amplitude
é definida (na forma escalar) como:
*
21
avT−=Π (6.22)
onde tuva ∂∂= / é a velocidade das partículas. A necessidade do sinal algébrico (−) se deve à
similaridade com o caso eletromagnético (verificar isto!). Devido ao complexo conjugado em
(6.22), o valor de Π resulta sempre real, como deve ser o valor médio de uma dada grandeza.
No caso geral, considerando-se a natureza tensorial do stress T, as componentes do vetor
de Poynting acústico são obtidas por [2]:
*
21
jiji vT−=Π (6.23)
associado a um somatório no índice repetido j.
Por sua vez, a potência acústica Pa pode ser determinada multiplicando-se Π pela área,
A, através da qual ocorre o fluxo de energia. No domínio físico, Pa é calculada como:
AvTAP aa 21=Π= (6.24)
em módulo (para resultar em valor positivo).
Recordando-se que a velocidade de partículas da onda acústica é va, é calculada por
pa vStz
zu
tuv =
∂∂
∂∂=
∂∂= (6.25)
186
onde S é a componente de strain efetivo, associado ao stress efetivo ScT = , conclui-se que
(6.24) torna-se
AvSAvSScAvTAP Lpaa32
21
21
21 ρ===Π= (6.26)
onde (6.25) e ρ/2 cvL = foram usados.
Portanto, o vetor de Poynting acústico tem amplitude
32
21
La
a vSAP
S ρ===Π (6.27)
6.3 EFEITO PIEZOELÉTRICO
O efeito piezoelétrico linear é uma propriedade exibida por certos materiais, que se
manifesta através de uma polarização elétrica (geração de dipolos elétricos) quando o mesmo é
submetido a uma distribuição de tensão mecânica, ou inversamente, na forma de deformação
mecânica, quando é submetido a uma distribuição de campo elétrico. A partir de modelos
unidimensionais pode-se mostrar que o efeito piezoelétrico decorre da interação de forças de
Coulomb com forças de natureza elástica (restauradoras). Somente as classes cristalinas que não
exibem centro de simetria apresentam o efeito piezoelétrico [3].
Na Fig.6.13 ilustra-se o efeito piezoelétrico em cristais de quartzo (SiO2), cuja estrutura
atômica é constituída por uma hélice que se estende ao longo da direção Z (perpendicular à
página), com dois átomos de oxigênio (cargas negativas) e um de silício (carga positiva).
(a)
+
++
_ _
_
Y
X
(b)
+
++
_ _
_
____
++++
(c)
+
++
_ _
_
++++
____
(d) Figura 6.13 – Efeito piezoelétrico no quartzo para forças aplicadas na direção X. a) Estrutura
molecular. b) Estado natural. c) Efeito da compressão. d) Efeito da tração.
No plano XY os átomos formam um hexágono que, no estado natural, isto é, na ausência
de stress, tem carga total nula. Com isso, nenhum campo elétrico externo está presente. Por outro
187
lado, aplicando-se uma força de compressão/tração na direção X do cristal, desfaz-se o balanço
de cargas e a célula torna-se polarizada, gerando-se cargas elétricas externas nas faces dos
eletrodos mostrados na figura. O mesmo ocorre para forças aplicadas na direção Y, porém, nada
ocorre para forças aplicadas na direção Z.
Este modelo também pode ser utilizado para explicar o efeito piezoelétrico inverso, no
qual ocorre deformação do cristal quando campos elétricos externos são aplicados nas direções X
ou Y. Neste texto, ênfase especial é dedicada ao efeito inverso, para geração de ondas acústicas
em substratos transparentes. A magnitude dessa deformação é proporcional à intensidade do
campo elétrico aplicado.
As relações constitutivas em materiais piezoelétricos relacionam grandezas elétricas (E e
D) e mecânicas (S e T). É usual escolher T e D como grandezas independentes, e assim, denota-
se que T=T(S,E) e D=D(S,E). Quando o interesse é no efeito piezoelétrico linear, tais relações
podem ser deduzidas a partir da série de Taylor para duas variáveis:
EETS
STT
SE tetanconstetancons == ∂∂+
∂∂= (6.28 a)
EEDS
SDD
SE constanteconstante == ∂∂+
∂∂= (6.28 b)
Estas relações podem ser escritas de forma mais compacta se forem definidos os
seguintes coeficientes:
constante=∂∂=
E
E
STc (6.29 a)
constante=∂∂=
E
E
SDe (6.29 b)
constante=∂∂=
S
S
ETe (6.29 c)
constante=∂∂=
S
S
EDε (6.29 d)
Contudo, através de considerações termodinâmicas, é possível mostrar que eE = − eS = e, e
assim, conclui-se que [2]:
kijkklEijklij EeScT −= (6.30 a )
jSijjkijki ESeD ε+= (6.30 b )
188
onde Eijklc refere-se às constantes elásticas com campo elétrico constante ou nulo, S
ijε corresponde
à permissividade com deformação constante ou nula e ijke é o tensor piezoelétrico.
O tensor piezoelétrico ijke é de terceira ordem, e assim, somente materiais não centro-
simétricos exibem tal efeito. Para um dado material piezoelétrico, somente algumas das 27
componentes deste tensor são não nulas. Logo, apenas campos elétricos aplicados segundo
orientações específicas excitam tensões mecânicas, e vice-versa.
Matrizes de coeficientes piezoelétricos para vários tipos de cristais encontram-se listadas
no livro do Yariv [1]. Por exemplo, para o LiNbO3 tem-se (em notação de índices reduzidos):
−
=
000000
0000
][
22
15
15
33
3122
3122
ee
eeeeee
e (6.31)
onde e15=3,7 C/m2, e31=0,2 C/m2, e22=2,5 C/m2 e e33=1,3 C/m2.
Para excitar ondas elásticas em dispositivos do tipo volumétrico (bulk) utilizam-se
transdutores planares, na forma de placas delgadas de material pizoelétrico, conforme
esquematizado na Fig.6.14, as quais são em seguida coladas no substrato. Cavidade de O nda Estática
Filme metálicoLâm ina de material
pizoelétrico
R F
Rede/Casamento
E
Figura 6.14 – Transdutor piezelétrico thickness.
Neste arranjo, um gerador de RF alimenta o transdutor piezoelétrico, via rede de
casamento de impedâncias, a fim de evitar reflexões de potência de volta para a fonte. Quando a
189
frequência do gerador for igual à frequência de ressonância do transdutor, amplitudes elevadas
de vibração mecânica serão estabelecidas.
Os transdutores piezoelétricos operam no modo de vibração “thickness”, nas quais as
dimensões das faces (L e H) são muito superiores à da espessura (t). As lâminas de material
piezoelétrico podem ser cerâmicas, como no caso de PZT (Titanato Zirconato de Chumbo,
Pb[Zr(x)Ti(1-x)]O3), para operação sob frequências baixas (entre DC e algumas centenas de kHz).
Contudo, para operação em rádio-frequência (RF), as lâminas devem ser muito delgadas, e
tornam-se quebradiças no caso de PZT. Nestas situações, devem ser utilizadas lâminas cristalinas
obtidas através de polimento, como lâminas de quartzo ou de LiNbO3. Lâminas com t da ordem
de poucas dezenas de μm são típicas, sendo adequadas para operar com frequências acústicas
que vão desde dezenas de MHz até GHz.
As lâminas piezoelétricas são projetadas para excitar tanto ondas elásticas longitudinais
quanto transversais, dependendo da forma que são cortadas durante o processo de fabricação. Por
exemplo, para excitar ondas longitudinais com LiNbO3, elas devem ser orientadas conforme a
Fig.6.15 a), onde a lâmina é classificada como X-cut, enquanto que, para excitar ondas
transversais, são orientadas conforme a Fig.6.15 b), com lâmina 360 Y rotated.
(a)
(b)
Figura 6.15 - Cortes de cristal piezoelétrico. a) Para ondas transversais (X cut). b) Para excitar ondas elásticas longitudinais (360 Y rotated ).
___________________________________________________________________________ Exemplo 6.5: Considerando-se a propagação de uma onda acústica longitudinal em material
piezoelétrico sem cargas elétricas e com campo elétrico aplicado na direção de propagação
acústica, obter sua velocidade.
Solução: Seja zzKtjUu a ˆ)](exp[0 −= ω a onda acústica longitudinal propagando-se na
direção z (ou x3). Como o meio não possui carga elétrica, 0=∇ • D
, e assim, ocorre
190
0/ 33 =∂∂ xD , onde 3333 / xueED S ∂∂+= ε , obtida usando-se (6.30 b) ( 3333333 , eeeS === εε ).
Derivando-se D3 em relação à x3
23 3 3
23 3 3
0SD E uex x x
ε∂ ∂ ∂= + =∂ ∂ ∂
∂∂
∂∂−=
∂∂
3
3
33
3
xu
xe
xE
Sε
e daí, uKezKtjUKexE
aSaaS2
02
3
3 )](exp[ε
ωε
=−=∂∂
Por outro lado, a partir da definição de stress (6.24 a) para onda longitudinal:
3033
33 )](exp[ EezKtjKUjcEe
xu
cT aaEE −−−=−
∂∂
= ω
Derivando-se T3 em relação a x3 e aplicando-se a lei de Newton (6.17):
23
2
3
30
2
3
3 )](exp[tu
xEezKtjUKc
xT
aaE
∂∂=
∂∂−−−=
∂∂ ρω ujuKeeuKc aSa
E 222 )( ωρε
=−−
Substituindo-se u3 e procedendo-se a simplificações, obtém-se
2
22
aS
E
Kec ρωε
=+
Como a velocidade de fase de uma onda plana é dada por aL Kv /ω= , conclui-se que
2/12
1
+= SE
E
L cecvερ
_____________________________________________________________________________
O resultado do exemplo anterior permite escrever a velocidade da onda acústica
longitudinal em meio piezoelétrico em termos do constante de acoplamento eletromecânico k,
como
2/12 ]1[ kcvE
L +=ρ
(6.32)
onde
SEcekε
22 = [ adimensional ] (6.33)
válido para materiais piezoelétricos.
Se o meio for isotrópico, e = 0, 1133 cc E = k = 0 ρ11cvL = , como esperado.
191
6.3.1 Transdutores piezoelétricos
Uma forma de se excitar ondas acústicas numa célula Bragg volumétrica é através de
transdutores piezoelétricos, como o mostrado na Fig.6.16 a). Sob o ponto de vista circuital, os
transdutores são semelhantes a trechos de linhas de transmissão curto-circuitadas, atuando como
cavidades ressonantes. O transdutor piezoelétrico pode ser analisado como um dispositivo de três
acessos, como mostrado na Fig.6.16 b): os acessos (1) e (2) são acessos acústicos, enquanto o
acesso (3) é um acesso elétrico. Considera-se que os eletrodos metálicos sejam delgados o
suficiente (filme fino) para se comportarem acusticamente como um curto-circuito. Além disso,
supõe-se que a impedância acústica da camada de colagem seja aproximadamente igual à do
substrato.
eletrodos delgados
materialpiezoelétrico
camada decolagem
sinal deRF
ondaacústica
substrato
(a)
lâminapiezoelétrica
meio (a) meio (b)
Za, va Zb, vb
acesso (1) acesso (2)
acesso (3) (b)
Figura 6.16 – Excitação de ondas elásticas num substrato. a) Na célula Bragg, b) Representação por linha de transmissão.
Esquematicamente, o transdutor pode ser comparado ao dispositivo de três acessos
mostrado na Fig.6.17 a), dado em termos de grandezas elétricas.
ZI1 I2
I3
V1 V2
V3
(a)
z=0 z=Lvz(1) vz
(2)
F1 F2
I3 V3
secção=A
T3(z=L)T3(z=0)
Vz(z=L)Vz(z=0)
acesso (1) acesso (2)
acesso (3)
(b)
Figura 6.17 – Dispositivo de três acessos. a) Para circuito elétrico. b) Para circuito eletromecânico.
192
No projeto de um transdutor é comum empregar-se a força mecânica em vez da tensão
mecânica. Utilizando-se uma analogia entre força mecânica e tensão elétrica, e, entre velocidade
de partículas e corrente elétrica, pode-se desenhar o arranjo da Fig.6.17 b). Inicialmente,
considera-se o caso de onda acústica longitudinal (só existe S33).
Comparando-se as Figs. 6.17 a) e b), e recorrendo-se à mesma orientação para a
velocidade nos acessos, obtém-se que as velocidades nos acessos (1) e (2) são: )0(1 == zvv z e
)(2 Lzvv z =−= . As forças mecânicas nas faces z=0 e z=L são F1 e F2, respectivamente. As
orientações das velocidades v1 e v2 são tais que as potências nos acessos (1) e (2) estejam
fluindo para dentro do transdutor. Assim )1(
1 TAF = (6.34 a) )2(
2 TAF = (6.34 b) onde
)0(3)1( =−= zTT (6.34 c)
)(3)2( LzTT =−= (6.34 d)
Os sinais negativos em (6.34 a-b) decorrem do fato que T3 é definido positivo quando a
força tem o mesmo sentido do vetor unitário normal à superfície. Neste texto, serão utilizadas as
notações T33, T3 e Tz indistintamente, o mesmo sendo válido para as demais grandezas. A notação
de fasor girante é empregada.
Como os eletrodos curto-circuitam o campo elétrico tangencial, tem-se que Ex=Ey=0 na
superfície externa ao metal. Assim, só existe componente Ez e, consequentemente, Dz,
correspondente a componente de deslocamento elétrico segundo o eixo Z na região de material
piezoelétrico. Se Jc for a densidade de corrente nas placas condutoras do transdutor, então, a
corrente elétrica no acesso (3) será AJI c=3 . Porém, da equação da continuidade (2.11) [4]:
cz J
tD =∂
∂ (6.35)
O material piezoelétrico sob consideração é dielétrico, de forma que
ADjAt
DI zz ω=
∂∂=3
AjIDz ω
3= (6.36)
Porém, no meio piezoelétrico, aplica-se (6.30 b) [onde só existem D3, E3 e S33], ou seja
193
zzs
z SeED .+= ε (6.37)
para 3333 , eeS == εε , e:
zv
jjv
zzuS zzz
z ∂∂=
∂∂=
∂∂=
ωω1)( (6.38)
Com isso,
][1zv
jeDE z
zsz ∂∂−=
ωε (6.39)
Substituindo-se Ez e Sz na relação constitutiva para stress, expressão (6.30 a) (só interessa T33),
resulta:
zvec
jDeeEScT z
sE
zszzzE
zz ∂∂++−=−= )(1 2
εωε (6.40)
para cE = cE3333 = cE
33.
A seguir, são introduzidos os novos parâmetros
seh
ε= (6.41 a)
)1()1( 222
kcc
ececc ESE
Es
ED +=+=+=εε
(6.41 b) [recorrendo-se a (6.33)] e assim, a partir de (6.38) e (6.40) obtém-se
zzD
zz
D
z DhScDhzv
jcT .−=−
∂∂
=ω
(6.42)
e, usando (6.36):
AjIh
zv
jcT z
D
z ωω3−
∂∂
= (6.43)
A aplicação da lei de Newton (6.17) conduz a
∂∂
∂∂=
∂∂
tu
txT 3
3
33 ρ zz vj
zT ωρ=
∂∂ (6.44)
Porém, de (6.42)
zDh
zSc
zT zzDz
∂∂−
∂∂=
∂∂
zSc
zT zDz
∂∂
=∂
∂ (ver a seguir) (6.45)
194
uma vez que, para um meio piezoelétrico sem cargas livres, ocorre 0=∇ • D
(atenção, não se
trata dos eletrodos do transdutor, mas do meio piezoelétrico) e, portanto, 0/ =∂∂ zDz . Assim,
comparando-se (6.44) e (6.45), conclui-se que zDz vj
czS ωρ1=∂
∂ . Substituindo-se este resultado
na derivada de S33 no tempo e recorrendo-se a definição de strain, zuS ∂∂= /333 , vem
zv
tu
zzu
tSj
tS z
z ∂∂
=
∂∂
∂∂=
∂∂
∂∂==
∂∂ 3333 ω z
z Sjzv ω=
∂∂
zSj
zv zz
∂∂=
∂∂ ω2
2
)1(2
2
zDz vj
cj
zv ωρω=
∂∂ z
L
zzD
z vvz
vvcz
v2
2
2
22
2
2
0 ωρω +∂∂
=+∂∂ (6.46)
onde vL é a velocidade da onda longitudinal [ver Exemplo 6.5: ρ
)1( 2kcvE
L+=
ρ
Dc= ].
A velocidade das partículas vz deve satisfazer a equação de onda (6.46), e assim, pode ser
expressa da seguinte forma
)]cos()(sen[)( zNzMjzv aaz ββω += (6.47)
sendo M e N são constantes a serem determinadas em função das condições de contorno em z=0
e z=L, e onde βa é a constante de fase, com valor
La v/ωβ = (6.48)
Para z=0 tem-se v1=vz (z=0) [ver Fig. 6.17b)], e assim, Njv ω=1 . Por outro lado, para
z=L tem-se v2=−vz(z=L), e assim, )]cos()(sen[2 LNLMjv aa ββω +−= . Portanto,
)cos()(sen 12 LvLMjv aa ββω −−= (6.49)
Manipulando-se a equação (6.49), chega-se a
)(cot)sec(cos 12 LgvLvMj aa ββω −−= (6.50)
a qual permite relacionar v1 com v2.
Partindo-se de (6.43) e recorrendo-se a expressão que foi postulada para vz em (6.47),
tem-se (após algumas manipulações algébricas):
195
ωω
βω
jMj
cAj
IhzT aDz +−== 3)0( (6.51 a)
ωββω
βω
jLNLMj
cAj
IhLzT aaaD
z )](sen)cos([)( 3 −+−== (6.51 b)
Eliminando-se M e N em detrimento de v1 e v2, através do uso de (6.50), obtém-se
)](cot)sec(cos[)()0( 12
2/13 LgvLv
jc
AjIh
zT aa
D
z ββρω
+−−== (6.52 a)
)](cot)sec(cos[)()( 21
2/13 LgvLv
jc
AjIhLzT aa
D
z ββρω
+−−== (6.52 b)
A tensão elétrica V3, entre os eletrodos, é dada por
=L
zdzEV03 (6.53)
na qual, substituindo-se Ez dado em (6.39), usando-se (6.47) e levando-se em consideração as
expressões de v1 e v2, obtém-se
210
321
0
33 )( vhjvhj
CI
jvvj
eCj
IV s ωωωωεω
−−−=++= (6.54)
usando (6.41a), e
LAC
sε=0 (6.55)
é a capacitância do transdutor não submetido à stress (sem efeito “mocional”).
Em forma matricial, os resultados (6.34 a-b), (6.52) e (6.54) podem ser sintetizados como
−=
3
2
1
0
00
00
3
2
1
1//
/)(cot~)sec(cos~/)sec(cos~)(cot~
Ivv
Chh
hLgZLZhLZLgZ
jVFF
aa
aa
ωωω
ωββωββ
(6.56)
onde 00~ ZAcAZ D == ρ (6.57 a)
196
e DL cvZ ρρ ==0 (6.57 b)
sendo Z0 a impedância acústica do transdutor (ver Z0 do Exemplo 6.4, para meio isotrópico, e
ρ)1( 2kcv
E
L+=
ρ
Dc= ] do Exemplo 6.5).
6.3.2 Modelo Equivalente de Mason
Através da análise do sistema de equações (6.56), Mason (1948) propôs a representação
circuital mostrada na Fig.6.18, onde a relação de transformação é N=h C0. Estimula-se o leitor a
conferir esta equivalência. Para isto, a relação cotg(x) = cossec(x) − tg(x/2) pode ser útil.
Figura 6.18 – Circuito equivalente de Mason
No caso de material não-piezoelétrico o coeficiente piezoelétrico é nulo, ie, e=0, e então,
h=0, ou seja, N=0. Com isso, o secundário do transformador é aterrado e o transdutor torna-se
indiferente a V3 e I3. Tal dispositivo constitui uma simples linha de retardo acústica [6].
Para o caso particular mostrado na Fig.6.19, nas quais o transdutor encontra-se entre o
vácuo (F1=0) e um meio com impedância acústica Z2, onde 222~ vZF −= , mostra-se que a
impedância elétrica Z3 é dada por
+−
−++−
−+==)cos()(
))cos(1.(2
)cos()(
)(sen)/()(
11
0
2
0
2
02
0
2
03
3
3
LZZjLsen
L
LZZjLsen
LZZjLC
kCj
ZIV
aa
a
aa
a
a
T
ββ
β
ββ
ββωω
(6.58)
onde 2
22
1 kkkT +
= (6.59)
197
é o fator de acoplamento eletromecânico.
Z2
V3I3
vácuoZ1=0
(a)
F2= -Z2V2
Vg
~
F1= 0
rede deCasamento
(X)
Rg
(b)
Figura 6.19 – Excitação de onda acústica num substrato. a) Estrutura física acústicas. b) Circuito equivalente e grandezas eletromecânicas.
Exemplo 6.6: Considere-se o caso de onda longitudinal propagando-se num substrato de
LiNbO3 em corte-X, excitada por um transdutor do mesmo material, porém, em 360 Y-rotated.
Desenhar a resposta em frequência do transdutor piezoelétrico
Solução: Neste caso o substrato e o transdutor estão bem casados (mesmo material),
constituindo um arranjo bastante utilizado em dispositivos acústico-ópticos. Para o transdutor
ocorre ρ= 4,6x103 kg/m3 e vL=7,4x103 m/s, o que conduz à seguinte impedância acústica (ver
Exemplo 6.4): LvZ ρ=0 =3,4x107 kg/(m2s) (ou Ns/m3 = rayls). Além disso, εr=40 e k2=0,25.
Figura 6.20 – Resposta em frequência do transdutor piezoelétrico.
198
Para o substrato ocorre ρ= 4,6x103 kg/m3 e vp=6,6x103 m/s (velocidade de fase), o que
conduz a pvZ ρ=2 =3x107 kg/(m2s).
Para um transdutor com espessura L=1,7 μm e área A=1mm × 1mm, tal que C0=6x10−13 F
desenhou-se, na Fig.6.20, os gráficos das partes real e imaginária de Z3 em Ω.
Conforme se observa, para esta geometria de transdutor, a ressonância ocorre em 2,7
GHz, a qual deve corresponder a frequência de operação da célula Bragg a ele associado.
Observa-se, também, a oscilação em terceira harmônica do dispositivo. Dentro de sua banda de
operação, a reatância do transdutor permanece capacitiva, como é característico de estruturas
onde Z2 /Z0 ≅ 1 [6].
_____________________________________________________________________________
6.3.3 Eficiência de transdução
A equação (6.58) evidencia que, sob o ponto de vista acesso elétrico (3), o transdutor
pode ser modelado por um circuito RLC série, como mostrado na Fig.6.21, onde Rg é a
resistência interna do gerador de RF.
~vg
Rg
C0
Ra(ω)
Xa(ω)
I3
V3
Figura 6.21 – Circuito ressonante RLC série equivalente do transdutor.
Com isso, pode-se escrever que
)(10
3 ωω aZ
CjZ += (6.60)
onde
)()()( ωωω aaa jXRZ += (6.61)
corresponde à impedância mocional do transdutor. Quando um transdutor é terminado por uma
carga acústica casada Z2=Z0, e tem Z1=0 (air-backed), deseja-se que toda a potência elétrica de
199
entrada apareça como potência acústica na carga acústica, a qual é a única carga resistiva
presente. Na frequência central ω=ω0 o transdutor exibe uma reatância mocional nula. Contudo,
se kT<<1, a resistência Ra0=Ra (calculada em ω0) é muito menor que 1/ωC0, e assim, o transdutor
tende a apresentar uma carga altamente reativa para a fonte de entrada. Isto justifica o
comportamento ressonante revelado na Fig.6.20.
Para um transdutor carregado e operando na frequência central ω0, ocorre uma
ressonância paralela se L=Λ/2, ou seja, quando βaL = π. Substituindo esta condição em (6.58),
obtém-se a resistência mocional
2
0
00
2
04
ZZ
CkR T
a πω= (6.62)
A máxima potência média disponível, fornecida pelo gerador de RF mostrado no circuito
da Fig.6.21, ocorre quando este é terminado com carga Zg, e vale:
g
gin R
VP
8
2
= (6.63)
A potência média entregue ao transdutor, corresponde àquela desenvolvida através de Ra,
isto é
2
230IRP a
L = (6.64)
Assim, calculando-se a eficiência ηT, a razão entre PL e Pin, resulta
200
20
0
)/1()(4
CRRRR
PP
ag
ag
in
LT ω
η++
== (6.65)
Diferenciando ηT em relação a Rg e igualando-se o resultado a zero, pode-se obter o valor
de ηT máximo:
200
20
0max,
)/1(2
CRRR
aoa
aT
ωη
++= (6.66)
Quando Ra0<<(1/ωC0)2, tal qual com 12 <<Tk , então ηT tem máximo com 000 /1 CRa ω≈ , cujo
valor é 000, 2 CRaMAXT ωη ≈ .
200
_______________________________________________________________________
Exemplo 6.7: Transdutor de ZnO em safira
Considere-se um transdutor de ZnO com espessura L=3,1 μm operando em 1 GHz, com subtrato
de safira. Para onda longitudinal tem-se 0~Z =(36x106×A) kg/m2-s e 2
~Z =(44,3x106×A) kg/m2-s,
onde A é a área do transdutor. Se a transdutor é projetado para ter uma impedância reativa de 50
Ω tal que proporcione uma melhor eficiência com um gerador de 50 Ω, sua capacitância deve ser
de C0=3,2 pF. Com uma permissividade εS=8,8 ε0, a área do transdutor é A=0,13 mm2. Dado
kT=0,28, calcula-se Ra0=4 Ω, e daí, ηT=0,16.
________________________________________________________________________
A fim de melhorar ηT, pode-se recorrer a uma indutância série externa, X, para sintonizar
o circuito, tal que
20
2 )/1()(4
CXXRRRR
PP
aag
ag
in
LT ω
η−+++
== (6.67)
numa frequência arbitrária ω. A função dessa reatância X é cancelar o efeito de 1/ωC0, na
frequência central ω0. Para maiores informações sobre transdutores piezoelétricos e suas
aplicações, sugere-se consultar as referências [2] e [6].
6.4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1] Yariv, A. & Yeh, P., Optical Waves in Crystals, New York, John Wiley & Sons, 1984.
[2] Kino, G., Acoustic Waves: Devices, Imaging and Analog Signal Processing, Englewood
Cliffs, New Jersey, Prentice Hall, Inc., 1987.
[3] Nelson, D.F., Electric, Optic, and Acoustic Interaction in Dielectrics, John Wiley & Sons,
1979.
[4] Dieulesant, E. & Royer, D., Elastic Waves in Solids, New York, John Wiley & Sons,
1980.
[5] Collin, R.E., Foundations for Microwave Engineering, 2nd. edition, Wiley-IEEE Press,
2000, 994p.
[6] Rosenbaum, J.F., Bulk Acoustic Wave Theory and Devices, Artech House, 1988.