Apostila do novo testamento

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FACULDADE EVANGÉLICA DO NORDESTE BRASILEIRO PANORAMA DO NOVO TESTAMENTO Marcos Vinícius Souza do Nascimento PICOS - PIAUÍ

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FACULDADE EVANGÉLICA DO NORDESTE BRASILEIRO

PANORAMA DO NOVO TESTAMENTO

Marcos Vinícius Souza do Nascimento

PICOS - PIAUÍ

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PANORAMA DO NOVO TESTAMENTO

A IMPORTÂNCIA DO NOVO TESTAMENTO

A designação de Novo Testamento dada à segunda parte da Bíblia

vem do latim Novum Testamentum que vem a ser uma tradução do grego

Καινὴ Διαθήκη (Hê Kainê Diathêke, aportuguesando). Esta expressão

grega era usada geralmente para designar ―uma última vontade, ou

testamento‖, como o indica a tradução latina, sendo certo, contudo,

que esta tradução não dá exaustivamente todo o seu significado. O que

significava realmente era uma disposição feita por uma parte que a

outra parte podia aceitar ou rejeitar, mas nunca alterar; essa

disposição, quando fosse recebida, obrigava pelas suas cláusulas as

duas partes.

O Novo Testamento é, portanto, o conjunto de livros onde está

registrado o estabelecimento e o caráter das novas negociações de

Deus com os homens por meio de Cristo, contendo as condições, que o

homem pode aceitar ou rejeitar, mas nunca alterar, e, quando este as

aceita, tanto ele como Deus ficam obrigados a cumprir as suas

exigências.

Os escritores do Novo Testamento estavam convencidos de que só

em Cristo se encontrava o significado da história judaica e do Velho

Testamento. Por outras palavras, que o desenrolar dos acontecimentos

em Israel, desde o seu início e através de todos os tempos, bem como

a composição do Velho Testamento foram orientados por Deus, tendo em

vista a encarnação. As deduções desta doutrina levaram, naturalmente,

à idéia teológica fundamental pela qual se entende a revelação. A

idéia é esta: Deus, Criador Onipotente, que ―faz todas as coisas

segundo o conselho da Sua vontade‖ (Ef 1.11), previu a queda do

gênero humano pelo pecado. Determinou, então, glorificar-Se através

da Igreja; e, para isso, designou Seu Filho, que iria salvá-la, na

qualidade de Ministro e Medianeiro de Deus. A história do mundo foi,

e será sempre, nada mais nada menos que a execução do Plano divino,

infalível sem dúvida, nos seus objetivos. Desde que o Filho de Deus

apareceu para instaurar o Seu reino messiânico, foi enviado por Deus

o Espírito Santo cuja missão no mundo era não só completar a

revelação já começada na terra, em conformidade com os desígnios

divinos, mas também, através da fé, conduzir o Seu povo à salvação

prometida. A revelação do Plano de Deus era, pois, completada pelo

Espírito, que o deu a conhecer aos apóstolos. Mas a plena execução só

em Cristo se realizará com o Seu ―aparecimento‖ (Gr.: parousia),

quando a Igreja obtiver a sua perfeição.

Esta é, a traços largos, a grande importância do Novo

Testamento: A revelação. Embora mais explícita nas Epístolas Paulinas

(cfr. Rm 8.28-39; Ef 1.3-14; etc.) e no Evangelho de S. João (cfr. Jo

6.37-45; Jo 10.14-18; Jo 10.27-29; Jo 16.7-15; 17), não é difícil

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notá-la mais ou menos em todos os livros, podendo ser reduzidos a

três principais revelações com seus respectivos textos:

1. REVELAÇÃO DA PESSOA DE CRISTO - O Filho é a imagem do Pai (II Co

4.4; Cl 1.15; Hb 1.3), sendo assim a perfeita revelação do Pai aos

que têm olhos para ver (Jo 1.18; Jo 14.7-11). Toda a ―plenitude‖ de

Deus habita no Filho encarnado (Cl 1.19; Cl 2.9). Todos aqueles que

compreendem o significado da vida e morte de Cristo, reconhecerão os

desígnios ou, ―a sabedoria‖ de Deus, relativos à salvação da Igreja

(Cl 2.2-3; I Co 1.24; I Co 2.7-10). Ninguém pode compreender a

revelação sem uma luz espiritual vinda do alto (Jo 3.3-12; Jo 6.44-

45; Mt 16.17; Gl 1.16).

2. REVELAÇÃO DO PLANO DIVINO - O Plano divino para a salvação do Seu

Povo escolhido, tanto judeu como gentio, era ―o mistério‖, a divina

―sabedoria‖, que Deus concebeu antes da criação, mas conservou oculta

até ao tempo dos apóstolos. Só então veio a lume o verdadeiro

significado da eleição e da história de Israel, e bem assim da

revelação do Velho Testamento. A finalidade de Deus foi sempre, não a

salvação de uma das muitas nações do mundo, mas a criação duma nova

nação, cujos membros seriam recrutados de todas as outras, e

passariam por um novo nascimento espiritual (cfr. I Pe 2.9-10). Os

regenerados seriam glorificados, tal como o seu Chefe (―as primícias‖

do novo povo, I Co 15.20,23), de sorte que, ao chegar ao Céu no Seu

corpo glorioso, fosse um penhor e uma garantia para os que um dia

partilhassem com Ele dessa glória. Várias vezes, Paulo alude à

revelação deste mistério (Ef 1.8-12; Ef 3.3-11; I Co 2.7-10; Rm

16.25-26; Rm 11.25-36; II Tm 1.9-11). A fonte desta revelação é Deus;

o Mediador, Cristo (Gl 1.12; Ap 1.1); o veio de transmissão, o

Espírito Santo (I Co 2.10-12; II Co 3.15-18; II Co 4.6; Ef 3.5). Para

que pudesse ser transmitido intato à Igreja, o Espírito inspirou as

palavras do testemunho apostólico (I Co 2.13), tal como inspirou as

palavras de Cristo (Jo 3.34; Jo 12.48-50), de maneira a formarem um

―corpo de doutrina‖ ou ―modelo‖ (Rm 6.17; II Tm 1.13). Esta é, sem

dúvida, a ―sã doutrina‖ (I Tm 1.10; 6.3; II Tm 4.3; Tt 1.9; Tt 2.1),

a ―tradição‖ apostólica (II Ts 2.15; II Ts 3.6), a orientadora da fé

e a vida das Igrejas.

3. REVELAÇÃO DO FIM DOS TEMPOS – Além do próprio Jesus profetizar

acerca do fim nos evangelhos, Deus manifesta os Seus desígnios

através de palavras e de ações; e cada uma destas ações, que marca um

passo além no Seu Plano da história redentora pode chamar-se,

apropriadamente, uma ―revelação‖. O Novo Testamento conhece duas

revelações deste gênero, que devem ainda realizar-se: a aparição do

anticristo (II Ts 2.3-8) e a parousia de Jesus (I Co 1.7; II Ts 1.7-

10; I Pd 1.7,13). Esta última encerra a história e precede o dia do

Juízo Final. Cristo revelará, então, os eternos desígnios de Deus

relativos aos impenitentes e aos santos, a manifestação da ira para

aqueles e a glória para estes (Rm 2.5-10; Rm 8.18; I Pd 1.5).

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A NOVA NOMENCLATURA: O SEGUNDO TESTAMENTO

Vários livros foram escritos durante a última metade do primeiro

século depois de Cristo. A recém-formada Igreja Cristã usava as

Escrituras do Antigo Testamento como base para a sua fé, além disso,

era dada grande importância às palavras de Jesus e os ensinos dos

apóstolos. Dessa forma não passaram muito tempo para que os

Evangelhos passassem a ser usados juntamente com o Antigo Testamento,

considerado como o Segundo Testamento.

A autoridade dos apóstolos é plenamente confirmada. João

declara: ―o que temos visto e ouvido anunciamos também a vós outros‖

(I Jo 1.3); Pedro diz que foram ―testemunhas oculares de sua

majestade‖ (II Pd 1.16); e lemos a respeito dos primeiros crentes: ―E

perseveravam na doutrina dos apóstolos e na comunhão‖ (At 2.42).

O cânon, lista dos volumes pertencentes a um livro autorizado,

surgiu como um reforço à garantia da unidade centralizada, sem que

haja distorções ou contradições entre os livros. As pessoas supõem,

equivocadamente, que o cânon foi estabelecido pelos concílios

eclesiásticos. Não foi assim, pois os vários concílios que se

pronunciaram sobre o problema do cânon do Novo Testamento apenas os

tornavam públicos, porque, já tinham sidos aceitos amplamente pela

consciência da Igreja. O desenvolvimento do cânon foi um processo

demorado, basicamente encerrado em 175 d.C., exceto por uns poucos

livros cuja autoria era ainda discutida.

Algumas razões de ordem prática tornaram necessário que a Igreja

desenvolvesse a relação de livros que deviam compor o Novo

Testamento. Hereges como Marcião estavam formando seu próprio cânon

das Escrituras e levando o povo ao erro. Os cristãos perseguidos não

estavam dispostos a arriscar sua vida por um livro se não estivessem

certos de que ele integrava as Escrituras Sagradas. Como os apóstolos

estavam saindo de cena, havia necessidade de alguns registros que

seriam reconhecidos como autorizados e dignos de uso na adoração.

OS TESTES USADOS PARA DETERMINAR A CANONICIDADE

Os seguintes princípios foram usados para determinar a posição

de um livro no cânon do Novo Testamento:

1 – Apostolicidade. O livro foi escrito por um dos apóstolos, ou por

alguém próximo dos apóstolos. Esta questão tinha especial importância

com respeito aos Evangelhos de Marcos e Lucas e os livros de Atos e

Hebreus, já que Marcos e Lucas não se encontravam entre os doze e a

autoria de Hebreus era desconhecida.

2 – Conteúdo espiritual. O livro estava sendo lido nas igrejas e seu

conteúdo era um meio de edificação espiritual? Este era um teste

muito prático.

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3 – Exatidão doutrinária. O conteúdo do livro era doutrinariamente

correto? Qualquer livro contendo heresia, ou contrário aos livros

canônicos já aceitos eram rejeitados.

4 – Uso do livro. O livro fora universalmente reconhecido nas

igrejas, sendo amplamente aceito e citado pelos Pais da Igreja?

5 – Inspiração divina. Ele dava verdadeira evidência de inspiração

divina? Este era o teste básico, e tudo teria que convergir para este

ponto.

A TRADUÇÃO MANUSCRITA

A tradição manuscrita do Novo Testamento é extremamente

complexa, dada a enorme quantidade de manuscritos gregos que chegaram

até nós: cerca de 5.700, entre completos e incompletos. As diferenças

entre um manuscrito e outro são consideráveis e, de modo geral, não

se pode dizer qual deles é o mais correto.

Os manuscritos mais antigos, escritos entre os séculos II/VI,

são tradicionalmente (mas não muito acuradamente) divididos em dois

grupos: os de texto "bizantino", mais recentes, e os de texto

"alexandrino", mais antigos. Há, ainda, numerosos papiros com

passagens mais ou menos extensas do texto.

UMA VISÃO PANORÂMICA DO NOVO TESTAMENTO

O Novo Testamento tem sido dividido em quatro grupos: os

Evangelhos, História, Cartas, e Profecia.

OS EVANGELHOS:

Há quatro livros nos Evangelhos. Os nomes destes livros são:

Mateus Lucas

Marcos João

Estes livros registram a vida, morte e ressurreição de Jesus.

Seu propósito é levá-lo a crer que Ele é o Cristo, o Filho de Deus.

João 20.31 que declara este propósito.

O LIVRO DE HISTÓRIA:

Atos dos Apóstolos

Há um livro de história no Novo Testamento, o livro de Atos dos

Apóstolos. Este livro conta como a Igreja começou e cumpriu a

comissão de Cristo para estender o Evangelho por todo o mundo.

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AS CARTAS:

Há 21 cartas no Novo Testamento. Os nomes destas cartas são:

Romanos Tito

I e II Coríntios Filemom

Gálatas Hebreus

Efésios Tiago

Filipenses I e II Pedro

Colossenses I, II e III João

I e II Tessalonicenses Judas

I e II Timóteo

As cartas são dirigidas a todos os crentes. Seu propósito é

guiá-los na vida e ajudá-los a fazer o que Jesus ordenou. Romanos 12

é um bom exemplo de seu ensino.

PROFECIA:

Apocalipse

O Apocalipse é o único livro de profecia no Novo Testamento.

Conta sobre a vitória final de Jesus e Seu povo. Seu propósito é

animá-lo a continuar vivendo como um cristão deve viver até o fim dos

tempos. Sua mensagem se resume em Apocalipse 2.10.

DATAS PROVÁVEIS DA ESCRITA DOS LIVROS DO NOVO TESTAMENTO

É impossível precisar as datas em que os livros do NT foram

escritos, uma vez que raramente há menção de datas ou alusões nos

seus livros que permitam identificá-los com eventos históricos.

A tabela a seguir é uma estimativa, de acordo com as melhores

fontes disponíveis. Ela apresenta os eventos que ocorreram no

primeiro século, os livros que lidam com esses eventos e a época em

que os livros foram publicados.

Só lembrando que as datas estão relacionadas diretamente com os

eventos, e que nem sempre coincidirá com a data da escrita do livro,

como é o caso dos evangelhos.

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RESUMO DOS LIVROS DO NOVO TESTAMENTO

Mateus: Enfatiza a Jesus Cristo como o Rei e se dirige a todos os

judeus.

Marcos: Enfatiza a Jesus Cristo como o Servo de Deus e se dirige a

todos os Romanos.

Lucas: Apresenta a Jesus Cristo como o ―Filho do Homem‖, o homem

perfeito e Salvador dos homens imperfeitos.

João: Apresenta a Jesus em Sua posição como o Filho de Deus.

Atos: O único livro de história do Novo Testamento registra o

crescimento primitivo da cristandade desde o tempo do retorno de

Cristo ao céu até o encarceramento de Paulo em Roma. O livro cobre

aproximadamente 33 anos e dá ênfase à obra do Espírito Santo.

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Romanos: Uma apresentação do Evangelho que enfatiza a salvação

exclusivamente pela fé.

I Coríntios: Escrito para corrigir erros de conduta cristã na igreja

local.

II Coríntios: Fala do verdadeiro ministério do Evangelho, da

mordomia, e da autoridade apostólica de Paulo.

Gálatas: Trata com o erro de mesclar lei e fé. O tema é

exclusivamente a justificação pela fé.

Efésios: Anima aos crentes com respeito à sua posição em Cristo.

Filipenses: Enfatiza a alegria da unidade cristã.

Colossenses: Trata com o erro do ―Gnosticismo‖, um ensinamento falso

que negava a Jesus como o verdadeiro Filho de Deus e verdadeiro Filho

do homem. O livro também enfatiza a Jesus como cabeça da igreja.

I Tessalonicenses: Aconselha sobre o viver cristão e enfatiza o

retorno de Jesus.

II Tessalonicenses: Instrução extensa sobre o retorno do Senhor e

como o conhecimento disso deve afetar a vida cotidiana.

I Timóteo: Enfatiza a doutrina legítima, o governo ordenado da

igreja, e princípios para guiar a igreja pelos anos a vir.

II Timóteo: Descreve o verdadeiro servo de Jesus Cristo. Também

adverte sobre a apostasia (declive espiritual) que já havia começado.

Apresenta a Palavra de Deus como o remédio para corrigir todo o erro.

Tito: A carta de Paulo a um jovem ministro chamado Tito que estava

servindo a Deus na ilha de Creta. Enfatizam-se a doutrina e uma vida

piedosa.

Filemom: Intercessão de Paulo por um escravo fugitivo de um cristão

rico de Colossos. Ilustra a intercessão de Jesus em nome dos crentes

que uma vez foram escravos do pecado.

Hebreus: Explica a superioridade da Cristandade sobre o Judaísmo.

Apresenta Jesus como o Grande Sumo Sacerdote e o mediador entre Deus

e o homem.

Tiago: Ensina que a verdadeira fé se evidencia pelas obras, ainda que

a salvação seja exclusivamente pela fé.

I Pedro: Uma carta de consolo e estímulo aos crentes, especialmente

aqueles sofrendo ataques espirituais de fora da igreja através dos

incrédulos.

II Pedro: Uma advertência contra os ataques espirituais de dentro da

igreja. Por exemplo, falsos mestres que já tinha se ―infiltrado‖ na

igreja.

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I João: Escrito para combater o gnosticismo que negava a posição de

Cristo como o Filho de Deus e Filho do Homem. O livro enfatiza o

companheirismo e amor entre os crentes e assegura aos verdadeiros

crentes sobre a vida eterna.

II João: Adverte contra qualquer compromisso com o erro doutrinário e

enfatiza que a verdade deve ser guardada em amor.

III João: Adverte do pecado de negar-se à comunhão com aqueles que

são os verdadeiros crentes.

Judas: Outra advertência contra a apostasia e a doutrina falsa. O

tema é similar ao de II Pedro.

Apocalipse: Este livro profético fala dos eventos finais da história

mundial. Fala sobre as coisas que eram, é e que estarão no plano

futuro de Deus (Ap 4.22).

OS EVANGELHOS SINÓPTICOS

Os três primeiros evangelhos — Mateus, Marcos, Lucas — são

denominados sinópticos, do grego σύνοψις, "visão de conjunto",

porque, dada sua grande semelhança, podem ser dispostos em três

colunas paralelas para uma visão de conjunto.

Essa terminologia foi empregada, pela primeira vez, em 1583, por

Georg Siegel. A semelhança entre eles já havia sido detectada, no

entanto, muito antes, por Eusébio de Cesaréia(263/339). Os

três evangelhos contam as mesmas histórias sobre Jesus Cristo, na

mesma seqüência e quase que com as mesmas palavras. Eis o plano

geral:

A. Pregação de João Batista e batismo de Jesus; B. Ministério de Jesus na Galiléia; C. Viagem de Jesus a Jerusalém; D. Paixão, morte e ressurreição de Jesus.

O nome dos evangelistas se conservou através de tradição muito

posterior à época da composição dos textos. Os autores são, na

realidade, muito pouco conhecidos, pois não há informações fidedignas

sobre eles. O evangelho de "Marcos", escrito entre 65 e 70, é o mais

antigo dos evangelhos sinópticos e fonte provável dos textos de

"Mateus" e "Lucas", escritos entre 70 e 90. "Mateus" e "Lucas"

recorreram também, aparentemente, a uma outra fonte, hoje perdida,

apelidada de "Q" pelos eruditos.

Segundo a tradição, "Lucas" era médico e foi companheiro e amigo

de São Paulo; o grego do evangelho atribuído a ele é límpido e

elegante, bem diferente dos demais. Atribui-se a "Lucas", também,

o livro de Atos dos Apóstolos, composto entre 80 e 90, que relata a

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propagação da fé cristã entre os pagãos e a expansão da Igreja

através da atividade missionária de São Pedro e de São Paulo.

Até hoje há controvérsias sobre as fontes, autores, relações

literárias e causas das semelhanças entre os evangelhos de Marcos,

Mateus e Lucas (o problema sinóptico).

O PROBLEMA SINÓPTICO

Até o século XVII, a Bíblia era considerada absolutamente como

palavra ditada por Deus. Partindo do conceito de inspiração bíblica,

como ditado, ninguém duvidava de nada. Esta compreensão havia sido

tema de inevitáveis e incontáveis polêmicas interpretativas.

A partir de 1776, começou a ser despertada uma crítica do texto

bíblico, motivada pelos problemas levantados pelos filósofos

racionalistas. O racionalismo já estava influenciado pelo iluminismo,

defendendo a auto-suficiência do homem e começou por negar no

Evangelho tudo que era transcendental, restando assim pouca coisa.

Esta crítica causou grande constrangimento no meio do cristianismo.

O racionalismo queria demonstrar seu ponto de vista através da

crítica textual. O trabalho deles despertou os cristãos para fazerem

o mesmo, mas enfatizando o outro lado, ou seja, a defesa da fé. E

concluíram que a mesma critica literária tinha possibilidades de

ajudar a entender melhor o Evangelho. Contribuíram para isto os

progressos das novas ciências da psicologia e da arqueologia. Então

surgiu o método crítico-histórico, que começou a ser usado no sentido

positivo pelos teólogos cristãos.

Foi então, no século XVIII, descoberto o assim chamado problema

sinótico. O estudo crítico demonstrou que no texto dos evangelhos há

divergências e diferenças que evidenciam o trabalho do pessoal do

escritor, sem deixar de lado a inspiração divina. Desde então, os

exegetas se viram na contingência de considerar o Evangelho como um

livro escrito por homens, que têm suas qualidades e seus defeitos, e

estão sujeitos também à crítica.

O problema sinótico se funda na constatação de que os três

primeiros Evangelhos (Mateus, Marcos e Lucas) têm muitos aspectos em

comum; por outro lado, têm também muitas diferenças. As semelhanças

chegam a ser desde palavras a textos inteiros. As diferenças estão no

fato de alguns narrarem certos detalhes e outros omitirem, além de

haver discrepâncias em alguns detalhes.

Colocando em números, o problema sinótico apresenta-se da

seguinte forma:

a) Dos 661 versículos do Evangelho de Marcos, 600 estão também

no de Mateus, e 350 estão no de Lucas.

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b) Os evangelhos de Mateus e Lucas têm 240 versículos em comum,

e que não constam no Evangelho de Marcos.

c) Além disso, tanto Mateus como Lucas tem versículos próprios a

cada um.

Como exemplos destas semelhanças, podemos citar uma passagem em

que Marcos descreve assim: "caindo a tarde, quando o sol descia...";

no Evangelho de Mateus está apenas a primeira parte; no de Lucas está

a segunda. Há diversas outras passagens assim, como no episódio do

marido que morreu sem deixar descendência.

Descoberto o problema, procurou-se interpretar. Isto se tornou

difícil, porque ao lado de grandes semelhanças, há também contrastes.

Como se pode explicar isto? No caso da infância de Jesus, por

exemplo, Marcos não diz nada. Mateus diz alguma coisa, enquanto Lucas

apresenta diversas informações.

Numa concepção tradicional, não haveria esta dificuldade, porque

todos acreditavam que os apóstolos ouviram tudo de Jesus e depois

escreveram o que sabiam quase decorado, usando por isso até as mesmas

palavras. Mas descobriu-se que os Evangelhos foram escritos bastante

tempo depois da morte de Cristo, em épocas diferentes, baseados em

tradições orais. Como pode ter acontecido de terem os Evangelistas

usado as mesmas palavras, estando em lugares diferentes e até em

épocas diferentes?

Aí a crítica histórica entrou em ação e surgiram várias

explicações. Ainda no século XIX, dava-se como resposta que Mateus

teria sido o primeiro a ser escrito. Mas Mateus é um texto muito

elaborado e deve ser de época posterior. Além disso, não foi escrito

em aramaico, como se pensava, mas seu original é em grego. Portanto,

não é aquele do qual Eusébio noticia, que "Mateus escrevera em

aramaico e cada um entendeu e interpretou como pôde".

Posteriormente, explicou-se que haveria uma 'fonte' ou tradição

oral bem antiga, e baseado nesta tradição cada autor escreveu os

fatos ao seu modo. Esta explicação de inicio foi aceita, mas a

coincidência de palavras não pode ser justificada por uma tradição

apenas oral. Há necessidade de um instrumento literário.

Daí surgiu a teoria das "duas fontes", hoje aceita em todos,

porque explica tudo. Como dissemos, nos evangelhos sinóticos podemos

distinguir três partes:

1. Aquelas que são narradas pelos três;

2. Aquelas que são narradas apenas por dois; e

3. Aquelas narradas apenas por um.

Quanto à primeira parte, a crítica mostrou que o primeiro

evangelho a ser escrito foi Marcos, por ser mais rústico e

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incompleto, em contraposição aos outros, mais elaborados e mais

evoluídos. Foi escrito em Roma, porque ele não explica certos termos

latinos, enquanto os outros explicam. A data aproximada é entre 60 e

70, mas seguramente antes de 70, pois este foi o ano da destruição de

Jerusalém, e eles ainda confundiam este acontecimento com o fim do

mundo. Os outros já não fazem assim. Por tudo isto se concluiu que

Marcos escreveu primeiro, provavelmente baseado na pregação de Pedro

e na tradição oral.

Os outros dois (Mateus e Lucas) copiaram de Marcos, melhorando o

texto e adaptando conforme e ocasião, usando também uma tradição

oral. Assim se explica o fato de coincidência entre os três

evangelistas.

A segunda parte, a princípio foi explicada como se um tivesse

copiado do outro, mas provavelmente eles não se conheceram. Portanto,

ambos devem ter se inspirado em outra fonte, talvez já em grego (não

se sabe se oral ou escrita) que servia de base para uma catequese

primitiva. Talvez até aquele texto a que se refere Eusébio, pois é

anterior aos Evangelhos escritos. É a chamada "FONTE Q" (de Quelle,

em alemão, fonte). Esta fonte só foi conhecida de Mateus e Lucas.

Observe o gráfico a seguir:

Exemplos de conteúdo Semelhantes: Mt 9.2-8; Mc 2.3-12; Lc 5.

18-26

Exemplos de concordância literal: Mt 10.22; Mc 13.13; Lc 21.17

A terceira parte tem explicação mais fácil: cada escritor fez

uso de certas fontes que havia em suas regiões, e que os outros não

conheceram. Com certeza eram tradições muito enfeitadas pela fantasia

do povo. Como moravam longe entre si, um não conheceu as fontes

particulares do outro. Assim em Mateus, por exemplo, discriminam-se:

240

600

0

661

350

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as partes copiadas de Marcos são principalmente os fatos

extraordinários (milagres... ); as copiadas de Q são sobretudo os

discursos (parábolas...); as copiadas das fontes particulares são

outros pormenores.

Convém notar que nem Marcos nem a fonte Q eram crônicas, ou

seja, relatos dos acontecimentos, mas escritos elaborados pela Igreja

primitiva para uso na catequese. Cristo morreu em torno do ano 30. O

evangelho de Marcos só foi escrito por volta de 65. Neste meio termo,

a tradição foi transmitida oralmente, ou por meio de pequenos

folhetos, uns contendo as parábolas, outros contando os milagres,

outros contando os fatos da infância; outro contando a paixão... Em

outras palavras, havia grande proliferação de escritos esparsos nas

várias Igrejas e nas várias regiões.

O prólogo de Lucas faz-nos supor três estágios na formação do

Evangelho:

a) há as testemunhas oculares, que contaram o que presenciaram;

b) há os que tentaram compilar isso, as pequenas fontes; como

diz Lucas "muitos empreenderam...‖;

c) a obra do evangelista; como diz Lucas, "escrevi a exposição

ordenada dos fatos".

Quando dizemos que houve 'cópias' uns dos outros, devemos

entender que o Evangelista não copiou simplesmente o outro, mas

compôs baseado em suas pesquisas, e acrescentou algo de si. Além

disso, o Evangelho não é um documento histórico narrativo da vida de

Jesus, mas reproduz a sua mensagem, muito embora não sua mensagem

total, pois tudo que Jesus ensinou não está nos Evangelhos. Eles

escreveram apenas o que interessava àquela Igreja, naquelas

circunstâncias. Assim, por exemplo, no traslado do fato do centurião,

retirado da fonte Q, Mateus escreveu que o centurião veio em pessoa

falar; e Lucas diz que ele mandou os anciãos falarem. E Mateus

colocou neste contexto o final que Lucas só colocou no Cap.13 "muitos

virão do oriente e do ocidente sentar-se com Isaac e Jacó..."

Noutra passagem, Mateus fala em paralisia, porque ele queria

salientar apenas que os judeus não reconheceram o reino de Deus, o

que os chocava. Mas Lucas diz 'doente quase à morte', porque o que

impressionava aos gregos era o Cristo, Senhor da vida. Só para

mostrar como o contexto é importante, em João no episódio do

centurião, este convida Jesus para ir à casa dele. João não tinha

interesse em mostrar nenhuma faceta da personalidade de Jesus, mas

apenas e como um sinal: o homem chegou desconfiando de Jesus, mas no

fim tanto ele como sua família, todos creram.

Mateus 22,1-14 e Lucas 14,16-24 narram a mesma parábola. Mas

Mateus junta duas parábolas numa só: a dos convidados ao banquete com

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a da veste nupcial. Mateus, que seria mais longo, não especificou as

funções de cada um. Além disso, acrescenta o episódio de incendiar a

cidade e maltratar os servos. Lucas omite estes detalhes, mas

especifica as ocupações dos convidados. Omite, porém a veste nupcial.

Mateus, escrevendo para judeus, tinha interesse em acentuar a

rejeição deles e o convite aos pagãos; Lucas, escrevendo para gregos,

não tinha esta meta.

O EVANGELHO E A LITERATURA JOANINA

Cinco livros do Novo Testamento são atribuídos ao apóstolo João:

O Evangelho de João, o Apocalipse e as três chamadas Epístolas de

João. Estes cinco livros, conhecidos como a literatura joanina,

contêm os três tipos de literatura encontrada no Novo Testamento:

histórica, epistolar e apocalíptica. As três Epístolas estão

incluídas no grupo de escritos neotestamentários denominados

Epístolas Gerais. Esta classificação pode ter sido útil para separar

e identificar os vários livros do cânon, mas as três Epístolas, na

realidade, não incidem na categoria de gerais ou universais

(católicas). A primeira não tem a característica costumeira de uma

carta (identificação introdutória do autor e receptores, encerramento

com despedida) e a segunda e a terceira são breves, pessoais e

dirigidas a leitores específicos. As três Epístolas são fortemente

reminiscentes do Evangelho de João e, como este, nunca cessaram de

fazer arder os corações dos cristãos com o tema central do amor. Como

o quarto Evangelho, elas são de estrutura simples, mas de pensamento

profundo. A teologia e o pensamento destas Epístolas tornam-nas

importantes no estudo do Novo Testamento e mostram as ameaças de

heresia e do abuso de autoridade, como o fazem poucos outros livros

do Novo Testamento.

AS RELAÇÕES ENTRE OS ESCRITOS JOANINOS

Existe uma grande semelhança de pensamento entre as Epístolas e

o quarto Evangelho. O quadro a seguir dá alguma idéia das ligações

mais evidentes entre estas Epístolas e o Evangelho:

Evangelho I João II João III João

2.24 4.1-3 7

8.31 3.18 1 1

10.18 4.21 4 3

13.34 2.7 5

14.21 5.3 6

15.11;16.24 1.4 12,13 13,14

21.24 12

A importância da informação contida neste quadro está na

brevidade da segunda e terceira epístolas. Além destas semelhanças no

vocabulário, fraseologia e sintaxe, está a atmosfera que permeia

Page 15: Apostila do novo testamento

14

todos os quatro escritos. Quando se lê estes quatro, sente-se que o

mesmo autor está por trás de cada um. Quanto ao apocalipse, notaremos

sua relação posteriormente.

DATA E LOCAL

A falta de reflexo de perseguição nas epístolas provavelmente se

encaixaria melhor no período anterior à perseguição sob Domiciano.

Embora haja uma atmosfera de tensão, não parece que João e seus

leitores haviam acabado de sair de uma ocasião de intenso perigo e

perseguição. Portanto, conclui-se que estas epístolas de João foram

escritas entre 70-90 d.C., e talvez a década de 80-90 seria provável.

Como o quarto Evangelho, a outra literatura joanina saiu da área

da Ásia Menor, que tinha Éfeso como um centro. As tradições mais

antigas associam a literatura com Éfeso.

OS ATOS DOS APÓSTOLOS

De todos os livros do Novo Testamento, o livro Atos dos

Apóstolos (ou simplesmente Atos) ocupa uma posição singular. É o

único que tenta apresentar uma narrativa histórica dos tempos

imediatamente seguintes à ascensão de Jesus Cristo.

A informação encontrada nele não se encontra em nenhum outro

livro do Novo Testamento. Alguma informação pode ser colhida das

epístolas, acerca da igreja primitiva; mas, é somente quando

colocamos essas epístolas dentro da estrutura de Atos que podemos

reconstruir, até certo ponto, a história da igreja que emergia. Muita

coisa do Novo Testamento só é entendível quando vista à luz do

cenário histórico encontrado em Atos. Sem este livro, não teríamos

quase nenhum registro dos acontecimentos ligados à expansão do

cristianismo após a ressurreição e ascensão de Jesus.

Atos forma uma ponte entre os Evangelhos e as Epístolas; o

Evangelho prevê a igreja, e as Epístolas pressupõem a igreja. O livro

de Atos foi escrito para descrever o surgimento e desenvolvimento da

igreja. Atos, juntamente com as epístolas de Paulo, são nossas únicas

fontes de estudo do cristianismo primitivo e, como tal, o valor do

estudo do livro de Atos é evidente.

AUTORIA, DATA E LOCAL

Um estudo de Atos, necessariamente, está ligado a um estudo do

Evangelho de Lucas. Que o mesmo autor escreveu os dois livros é

largamente reconhecido. No início de cada volume, o autor endereça

cada um deles à mesma pessoa, Teófilo (Lc 1.1-4; At 1.1). No prefácio

de Atos, o autor indica que escreveu um volume anterior, acerca da

vida de Jesus Cristo. Juntamente com a semelhança de estilo e

vocabulário, em toda parte evidente, numa comparação dos dois livros,

um exame da parte final do Evangelho e do início de Atos mostrará

Page 16: Apostila do novo testamento

15

como o autor habilmente entrelaçou os materiais para provar que um

acompanha o outro.

Evidência remota do segundo século indica que Lucas, "o médico

amado", foi o autor dos dois volumes dirigidos a Teófilo. O Prólogo

Anti-Marcionita ao Evangelho de Lucas, escrito por volta de 160-180

d.C, afirma que Lucas, o médico e companheiro de Paulo, escreveu o

Evangelho e "os Atos dos Apóstolos".

Estudiosos competentes argumentaram seriamente em favor de

datas, que vão desde cerca de 60 d.C. até a metade do segundo século.

Duas coisas, entretanto, são evidentes:

Atos foi escrito depois do Evangelho de Lucas e subseqüente

aos eventos de Atos 28.

O tempo da estadia de dois anos de Paulo na prisão romana (At

28.30) é, necessariamente, o terminus ad quo (fator deter-

minante) a data mais antiga possível.

É inescapável o fato de que a data da escrita de Atos está

ligada com a do Evangelho de Lucas. É sabido que Lucas-Atos é uma

obra de dois volumes sobre as origens do cristianismo. Os dois

prefácios indicam que o Evangelho foi escrito antes de Atos.

Por causa disso, é sugerido que uma data para a composição do

terceiro Evangelho deve ser colocada ao fim da Guerra Judaico-Romana

(66-70 d.C), e Atos foi, portanto, escrito antes da destruição de

Jerusalém, em Roma.

OS ESCRITOS PAULINOS

Ao leitor casual do Novo Testamento, pareceria que os Evangelhos

foram escritos primeiro. Isto simplesmente pareceria lógico, já que o

movimento cristão se iniciou com a vida e o ministério do Senhor

Jesus Cristo. Na realidade, contudo, os Evangelhos foram escritos

alguns anos depois que a mais antiga literatura do movimento cristão

apareceu: as epístolas.

Jesus, como os outros mestres famosos do mundo antigo, não

deixou escritos. A mais antiga literatura que o cristianismo tem é a

que foi escrita por homens que foram seus seguidores, e a literatura

mais antiga foi escrita como cartas a congregações específicas, com

problemas específicos. Essas cartas foram escritas desde cerca de 45

d.C. até o final do primeiro século.

O propósito de cada carta foi ajudar no crescimento espiritual

de pequenos grupos de cristãos espalhados pelo Império Romano. Cada

carta teria sido levada por um irmão de confiança até seu destino,

lida na assembleia e depois guardada, para futura referência e uso.

Às vezes a carta seria compartilhada com igrejas irmãs. Freqüente-

Page 17: Apostila do novo testamento

16

mente, cópias seriam feitas, de maneira que outras igrejas pudessem

também ter um benefício permanente das instruções. A carta seria na

forma de rolo e poderia ser guardada facilmente com quaisquer outras

cartas ou porções do Velho Testamento que a igreja fosse o bastante

afortunada de possuir.

As igrejas primitivas preferiam, contudo, a comunicação oral do

ensino apostólico à forma escrita. Eusébio preservou as palavras de

Papias como tendo dito: "Pois eu não considerava que obtive tanto

proveito dos conteúdos dos livros quanto da fala de uma voz viva e

presente" (H.E., III, 39). Com o passar do tempo, todavia, o

prestígio desses escritos primitivos dos apóstolos aumentou, e as

gerações posteriores de cristãos voltaram-se para esses escritos

primitivos como sendo autoridade em doutrina e prática.

Essa aceitação foi especialmente acelerada quando a primeira e a

segunda gerações de crentes morreram. As igrejas cristãs então

começaram a dar maior importância aos escritos autênticos do

testemunho e ensino apostólico, tanto ao testemunho do Jesus

histórico quanto às implicações teológicas e éticas do impacto de se

tornar um seguidor do Cristo ressurreto.

O AUTOR PREDOMINANTE DAS CARTAS DO N.T.

Paulo é o autor de cerca da metade do Novo Testamento. Dos vinte

e sete livros do Novo Testamento, pelo menos treze foram escritos por

este único homem, e quanto aos quatorze livros restantes, Paulo tem

grande influência sobre Lucas (que escreveu os dois volumes de Lucas-

Atos) e de algum modo está por trás da Epístola aos Hebreus. Quando

se reconhece que a maioria de suas cartas foram escritas antes de

qualquer um de nossos Evangelhos canônicos, pode-se prontamente ver

que Paulo, através de suas cartas, exerceu grande influência sobre o

movimento cristão primitivo inteiro.

Embora suas cartas tenham sido escritas para localidades e

pessoas específicas, os problemas de que ele tratou eram universais

em caráter e em princípio. O conselho que ele dava e suas

interpretações teológicas e éticas dos ensinos do Senhor Jesus Cristo

tornaram-se doutrinas básicas do cristianismo. Embora tenha havido

outros homens de grande influência na formação da direção do

cristianismo, nenhum exerceu maior influência que Paulo de Tarso.

BREVE HISTÓRICO DA VIDA DE PAULO

Paulo nasceu próximo ao início da era cristã. O pai de Paulo,

judeu da tribo de Benjamim (Fil. 3:5) e fariseu (At. 23:6), era

cidadão romano que vivia no importante centro metropolitano de Tarso,

na Cilícia, Ásia Menor. Como seu pai era cidadão romano, Paulo herdou

essa cidadania. Dentro do círculo da família, ele teria recebido suas

primeiras instruções religiosas de seus pais e, um pouco mais tarde,

teria freqüentado a escola da sinagoga local, como qualquer criança

judia. Talvez ele também tenha freqüentado uma das muitas

Page 18: Apostila do novo testamento

17

universidades de Tarso, para obter uma educação mais formal nos

princípios de retórica, lógica e filosofia.

Ele tinha dois nomes dados, um em latim (Paulus), que denotaria

sua cidadania legal romana, e o outro em hebraico (Saulo), que seria

usado na família e nos círculos judaicos. Em certa época, nos anos

iniciais de Paulo, ele foi enviado a Jerusalém para estudar a lei

rabínica, sob a orientação do bem conhecido Mestre Gamaliel (At.

22:3).

Mediante as datas de precisão razoável, como: a morte de Herodes

Agripa I (44 d.C), o decreto de Cláudio, expulsando os judeus de Roma

(49 d.C), a designação de Gálio (51 d.C), o incêndio de Roma (64

d.C), e a morte de Nero (9 de junho de 68); Pode-se construir uma

história razoavelmente precisa da vida de Paulo pode ser construída:

A.D.1..................................................... Nascimento

33-34...................................................... Conversão

45............................. Visita a Jerusalém pela época da fome

46-48.................................... Primeira Viagem Missionária

49............................................. Concílio de Jerusalém

49-52..................................... Segunda Viagem Missionária

52-56.................................... Terceira Viagem Missionária

56-57.......... Prisão em Jerusalém e dois anos na prisão em Cesaréia

57-58.................................................. Viagem a Roma

58-60................................ Primeiro aprisionamento em Roma

60-64..................... Viagem a Espanha, Creta, Macedônia e Acaia

64-65................. Prisão, segundo aprisionamento em Roma e morte

CLASSIFICAÇÃO DAS CARTAS DE PAULO

As Cartas Perdidas de Paulo — Em uma das mais antigas cartas de

Paulo, ele escreveu acerca de seu hábito de escrever (II Ts. 3.17).

Inúmeras cartas anteriores, de Paulo, sejam lá quantas tenham sido,

perderam-se para nós. De I Coríntios 5.9, sabe-se que Paulo escrevera

a carta mais antiga àquela igreja. Talvez uma parte dessa "carta

perdida" esteja preservada em II Coríntios 6:14-7:1, embora nem todos

os estudiosos estejam de acordo com esta idéia. Também se sabe de II

Coríntios 2.4 e 7.8 que Paulo escrevera ainda outra carta a Corinto.

Alguns estudiosos sentem que II Coríntios 10-13 é uma parte dessa

"carta angustiosa". Paulo também menciona em Colossenses 4.16 uma

carta aos laodicenses. Certo é que Paulo escreveu muito mais do que

está preservado no Novo Testamento.

As Cartas Existentes de Paulo — Na maioria das traduções

modernas, treze, das vinte e uma cartas, são atribuídas a Paulo. Os

nomes e ordem são: Romanos, I e II Coríntios, Gálatas, Efésios,

Filipenses, Colossenses, I e II Tessalonicenses, I e II Timóteo, Tito

e Filemom. Os textos gregos modernos têm como título, para estas

treze cartas, somente a preposição "a", seguida pelo nome do

receptor.

Page 19: Apostila do novo testamento

18

A Ordem de Composição — É lamentável que a ordem canônica das

cartas de Paulo não seja cronológica. A presente ordem é basicamente

a de extensão e se é escrita a uma igreja ou a um indivíduo. Romanos

é a mais extensa e Filemom a mais curta. As nove primeiras são

dirigidas a sete igrejas diferentes, e as quatro últimas, a três

indivíduos diferentes. Por causa de problemas críticos, Hebreus é

colocada por último no corpus paulino, embora alguns dos manuscritos

gregos mais antigos a tenham entre Romanos e I Coríntios.

Uma ordem cronológica talvez mostrasse mais claramente os

problemas encontrados por uma igreja que emergia e indicaria o padrão

teológico em desenvolvimento, de Paulo e da Igreja. O método a

seguir, de agrupamento das cartas, é baseado na narrativa contida em

Atos e em informação colhida das próprias cartas. Este agrupamento

não é conclusivo, mas é usado para mostrar o acordo geral entre os

estudiosos do Novo Testamento, numa aproximação ao estudo do Novo

Testamento.

Epístolas escritas durante a Segunda Viagem Missionária (49-52

d.C): I e II Tessalonicenses, de Corinto.

Epístolas escritas durante a Terceira Viagem Missionária (52-

56 d.C): I Coríntios, de Éfeso; II Coríntios, da Macedônia;

Gálatas e Romanos, de Corinto.

Epístolas escritas de Roma durante o primeiro aprisionamento

romano (58-60 d.C): Efésios, Filipenses, Colossenses, Filemom.

As Epístolas Pastorais (62-65 d.C): I Timóteo, da Macedônia;

Tito, da Macedônia ou de Corinto; II Timóteo, de Roma, pouco

antes da morte de Paulo.

AS CARTAS PASTORAIS

Desde o século XVIII as cartas que estão situadas na ordem do

canônica da bíblia entre o 15º e o 18º livro do NT são comumente

chamadas de ―cartas pastorais‖. São elas: A Primeira e a Segunda

Epístolas a Timóteo e a Epístola a Tito.

O Termo pastoral, segundo Reinaldo Fabris, deve ser entendido em

sentido ―amplo, mais próximo do comunitário ou eclesial do que

‗clerical-hierárquico‘. De fato, esse termo realça convenientemente a

natureza peculiar desses escritos que contêm principalmente normas

relativas aos ―pastores‖ das comunidades.

Essas cartas diferenciam-se dos outros escritos paulinos, mas

possuem uma homogeneidade entre elas. Distinguem-se dos textos

paulinos, sobretudo pelo vocabulário e pelas orientações teológicas e

espirituais. De outro lado, elas são justamente parecidas por

apresentam certa organicidade entre elas, isto é, tratam de assuntos

similares com uma linguagem que se coaduna.

Page 20: Apostila do novo testamento

19

Sobre as Cartas Pastorais, grosso modo, podemos dizer: que elas

não são dirigidas, tal qual as demais do corpus paulinus, a uma

comunidade – embora o conteúdo seja de interesse formal de todos os

membros. Elas são dirigidas a pessoas específicas, à lideranças

comunitárias(A Timóteo, I Tm 1.2; II Tm 1.2 e A Tito 1.4).

Versam, genericamente, sobre organização da vida de oração

pública e privada da comunidade (I Tm 2.1,8);

Executam instruções aos coordenadores de comunidades e

elencam suas virtudes(I Tm 3.1-7 e 8-13; Tt 1.6-9);

Fazem exortações morais relativas aos diversos estados de vida

(I Tm 5.1,3,17; 6.1-2,17-19; Tt 2.10).

Em síntese, poderíamos dizer que elas versam sobre a organização

da Igreja, sobre o estilo de vida dos Cristãos e um problema comum:

Falsas doutrinas.

Surgiram falsos mestres ensinando uma mistura de doutrinas e

práticas judaicas e pagãs: proibição do casamento, abstinência de

alimentos (I Tm 4.3), alguns afirmavam que a ressurreição já se

realizou (II Tm 2.18) e ensinos de demônios (I Tm 4.1). Havia, ainda,

muitas contendas e discussões nas igrejas (Tt 2.9-11).

Para combater as falsas doutrinas, Paulo recomenda a nomeação de

oficiais qualificados, em cada igreja (Tt 1.5), e reafirma as

verdades centrais do cristianismo:

Salvação pela graça, através da fé em Cristo;

Vida santificada, livre do pecado;

O juízo de Deus, etc.

É a chamada ―sã doutrina‖ (I Tm 1.15, 2.5, II Tm 2.11,12, Tt 2.-

11-14, 3.3-8). E esta sã doutrina deve ser ensinada para o povo (II

Tm 2.2, 3.25, Tt 2.1).

A EPÍSTOLA AOS HEBREUS

A Epístola aos Hebreus não é igual a nenhum outro livro do Novo

Testamento. Ela começa como um tratado, continua como um sermão e

conclui como uma carta. Ela conclui como uma carta, mas não começa

como tal, pois não tem a saudação costumeira e não dá nem o nome do

escritor nem o nome da comunidade à qual foi enviada. Contudo, por

toda parte, o livro está claramente escrito para um grupo particular

de leitores.

Está escrito no melhor grego literário encontrado no Novo

Testamento. O vocabulário é copioso e o estilo mostra traços de

esforço e cuidado. A linguagem, ordem, ritmo, sintaxe, todos

contribuem para o efeito total. O autor jamais é impetuoso; ele não é

levado a se desviar por seus pensamentos. A beleza da carta pode mais

Page 21: Apostila do novo testamento

20

facilmente ser apreciada que os detalhes do argumento, que demandam

uma familiaridade não somente com o Velho Testamento, mas também

certos tipos de interpretação do Velho Testamento vigentes no

primeiro século.

AUTORIA

A Epístola aos Hebreus é anônima da mesma maneira como o são os

Evangelhos e Atos: o autor não se identifica pelo nome. Assim como

acontece nos outros livros do Novo Testamento, o título não é parte

do livro em si. Este título, "Aos Hebreus", foi adotado para

distinguir este livro de outros na coleção de escritos da igreja

primitiva. Para se identificar o autor, as duas áreas de investigação

crítica são usadas: a evidência da igreja primitiva e a evidência que

se pode captar da própria carta.

Os escritores patrísticos, tanto na área ocidental quanto na

oriental da igreja, estavam cônscios da dificuldade da autoria

paulina. Ao mesmo tempo, muitos reconheceram a estreita afinidade com

o pensamento paulino. Foi por esta razão que Panteno disse que Paulo

saiu de seu estilo normal e escreveu esta carta anonimamente.

A razão básica para esta conclusão foi que Paulo, sendo o

apóstolo aos Gentios, não teria tido uma aceitação, por parte dos

cristãos judeus, a quem aparentemente a carta foi primeiramente

enviada. Clemente de Alexandria, numa tentativa de esclarecer o

problema do estilo, disse que Paulo a escreveu em hebraico e Lucas a

traduziu para um excelente grego.

No terceiro século, Orígenes escreveu:

―Só Deus sabe ao certo quem escreveu a epístola.”

DATA DA CARTA

É impossível fixar a data da epístola com certeza absoluta,

ainda que se possa dizer com considerável confiança que, muito

provavelmente, ela foi escrita entre 60 e 70 D. C. Seus leitores já

eram crentes há muitos anos (Hb 5.12; Hb 10.32). Alguns de seus

líderes originais já haviam falecido (Hb 13.7). Por outro lado,

Timóteo ainda estava vivo (Hb 13.23). Parece possível argumentar que,

se a destruição de Jerusalém tivesse tido lugar, o escritor não

deixaria de referir-se ao fato, particularmente em vista de que isso

foi um significativo julgamento de Deus contra a antiga ordem de

adoração judaica.

EPÍSTOLA DE TIAGO

A Epístola de Tiago está em primeiro lugar no grupo de sete

livros do Novo Testamento denominado as Epístolas Gerais ou

Page 22: Apostila do novo testamento

21

Católicas. As igrejas evangélicas estiveram hesitantes, por razões

óbvias, em usar o termo "católicas" na descrição destas sete cartas.

O termo em si é uma transliteração do adjetivo grego kaqoliko/j, que

significa "geral" ou "universal". Dois adjetivos latinos (generalis,

universalis) traduzem a palavra grega perfeitamente, mas a Vulgata

transliterou o grego como catholicas. É da Vulgata que o título

Epístolas Católicas tornou-se uso comum entre os tradutores e

estudiosos.

O termo ―católicas‖ foi pela primeira vez aplicado às sete

cartas como um grupo por Eusébio (265-340), embora escritores mais

antigos tenham chamado as cartas individuais deste grupo de "gerais".

Um comentário anônimo do sétimo século sobre a Epístola de Tiago

afirma que o termo foi usado porque estas cartas são encíclicas; ou

seja, não são endereçadas a igrejas ou pessoas individuais, mas

escritas coletivamente a todas as igrejas. Esta descrição geral vale

para Tiago, I e II Pedro, I João e Judas.

IMPORTÂNCIA DA EPÍSTOLA UNIVERSAL

A Epístola de Tiago pertence à classificação de literatura na

Bíblia denominada "literatura de sabedoria". Seu propósito é

caracterizado por instruções para o viver diário e por uma

compreensão das perplexidades da vida. Exemplos deste tipo de

literatura no Velho Testamento são os livros de Jó, Provérbios e

Eclesiastes. De todos os livros do Novo Testamento, Tiago é o menos

doutrinário e o mais prático. Por esta razão, ele foi grandemente

negligenciado e considerado num nível inferior aos dos outros

escritos neotestamentários.

Contudo, as admoestações desta carta tornam seu estudo oportuno

hoje, pois elas falam acerca dos problemas da vida cotidiana. Este

livro é especialmente relevante, para o leitor moderno, pela ênfase,

que dá aos aspectos e problemas sociais e às tarefas da religião

dentro do contexto social.

DATA E LOCAL

A carta não fornece indício algum de que a queda de Jerusalém

diante dos romanos (em 70 dC) já tivesse ocorrido. Segundo o

historiador judeu Josefo, um sumo sacerdote chamado Ananus, saduceu,

foi responsável de levar Tiago e outros perante o Sinédrio, e de

mandar que fossem apedrejados até à morte. Este acontecimento,

escreve Josefo, ocorreu após a morte de Festo, procurador romano, mas

antes da chegada de Albino, seu sucessor.

Se assim foi, e se estiverem corretas as fontes que situam a

morte de Festo por volta de 62 dC, então Tiago deve ter escrito sua

carta algum tempo antes dessa data. Jerusalém foi o local provável da

escrita, pois é ali que Tiago residia. (Gl 1.18,19).

Page 23: Apostila do novo testamento

22

OS ESCRITOS PETRINOS

São duas, as cartas inspiradas das Escrituras Gregas Cristãs,

escritas pelo apóstolo Pedro, que se identifica como o escritor nas

palavras iniciais de cada carta. (I Pd 1.1; II Pd 1.1; compare isso

com II Pd 3.1.) Evidência interna, adicional, indica

inconfundivelmente Pedro como o escritor delas. Ele chama a si mesmo

de testemunha ocular da transfiguração de Jesus Cristo, privilégio

compartilhado apenas por Pedro, Tiago e João. (II Pd 1.16-18; Mt

17.1-9) E, conforme evidencia João 21.18, 19, somente Pedro poderia

ter dito: ―Em breve se há de eliminar a minha habitação, assim como

também o nosso Senhor Jesus Cristo me indicou.‖ (II Pd 1.14)

A diferença de estilo entre as duas cartas pode ser atribuída a

que Pedro usou Silvano (Silas) para escrever a primeira carta, mas,

pelo visto, não fez isso ao escrever a sua segunda carta. (I Pd 5.12)

Ambas eram cartas gerais, evidentemente dirigidas a cristãos judeus e

não-judeus. A primeira carta é dirigida especificamente aos em Ponto,

Galácia, Capadócia, Ásia e Bitínia regiões da Ásia Menor. I Pd 1:1;

2.10; II Pd 1.1; 3.1; compare isso com At 2.5, 9, 10.

As cartas de Pedro concordam plenamente com outros livros

bíblicos em dar destaque à conduta correta e sua recompensa, e também

em citá-los como Palavra de autoridade de Deus. Fazem-se citações de

Gênesis (18.12; I Pd 3:6), Êxodo (19.5,6; I Pd 2.9), Levítico (11.44;

I Pd 1.16), Salmos (34.12-16; 118.22; I Pd 3.10-12; 2.7), Provérbios

(11.31; I Pd 4.18; II Pd 2.22) e Isaías (8.14; I Pd 2.8;). Os

paralelos entre II Pedro (2.4-18; 3.3) e a epístola de Judas (5-13,

17, 18) evidentemente indicam que o discípulo Judas aceitou a segunda

carta de Pedro como inspirada. Digno de nota é também que as cartas

do apóstolo Paulo são classificadas por Pedro em conjunto com ―o

resto das Escrituras‖. II Pd 3.15,16.

DATA E LOCAL DAS CARTAS

À base do teor das cartas, parece que foram escritas antes do

irrompimento da perseguição movida por Nero em 64 dC. Estar Marcos

com Pedro parece situar o tempo da escrita da primeira carta entre 62

e 64 dC. (I Pd 5.13) Anteriormente, durante o primeiro encarceramento

de Paulo em Roma (c. 59-61 dC), Marcos estava lá, e quando Paulo foi

encarcerado pela segunda vez em Roma (c. 65 dC), este pediu que

Timóteo e Marcos viessem a ele. (Cl 4.10; II Tm 4.11) É provável que

Pedro escreveu sua segunda carta não muito depois da sua primeira, ou

por volta de 64 dC.

Segundo o testemunho do próprio Pedro, ele escreveu a sua

primeira carta enquanto estava em Babilônia. (I Pd 5.13) É possível

que também fosse dali que escreveu a segunda carta. A evidência

disponível indica claramente que ―Babilônia‖ se refere à cidade nas

margens do Eufrates, não a Roma, conforme alguns têm afirmado. Tendo

Pedro sido incumbido de levar ‗as boas novas aos circuncisos‘, era de

Page 24: Apostila do novo testamento

23

esperar que servisse num centro de judaísmo, tal como Babilônia. (Gl

2.8,9) Havia uma grande população judaica em Babilônia.

EPÍSTOLA DE JUDAS

A Epístola Geral de Judas é um dos menores livros da Bíblia,

contendo apenas vinte e cinco versículos. Este livro é quase

desconhecido pelos cristãos modernos, e isto é lamentável. Talvez a

mais bela bênção a ser encontrada em toda a literatura se acha nesta

pequena epístola: "Ora, àquele que é poderoso para vos guardar de

tropeçar, e apresentar-vos ante a sua glória imaculados e jubilosos,

ao único Deus, nosso Salvador, por Jesus Cristo, nosso Senhor,

glória, majestade, domínio e poder, antes de todos os séculos, e

agora, e para todo o sempre. Amém" (Jd. 24,25).

AUTOR, DATA E LOCAL

Escrita por Judas, irmão de Tiago, dirigida ―aos chamados que

são amados em relação com Deus, o Pai, e preservados para Jesus

Cristo‖, esta carta geral, pelo visto, devia circular entre todos os

cristãos. Jd 1.

Na época em que Judas escreveu esta carta, desenvolvera-se uma

situação ameaçadora. Homens imorais, animalescos, tinham-se

introduzido sorrateiramente entre os cristãos e ‗transformavam a

benignidade imerecida de nosso Deus numa desculpa para conduta

desenfreada‘. Por este motivo, Judas não escreveu como originalmente

pretendera, a respeito da salvação que todos os cristãos chamados

para o Reino celestial de Deus têm em comum. Em vez disso, dirigido

pelo Espírito de Deus, ele forneceu exortações para ajudar os crentes

a enfrentar com bom êxito as influências corrompedoras dentro da

congregação.

Visto que Judas parece ter citado a segunda carta de Pedro, a

respeito de ridicularizadores aparecerem ―no último tempo‖ (compare

II Pd 3.3 com Jd 18), pode-se inferir que ele escreveu sua carta mais

tarde, por volta de 65 dC. É provável que Judas tenha escrito sua

carta na Palestina, visto que não há registro de ele ter alguma vez

saído daquele país.

O APOCALIPSE E A LITERATURA APOCALÍPTICA

O Apocalipse é o mais inspirador, não obstante ser o mais

confundido de todos os escritos do Novo Testamento. Para muitos

leitores, sua compreensão é tão difícil que eles o negligenciam

completamente. Esta negligência é lamentável, porque, fora os

Evangelhos e Atos, nenhum outro livro constitui tamanha fonte de fé e

força para os crentes na luta contra o mal. O Apocalipse torna o céu

Page 25: Apostila do novo testamento

24

tão real ao leitor que, na força de uma convicção bendita, ele recebe

a coragem para continuar a batalha contra o mundo e todos os seus

males.

Nenhum outro livro, no Novo Testamento, apresenta tantos

problemas como faz este último livro de nossa Bíblia. Para muitos,

ele não é um "desvendamento", mas permanece sendo algo "oculto". É

bem evidente que este livro pertence a uma categoria literária

diferente da dos "históricos" (os Evangelhos e Atos) ou "epistolares"

(as Epístolas). A complexidade de seu tipo literário é evidente. Ele

começa (1:4-6) e termina (22:21) como uma carta; contudo, contém

cartas dentro do corpo (2:1-3:22). Ele é profético; contudo, é

altamente simbólico. Os estudiosos do Novo Testamento colocam este

livro numa classe de literatura cujo nome é derivado da primeira

palavra do texto grego deste livro: apocalíptica.

A NATUREZA DA LITERATURA APOCALÍPTICA

Uma classe inteira de literatura deve seu nome à primeira

palavra do texto grego do último livro de nossa Bíblia. A palavra é

a0poka/luyij (apokálupsis). Este substantivo provém do verbo

a)pokalu/ptein (apo-kalúptein), que significa "desvendar", daí

"revelar". O adjetivo "apocalíptico" é usado para qualificar escritos

que têm certas afinidades com o Apocalipse do Novo Testamento. Foram

feitas associações entre o Apocalipse e outras porções e livros da

Bíblia, tais como Daniel e Ezequiel e estes são ditos conterem

material apocalíptico em sua natureza. Desta forma, como o termo foi

considerado como descritivo de muitos escritos que não poderiam ser

classificados de outra maneira, o gênero literário recebeu seu nome.

Basicamente, "apocalíptica" é a literatura não diferente do

Apocalipse.

CARACTERÍSTICAS DA LITERATURA APOCALÍPTICA

Embora nem todos os estudiosos concordem quanto às

características elementares básicas, as seguintes são pelo menos mais

evidentes:

1) Escatológica — Toda literatura apocalíptica é escatológica, mas as

duas coisas não são idênticas. São feitas, acertadamente, distinções

entre as duas. A escatologia pode existir e freqüentemente existe nos

escritos básicos, separada das seções apocalípticas. Por outro lado,

o apocalíptico é sempre escatológico, seja explícita ou

implicitamente. A escatologia olha para um tempo futuro, quando Deus

irromperá catastroficamente no mundo do tempo e do espaço, para

julgar sua criação. Há uma distinção a ser feita entre profecia

escatológica e o apocalíptico. Aquela predisse o futuro que deverá

surgir do presente, ao passo que esta predisse o futuro que deverá

irromper no presente.

2) Significação Histórica — O apocalíptico mantém a tensão entre a

história e o futuro eschatón. O apocaliptista escreve dentro de uma

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estrutura histórica para assegurar o leitor acerca da intervenção

divina. Isto é caracteristicamente feito retraçando-se a história na

forma de profecia, para falar às condições da época da escrita. Os

elementos da situação histórica real são representados pelas imagens

do livro. O conhecimento da situação histórica auxilia a

interpretação da mensagem.

3) Uma Defesa Radical dos Justos — Uma das características mais

óbvias do apocalíptico é vista na defesa radical do grupo perseguido,

sempre identificado com os escolhidos de Deus, e com os quais sempre

o escritor se identifica, como uma parte integrante. Surge a pergunta

sobre por que o povo de Deus sofre, e a resposta é encontrada no

dualismo, que é temporal e histórico. Há duas superpotências que se

opõem, e ambas são sobrenaturais: Deus e Satanás. Com duas eras

distintas, a presente está sob o controle das forças da impiedade, e,

conseqüentemente, há um pessimismo acerca da presente situação

histórica. É por esta razão que os justos sofrem. Existe pouco ou

nenhum ensino moral e ético; estar no grupo escolhido é o bastante,

pois o pior membro do grupo é muito melhor que a melhor pessoa que

não é do grupo.

4) Pseudônimo — Com poucas exceções, os apocalipses são pseudônimos.

Eles são escritos no nome de algum predecessor ilustre que profetiza

acerca dos eventos da época do escritor real. A história passada

torna-se reescrita, como profecia. Os eventos são bem facilmente

determinados, até a época do escritor real, e então a profecia perde

sua clareza, pois o escritor real considera-se como estando vivendo

próximo ao fim do tempo.

5) Visões — O uso de visões como um meio de revelação é outra

característica clara dos apocalipses. A visão altamente elaborada é o

método principal usado para se receber a mensagem. Embora os profetas

do Velho Testamento tivessem visões, estas não passaram muito além de

simples sonhos quanto à forma. Os apocaliptistas se moveram além de

simples visão para experiências esotéricas altamente estruturadas e

detalhadas. Geralmente um guia celestial está presente, para auxiliar

no discernimento da mensagem das figuras totalmente fantásticas,

vistas nessas visões. A experiência esotérica é uma forma de

simbolismo, figuras grotescas e imagens fantásticas.

6) Simbolismo — Provavelmente, a característica principal da litera-

tura apocalíptica é o uso de símbolos para apresentar a mensagem

escatológica. Através de séculos de desenvolvimento, um estoque comum

de símbolos e figuras de discurso remarcáveis emergiram. Como pode

alguém colocar em termos inteligíveis uma experiência espiritual? A

interpretação de idéias, princípios e realidades espirituais é

tornada fácil para aquele que sabe usar os símbolos. Para os não-

iniciados, a mensagem permanece sendo um mistério. Desta forma, o

escritor faz uso de símbolos para "revelar" a mensagem àqueles que

estão familiarizados com o processo, e a mensagem é ocultada àqueles

que não estão. Na linguagem do apocaliptista, os símbolos são muito

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significativos, pretendidos a serem um instrumento de uma carreira

definida e importante de pensamento.

7. Dramático — A literatura apocalíptica possui o sentido de um drama

iminente, a atmosfera do dramático. Ela é dirigida à imaginação com

sua vividez e, por vezes, figuras grotescas. Freqüentemente, os

símbolos são empregados para o efeito dramático, para enfatizar a

seriedade da mensagem. Quando o leitor entende que o escritor está

dirigindo sua mensagem à imitação, encontra o significado de uma

figura na perspectiva do livro inteiro. Neste sentido, o detalhe

diminuto não é importante; de fato, ele pode ser prejudicial à

descoberta da mensagem real que o escritor deseja transmitir ao

leitor.

AUTOR DO LIVRO

Não existe nenhuma outra pessoa, além do apóstolo João, que

definidamente conhecemos, no primeiro século, com o nome de João, que

tivesse tal autoridade naquela área. A língua nativa do autor era o

aramaico, não o grego, e parece, das expressões idiomáticas e

conhecimento da Palestina, encontrados no livro, que o autor era um

judeu da Palestina, possivelmente da Galiléia.

DATA E LOCAL

A tradição da igreja primitiva é unânime em datar a composição

como sendo dos últimos anos de César Domiciano (81-96 d.C). É

assinalado que Domiciano foi o primeiro imperador que fez uma

tentativa séria de forçar a adoração do imperador por todo o Império.

Houve muitos templos erigidos à sua divindade, por todo o mundo, e

especialmente na Ásia Menor. A descrição das igrejas (2.1; 3.22)

sugere a necessidade de uma época de desenvolvimento além da que é

encontrada nas cartas paulinas. É necessário tempo também para o

escritor assumir sua autoridade pastoral na área da Ásia Menor, após a

morte de Paulo.

Portanto, o último livro do Novo Testamento, o Apocalipse, foi

escrito pelo final do reinado de Domiciano, sendo a melhor data, com

menos problemas, por volta de 95 d.C.

Quanto ao local da escrita, o próprio autor diz que ele "estava

na ilha chamada Patmos" (1.9). Patmos é uma pequena ilha que fica no

mar Icário, entre Icária e Leros, cerca de quarenta e cinco

quilômetros a sudoeste, pelo oeste de Mileto. Ela estava na rota

marítima de Éfeso a Roma. A ilha forma um crescente com suas pontas em

direção ao leste. O local tradicional para o Apocalipse é na ponta do

sul. As montanhas e o mar, nessa área, são refletidos, até certo

ponto, por todo o Apocalipse. A indústria principal da ilha era a

mineração do sal. Era uma colônia penal para os prisioneiros políticos

de Roma.